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Sião ou não

09.08.13
aqui dissertei sobre a Nova Guiné e Ilhas Salomão. Por outro lado, a Tailândia foi designada Sião.
Houve coisa, quando se ouve Salomão e Sião, em nomes de paragens muito orientais?

... acresce que a cidade de Ayutthaya, no Reino do Sião era chamada "Iudea".
Podemos perguntar o que motiva os nomes Salomão, Sião e Judeia aparecerem no Sudeste Asiático e Oceânia. A culpa, claro está, parece ser portuguesa... ou pelo menos, assim o dá a entender Turpin (General collections of voyages and travels, J. Pinkerton, Pag. 573):
  • The origin of the name Siam is unknown to its own inhabitants (...) in the Pegouan language it means "free". (...) It is suspected it was given by them by the Portuguese (...) 
  • The Siamese call the royal city Sigathia, or simply Crumg, that is to say, the court. The Portuguese, who corrupt all foreign words, by the difficulty they have to pronounce them, have called it Juthya and Odia. (...)
Por que razão vão os portugueses insistir em baptizar o país e a capital com nomes judaicos?
Curiosamente, a Tailândia, ou Sião, será praticamente a única a escapar à colonização europeia.

Não muito longe, na Indonésia, vamo-nos deparar com esta magnífica pirâmide:

Pode parecer que estamos perante uma pirâmide de degraus mexicana, mas não... há também pirâmides destas na Indonésia (Candi Sukuh). Está datada como sendo do Séc. XV... mas se isso será estranho, há ainda a considerar que havia um falo, com quase 2 metros de altura, que foi retirado do local, para ser higienicamente colocado no museu.

Ainda na Indonésia, somos ligeiramente surpreendidos com uma manifestação "megalítica"... aqui poderá ser exagerado o "mega", "multi" seria o prefixo certo. Ou seja, não se tratam de grandes pedras, mas sim de muitas pedras alinhadas, em Gunung Pandang:
Alinhamentos de Pedras em Gunung Pandang, Indonésia.

Estes casos indonésios são normalmente esquecidos na longa lista de sites, quer de pirâmides, quer de monumentos megalíticos. Como se depreende, isto dá um carácter ainda mais global às semelhanças em diversos continentes. 
Para além disso, há quem considere que poderia ter sido ali a mítica Atlântida (artigo do Jakarta Post).

Também não longe, nas Filipinas, vemos os mais de 1700 montes de forma cónica, chamados "montes de chocolate", na ilha de Bohol, sendo supostamente naturais. Apesar de não se tratar de fenómeno comum, é aceite que se tratam de formações naturais... De qualquer forma, o aspecto acentuadamente piramidal assemelha-se bastante aos montes artificiais existentes na Europa Atlântica:
Montes de Chocolate, em Bohol, nas Filipinas (Ilha de Cebu).

Devo dizer que interpretei mal uma péssima tradução, que vi agora reportar a uma página francesa:
http://destinationterre2.wordpress.com/2009/08/12/3eme-partie-les-tokhariens-chapitre-21-les-tokhariens-des-philippines/

Ao contrário, a versão francesa parece-me bastante instrutiva, e avança com uma vastidão de estranhos registos no mundo, ligando a diversos povos, em particular, neste caso, ao povo Tocharian, de origem siberiana, a que se associam a múmias da bacia de Tarim.

Assim, deveria ter falado apenas sobre os petroglifos de Angono, a que se atribui mais de 3000 anos, nalgumas inscrições:

Quando falei em "limpar o Cebu", referia-me a uma má interpretação da tradução da página mencionada. 
Por exemplo, uma grande estátua será afinal uma cabeça de leão... "Lion's head", colocada nos anos 1960's pelo Lions Club! Havia antes uma outra pedra, com aspecto de leão, que motivou a construção do Lion's Club...
 
Lions head, feito pelo Lions Club das Filipinas (Ilha de Cebu) e estátua natural.

O objectivo deste texto seria ilustrar diversos monumentos, pirâmides e megalitos, que surgem nas paragens do Sudeste Asiático e Oceania, para além do habitual Angkor Vat. Não se trata, como é óbvio de mostrar lugares turísticos, ainda que muitos destes monumentos estejam em paragens turísticas, como é o caso do Templo hindú de Besakhi em Bali. Apesar de Bali ser conhecida pelas praias, deveria merecer maior atenção este espectacular templo hindú, associado ao Séc. XIV ou XV:
 
Templo hindú de Besakhi em Bali, Indonésia

Já bastante mais significativo parece ser o Templo hindú de Virupaksha, em Hampi, Índia:

... e em particular esta magnífica escultura no Complexo Monumental de Vijayanagara que evidencia um par de elefantes puxando um carro encimado por um templo:
 
Hampi: Carro de Elefantes puxando um Templo, e megalitos

... havendo também neste local bastantes evidências megalíticas, em redor do templo. Aliás, em Hampi, na região de Karnataka é possível encontrar muitos exemplos de dólmens:

Estes registos indianos parecem misturar monumentos do Séc. XIV a XVI, mas também construções que remontam a 2000 ou 3000 a.C.
Ainda que estes dólmens sejam diferentes dos encontrados na Europa, evidenciam uma proliferação do conceito para outras fronteiras, que normalmente não fazem parte do conhecimento difundido.
Em particular fica a dúvida se a migração do conceito se deu no sentido indiano-europeu ou vice-versa...

(texto corrigido em 9/8/2013)

Aditamento (comentário de JM Oliveira, 3.09.2013):
Em resposta à minha frase:
"Ainda que estes dólmens sejam diferentes dos encontrados na Europa"

O José Manuel teve a gentileza de apontar esta figura que dispensa mais comentários:


Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 06:27

Sião ou não

09.08.13
aqui dissertei sobre a Nova Guiné e Ilhas Salomão. Por outro lado, a Tailândia foi designada Sião.
Houve coisa, quando se ouve Salomão e Sião, em nomes de paragens muito orientais?

... acresce que a cidade de Ayutthaya, no Reino do Sião era chamada "Iudea".
Podemos perguntar o que motiva os nomes Salomão, Sião e Judeia aparecerem no Sudeste Asiático e Oceânia. A culpa, claro está, parece ser portuguesa... ou pelo menos, assim o dá a entender Turpin (General collections of voyages and travels, J. Pinkerton, Pag. 573):
  • The origin of the name Siam is unknown to its own inhabitants (...) in the Pegouan language it means "free". (...) It is suspected it was given by them by the Portuguese (...) 
  • The Siamese call the royal city Sigathia, or simply Crumg, that is to say, the court. The Portuguese, who corrupt all foreign words, by the difficulty they have to pronounce them, have called it Juthya and Odia. (...)
Por que razão vão os portugueses insistir em baptizar o país e a capital com nomes judaicos?
Curiosamente, a Tailândia, ou Sião, será praticamente a única a escapar à colonização europeia.

Não muito longe, na Indonésia, vamo-nos deparar com esta magnífica pirâmide:

Pode parecer que estamos perante uma pirâmide de degraus mexicana, mas não... há também pirâmides destas na Indonésia (Candi Sukuh). Está datada como sendo do Séc. XV... mas se isso será estranho, há ainda a considerar que havia um falo, com quase 2 metros de altura, que foi retirado do local, para ser higienicamente colocado no museu.

Ainda na Indonésia, somos ligeiramente surpreendidos com uma manifestação "megalítica"... aqui poderá ser exagerado o "mega", "multi" seria o prefixo certo. Ou seja, não se tratam de grandes pedras, mas sim de muitas pedras alinhadas, em Gunung Pandang:
Alinhamentos de Pedras em Gunung Pandang, Indonésia.

Estes casos indonésios são normalmente esquecidos na longa lista de sites, quer de pirâmides, quer de monumentos megalíticos. Como se depreende, isto dá um carácter ainda mais global às semelhanças em diversos continentes. 
Para além disso, há quem considere que poderia ter sido ali a mítica Atlântida (artigo do Jakarta Post).

Também não longe, nas Filipinas, vemos os mais de 1700 montes de forma cónica, chamados "montes de chocolate", na ilha de Bohol, sendo supostamente naturais. Apesar de não se tratar de fenómeno comum, é aceite que se tratam de formações naturais... De qualquer forma, o aspecto acentuadamente piramidal assemelha-se bastante aos montes artificiais existentes na Europa Atlântica:
Montes de Chocolate, em Bohol, nas Filipinas (Ilha de Cebu).

Devo dizer que interpretei mal uma péssima tradução, que vi agora reportar a uma página francesa:
http://destinationterre2.wordpress.com/2009/08/12/3eme-partie-les-tokhariens-chapitre-21-les-tokhariens-des-philippines/

Ao contrário, a versão francesa parece-me bastante instrutiva, e avança com uma vastidão de estranhos registos no mundo, ligando a diversos povos, em particular, neste caso, ao povo Tocharian, de origem siberiana, a que se associam a múmias da bacia de Tarim.

Assim, deveria ter falado apenas sobre os petroglifos de Angono, a que se atribui mais de 3000 anos, nalgumas inscrições:

Quando falei em "limpar o Cebu", referia-me a uma má interpretação da tradução da página mencionada. 
Por exemplo, uma grande estátua será afinal uma cabeça de leão... "Lion's head", colocada nos anos 1960's pelo Lions Club! Havia antes uma outra pedra, com aspecto de leão, que motivou a construção do Lion's Club...
 
Lions head, feito pelo Lions Club das Filipinas (Ilha de Cebu) e estátua natural.

O objectivo deste texto seria ilustrar diversos monumentos, pirâmides e megalitos, que surgem nas paragens do Sudeste Asiático e Oceania, para além do habitual Angkor Vat. Não se trata, como é óbvio de mostrar lugares turísticos, ainda que muitos destes monumentos estejam em paragens turísticas, como é o caso do Templo hindú de Besakhi em Bali. Apesar de Bali ser conhecida pelas praias, deveria merecer maior atenção este espectacular templo hindú, associado ao Séc. XIV ou XV:
 
Templo hindú de Besakhi em Bali, Indonésia

Já bastante mais significativo parece ser o Templo hindú de Virupaksha, em Hampi, Índia:

... e em particular esta magnífica escultura no Complexo Monumental de Vijayanagara que evidencia um par de elefantes puxando um carro encimado por um templo:
 
Hampi: Carro de Elefantes puxando um Templo, e megalitos

... havendo também neste local bastantes evidências megalíticas, em redor do templo. Aliás, em Hampi, na região de Karnataka é possível encontrar muitos exemplos de dólmens:

Estes registos indianos parecem misturar monumentos do Séc. XIV a XVI, mas também construções que remontam a 2000 ou 3000 a.C.
Ainda que estes dólmens sejam diferentes dos encontrados na Europa, evidenciam uma proliferação do conceito para outras fronteiras, que normalmente não fazem parte do conhecimento difundido.
Em particular fica a dúvida se a migração do conceito se deu no sentido indiano-europeu ou vice-versa...

(texto corrigido em 9/8/2013)

Aditamento (comentário de JM Oliveira, 3.09.2013):
Em resposta à minha frase:
"Ainda que estes dólmens sejam diferentes dos encontrados na Europa"

O José Manuel teve a gentileza de apontar esta figura que dispensa mais comentários:


Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 06:27

Há Carris nos Açores... mas menos conhecidos. Teriam outro propósito que não servir para subsidiar rendas, rendilhados, subvenções vitalícias, com que a via direita alimenta a esquerda, e assim conduz os protestos da manada pelos carris programados...

São estas as imagens dos Açores, de carris definidos agora em pedra solidificada, que estão em causa:
Açores: imagens de carris "pré-históricos" - segundo ancient-wisdom.co.uk

Segundo a informação constante do site ancient-wisdom.co.uk

The presence of cart-ruts on the Azores is one of the most unexpected facts to present itself in the search for the first settlers on the Azores. The Portuguese cart-ruts are pre-Christian, as are those on Malta. As we have no record of their being made since the 'official' discovery of the Azores, we must assume that these were made by a people prior to the Portuguese.
... e sim, é tão surpreendente encontrar estes carris, tratando-se de registos "pré-cristãos", tais como os "carris" de Malta.

Serão apenas valetas naturais?
Vamos seguir a Malta, no encalço das valetas... não pela capital La Valeta, porque isso seria um gozo óbvio com a designação. Ao lado, sim, está a Ilha de Gozo... bem conhecida pelos monumentos megalíticos, onde também se encontram estas valetas:
Valetas ou carris, de Gozo, na Malta. 
(mais imagens em ancient-wisdom.co.uk

Estas valetas bem pronunciadas, sugerindo carris, não estão apenas no Gozo, encontram-se espalhadas nos diversos continentes. No mesmo site podemos encontrar registos em:
deixamos aqui a imagem dos que estão no Piódão:

Poderíamos seguir no encalço das espirais que também fazem parte de monumentos, onde?... bom, no Piódão, e não é que também é no Gozo?
  
Espirais no Gozo (Templo de Tarxien), e no Piódão (Vale da Égua).

As espirais não expiram no Gozo ou no Piódão... como é óbvio, encontram-se espalhadas por toda a cultura megalítica da Europa Atlântica (o José-Manuel já fez bastantes vezes referências a elas).

Encontra-se ainda em Gozo, uma referência a uma deusa-mãe:

Duas Estatuetas de deusa-mãe em Gozo. (ancient-wisdom.co.uk/malta.htm)
Estatueta boliviana de Pachamama (obtida em ucl.ac.uk)

Se a primeira figura de deusa-mãe remete para vénus neolíticas, como a de Willendorf, podendo anteceder o culto de Cíbele (deveria escrever-se Cúbele...), já a segunda tem demasiadas semelhanças com Pachamama... na região de Machupichu, para que não se note. 

A língua maltesa não é indo-europeia... e a explicação parece ser o domínio árabe durante 2 séculos.
Se em território nacional estiveram 5 séculos e 8 na Andaluzia... parece que aos árabes só o gato maltês não lhes comeu a língua, já nos outros casos o malte foi bem destilado.
Esta maneira de escrever pode parecer coisa de Puto, de Raia miúda, de Gaiato, invocando algumas piadas fonéticas fáceis... porém como temos visto as coisas são mais complicadas do que parecem.
Podemos falar de coincidências quando não passam a dezena, já é negação fazê-lo acima disso, mas quando as coincidências passam as centenas, como é o caso... então, negá-lo seria simples ocultação deliberada.

Falo ou não falo? Fá-lo ou não fá-lo?
Só havia deusas-mãe, símbolos exagerados de fertilidade?
Por Min, não... mas, já se sabe como foi e é a política de repressão cultural.
 
Culto do falo - deus egípcio Min.
Divindade primordial criadora.

Mais do que uma repressão de carácter sexual, terá começado por ser uma necessidade de repressão religiosa, destinada a erradicar os antigos cultos sexuais de fertilidade, que ofendiam a tradição judaica, tradição que o cristianismo bebeu pelos exageros.
Será de prever que todas as representações e símbolos fálicos explícitos, mais do que ocultados, foram pura e simplesmente destruídos e omitidos. 
Se parece ter-se mantido algum registo primevo na linguagem, parece ter sido remetido para as reprimidas asneiras populares... Gaia em gaja, com os gaiatos, Reia na raia miúda, Cupido como puto, e a mãe Vénus, como Laputa

Não há nenhum gozo no dom dos trocadilhos da língua portuguesa.
"Dom" é manifestação de "senhor" - alguém que exibia o "senho", que escondia uma "senha"... quando se brinca a clubes de Chaves, levando ao fundo de Caves... porque o "Ch" foi adulterado, escrevia-se "Chimera" para se ler "Quimera". 
As regras ortográficas tiveram propósitos notórios - por exemplo, ao fazer ler "cinco" como "sinco", mas não perdemos o "quinto" que nos recorda que deveria ler-se "quinco"... porque a convenção do "ce" se ler "se" ou do "ci" se ler "si" encerra milénios de deturpação e ocultação.

Haveria muito mais a dizer, mas terminamos com a ligação ao lado "Jovem", do Abraçadabra...
Gozo parece ter os monumentos megalíticos mais antigos... que aparecem numa ilha mediterrânica, há mais de 5000 anos. Há uma tradição da população posterior que liga a construtores gigantes... 
Esses construtores surgiram e morreram por ali? 
Ou antes de mais... certamente que os malteses não chegaram a nado a Malta! Teriam barcos.
Bom, a parte "jovem" é no sentido "jovial" de Jove, ou seja de Júpiter, filho de Saturno.
Como referimos no texto Abraçadabra  uma nova cultura haveria de suplantar a cultura pré-existente, e teria a sua germinação nas ilhas mediterrânicas. Tendo os indo-europeus dominado o continente, da Índia até à Europa Atlântica, faltaria o domínio sobre o Mediterrâneo. Cresceriam como potência naval a ocidente, e lançariam um ataque crucial a partir do seu domínio sobre essas ilhas (Malta, Sicília, Creta, Chipre), contra as populações estabelecidas na orla mediterrânica. Esse ataque seria manipulador, não destruiria as civilizações existentes... iria manobrá-las como colónias sujeitas à sua influência. Condicionariam a ascenção e queda dos restantes, procurando manter-se fora dos conflitos. Talvez a excepção tenha sido a até hoje enigmática invasão dos "povos do mar", após a Guerra de Tróia. 
Quando a influência chegou ao ponto de fundar uma colónia nas "barbas" dos aqueus, estes rebelaram-se, perante a ameaça externa... e rumaram em direcção à Tróia original. Aí foi preciso um reínicio que restabelecesse o poder, o poder onde ele sempre esteve... oculto.

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 07:55

Há Carris nos Açores... mas menos conhecidos. Teriam outro propósito que não servir para subsidiar rendas, rendilhados, subvenções vitalícias, com que a via direita alimenta a esquerda, e assim conduz os protestos da manada pelos carris programados...

São estas as imagens dos Açores, de carris definidos agora em pedra solidificada, que estão em causa:
Açores: imagens de carris "pré-históricos" - segundo ancient-wisdom.co.uk

Segundo a informação constante do site ancient-wisdom.co.uk

The presence of cart-ruts on the Azores is one of the most unexpected facts to present itself in the search for the first settlers on the Azores. The Portuguese cart-ruts are pre-Christian, as are those on Malta. As we have no record of their being made since the 'official' discovery of the Azores, we must assume that these were made by a people prior to the Portuguese.
... e sim, é tão surpreendente encontrar estes carris, tratando-se de registos "pré-cristãos", tais como os "carris" de Malta.

Serão apenas valetas naturais?
Vamos seguir a Malta, no encalço das valetas... não pela capital La Valeta, porque isso seria um gozo óbvio com a designação. Ao lado, sim, está a Ilha de Gozo... bem conhecida pelos monumentos megalíticos, onde também se encontram estas valetas:
Valetas ou carris, de Gozo, na Malta. 
(mais imagens em ancient-wisdom.co.uk

Estas valetas bem pronunciadas, sugerindo carris, não estão apenas no Gozo, encontram-se espalhadas nos diversos continentes. No mesmo site podemos encontrar registos em:
deixamos aqui a imagem dos que estão no Piódão:

Poderíamos seguir no encalço das espirais que também fazem parte de monumentos, onde?... bom, no Piódão, e não é que também é no Gozo?
  
Espirais no Gozo (Templo de Tarxien), e no Piódão (Vale da Égua).

As espirais não expiram no Gozo ou no Piódão... como é óbvio, encontram-se espalhadas por toda a cultura megalítica da Europa Atlântica (o José-Manuel já fez bastantes vezes referências a elas).

Encontra-se ainda em Gozo, uma referência a uma deusa-mãe:

Duas Estatuetas de deusa-mãe em Gozo. (ancient-wisdom.co.uk/malta.htm)
Estatueta boliviana de Pachamama (obtida em ucl.ac.uk)

Se a primeira figura de deusa-mãe remete para vénus neolíticas, como a de Willendorf, podendo anteceder o culto de Cíbele (deveria escrever-se Cúbele...), já a segunda tem demasiadas semelhanças com Pachamama... na região de Machupichu, para que não se note. 

A língua maltesa não é indo-europeia... e a explicação parece ser o domínio árabe durante 2 séculos.
Se em território nacional estiveram 5 séculos e 8 na Andaluzia... parece que aos árabes só o gato maltês não lhes comeu a língua, já nos outros casos o malte foi bem destilado.
Esta maneira de escrever pode parecer coisa de Puto, de Raia miúda, de Gaiato, invocando algumas piadas fonéticas fáceis... porém como temos visto as coisas são mais complicadas do que parecem.
Podemos falar de coincidências quando não passam a dezena, já é negação fazê-lo acima disso, mas quando as coincidências passam as centenas, como é o caso... então, negá-lo seria simples ocultação deliberada.

Falo ou não falo? Fá-lo ou não fá-lo?
Só havia deusas-mãe, símbolos exagerados de fertilidade?
Por Min, não... mas, já se sabe como foi e é a política de repressão cultural.
 
Culto do falo - deus egípcio Min.
Divindade primordial criadora.

Mais do que uma repressão de carácter sexual, terá começado por ser uma necessidade de repressão religiosa, destinada a erradicar os antigos cultos sexuais de fertilidade, que ofendiam a tradição judaica, tradição que o cristianismo bebeu pelos exageros.
Será de prever que todas as representações e símbolos fálicos explícitos, mais do que ocultados, foram pura e simplesmente destruídos e omitidos. 
Se parece ter-se mantido algum registo primevo na linguagem, parece ter sido remetido para as reprimidas asneiras populares... Gaia em gaja, com os gaiatos, Reia na raia miúda, Cupido como puto, e a mãe Vénus, como Laputa

Não há nenhum gozo no dom dos trocadilhos da língua portuguesa.
"Dom" é manifestação de "senhor" - alguém que exibia o "senho", que escondia uma "senha"... quando se brinca a clubes de Chaves, levando ao fundo de Caves... porque o "Ch" foi adulterado, escrevia-se "Chimera" para se ler "Quimera". 
As regras ortográficas tiveram propósitos notórios - por exemplo, ao fazer ler "cinco" como "sinco", mas não perdemos o "quinto" que nos recorda que deveria ler-se "quinco"... porque a convenção do "ce" se ler "se" ou do "ci" se ler "si" encerra milénios de deturpação e ocultação.

Haveria muito mais a dizer, mas terminamos com a ligação ao lado "Jovem", do Abraçadabra...
Gozo parece ter os monumentos megalíticos mais antigos... que aparecem numa ilha mediterrânica, há mais de 5000 anos. Há uma tradição da população posterior que liga a construtores gigantes... 
Esses construtores surgiram e morreram por ali? 
Ou antes de mais... certamente que os malteses não chegaram a nado a Malta! Teriam barcos.
Bom, a parte "jovem" é no sentido "jovial" de Jove, ou seja de Júpiter, filho de Saturno.
Como referimos no texto Abraçadabra  uma nova cultura haveria de suplantar a cultura pré-existente, e teria a sua germinação nas ilhas mediterrânicas. Tendo os indo-europeus dominado o continente, da Índia até à Europa Atlântica, faltaria o domínio sobre o Mediterrâneo. Cresceriam como potência naval a ocidente, e lançariam um ataque crucial a partir do seu domínio sobre essas ilhas (Malta, Sicília, Creta, Chipre), contra as populações estabelecidas na orla mediterrânica. Esse ataque seria manipulador, não destruiria as civilizações existentes... iria manobrá-las como colónias sujeitas à sua influência. Condicionariam a ascenção e queda dos restantes, procurando manter-se fora dos conflitos. Talvez a excepção tenha sido a até hoje enigmática invasão dos "povos do mar", após a Guerra de Tróia. 
Quando a influência chegou ao ponto de fundar uma colónia nas "barbas" dos aqueus, estes rebelaram-se, perante a ameaça externa... e rumaram em direcção à Tróia original. Aí foi preciso um reínicio que restabelecesse o poder, o poder onde ele sempre esteve... oculto.

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publicado às 07:55

Com chás (3)

23.07.13
Chá Mate.
O Chimarrão, ou Chá Mate, é uma infusão popular do Sul do Brasil até à Argentina, e também em toda a América do Sul. O recipiente por onde se bebe esta infusão é normalmente a parte inferior de uma cabaça (ou cuia):
Cabaça (cuia) por onde se bebe o chá mate.

O assunto do chá na cabaça parece ser aqui um pouco forçado, por via do título dos textos e tema anterior. No entanto, posso fazer uma ligação simples e interessante, indo parar rapidamente das pampas argentinas à zona sul, à Patagónia, cuja conquista se deu na transição para o Séc. XX. A partir daí, deixou-se de ouvir falar naquela raça de gigantes que enchia a imaginação europeia desde a viagem de Magalhães.
Sim, já falei disto aqui, aquiaqui ou aqui... e sendo certo que não gosto de me repetir, há um ligeiro detalhe que devo adicionar. Repisco a famosa imagem de contacto entre patagões e europeus, e ao lado coloco uma imagem do chinês Yao Ming, a estrela de basquetebol da NBA, que alinhou pelos Houston Rockets:
 
Imagem de Patagões no contacto europeu, e imagem de Yao Ming na NBA
(a ligação mostra ainda outros 5 jogadores de 2,30 m)
... a desproporção é muito semelhante.

Bom, e o que nos diz o "Viajante Universal", antes de falar sobre o Taiti... fala por acaso da "Terra Magallanica", da altura dos patagões, e de como era um mito infundado que fossem "gigantes", porque:
Sua controvertida estatura excede geralmente à dos Europeus: medidos escrupulosamente os mais altos, achou-se que não passavam de 7 pés e 1,25 polegadas (2,17 m); e a comum estatura era de 6,5 até 7 pés (ou seja, entre 2,00 e 2,13 metros). Segundo reflecte Mr. Bougainville não é tão notável seu talhe como sua corpulência, que em alguns chegava a 4 pés e 4 polegadas (1,35m) na circunferência do peito; porém seus pés e mãos não correspondem ao membrudo das outras partes (!) Todos estão cobertos de carne sem poder-se chamar gordos: a tensão de seus músculos manifesta a sua força, e não é desagradável sua figura (...)
Uma estatura que (nos medidos) variava entre 2 e 2,20 metros torna claro que a imagem da ilustração era bem verosímil, e estávamos em presença de um povo quase gigante, em que Yao Ming seria um indivíduo normal, e não uma excepção. Aliás, recordamos, era isso que dizia Buffon (1774-89):
- "As raças de gigantes antigamente tão comuns na Ásia, já aí não subsistem. Por que razão as encontramos hoje na América?"

Como dissemos, a pergunta de Buffon, teria uma actualização no Séc. XX:
- Por que razão desapareceram os gigantes do globo?
Há mercados e mercadorias, e a Argentina muito foi subsidiada pelos "mercados" na sua expansão irracional para o terreno patagão, conhecendo um crescimento económico notável no início do Séc. XX. Ao mesmo tempo os patagões foram aniquilados, e passaram a ser confundidos com os Tehuelche.

Por muito que tente a objectividade, há uma confusão de sentimentos associada ao drama de extinção de um povo que tinha o problema nato de ser diferente... dizia Camões (Lusíadas, Canto X - 141):
Dês que passar a via mais que meia
Que ao Antártico Pólo vai da Linha,
Düa estatura quási giganteia
Homens verá, da terra ali vizinha;
 
E mais avante o Estreito que se arreia
Co nome dele agora, o qual caminha
Pera outro mar e terra que fica onde
Com suas frias asas o Austro a esconde.
Agora, "Duma estatura quase gigantesca, homens já não verá..." porque a mediocridade assim o exigiu, e continuará a tentar exigir o impossível para que os ratos se possam esconder nos buracos financeiros, sendo certo que serão os primeiros a abandonar qualquer barca infernal que conduzam.

Qual a relação dos patagões com o chimarrão, com o chá mate?
Começa pelo nome dos seus fiéis cães:
- "São tão fieis companheiros destes Índios os cães, que rara vez os vimos sem um grande número deles: sua casta é quase semelhante à que em Buenos Aires chamam Cimarrões, dos quais certamente trazem a sua origem (...)"
Quanto à palavra "mate", talvez o "xeique-mate" tenha sido decidido à hora de Londres do chá, chá mate!
A pequena palha chamar-se bomba, também não remeterá necessariamente a bombear o líquido.
Depois, a história ganha detalhes mais sinistros, porque a própria zona Gaúcha, do Chimarrão, já teria uma imigração das Canárias, onde tinha ocorrido uma aniquilação dos Guanches, tidos também como gigantes, aquando da conquista espanhola... "com suas frias asas o Austro a esconde". Esta palavra "austro", que escondeu a ilha australiana, mostrou a bicéfala asa imperial da casa austríaca.

Infusão.
Poderia ficar por aqui, porque o tema assim se justificava.
Porém, esta relação está longe de ser suficiente para quem não aprecia chá...
Há muitas possibilidades de infusões... sendo que o simples chá de limão poderia ter constituído uma bebida popular. Porém, a própria escassez alimentar de citrinos, associada ao escorbuto, é outro facto que merece menção. O nome das laranjas estar associado ao nome de Portugal, é outro ponto que evidencia algo estranho. As laranjeiras eram árvores ornamentais, pelo menos entre persas e árabes.
Se é dito que o nome laranja vem do sânscrito "naranga", onde variou para "naranja" entre árabes, nós ficámos com essa derivação do nome, enquanto italianos, gregos, turcos, e outros árabes usavam "portocala" para designar a laranja. Portanto, usamos o nome vindo do Médio Oriente, e aí usa-se o nome vindo daqui? Não é isso que me leva a seguir o texto...

Afinal o que se bebia na Antiguidade até à Idade Média?... 
Não seria café, nem chá... nem sequer um cházinho de limão!
Bom, na Europa havia o vinho, as misturas com mel, hidromel, e variantes de cerveja. Porém, entre os árabes, por via religiosa, nem isso seria permitido. Há uma tradição do chá árabe, mas ainda assim parece vir da Pérsia, só no Séc. XV (tal como o café, por via etíope)... ou seja, quase ao mesmo tempo que os descobrimentos vão tomar essa importação de chá vinda da China. Na China seria já popular muitos séculos antes, sendo a sua introdução remetida a um dos 3 míticos soberanos chineses, Shennong.
Shenong faria uma investigação sobre a natureza das plantas, tal como os druídas celtas (simbolizados por Panoramix), ou outros xamãs, também se entreteriam com as suas "poções" e "mézinhas":

Da cabaça passamos ao caldeirão:
... afinal, quem estava associado à confecção de estranhas infusões com particularidades "mágicas"? 
... a livre ideia de ferver plantas colhidas no campo, seria benvinda a uma sociedade onde a apenas alguns estava reservado o direito de fazer "poções"?

Ou seja, para banir veleidades de experiências psicotrópicas com ervas, parecem ter sidos introduzidos bloqueadores morais. Na Idade Média fazer uma infusão num caldeirão seria algo associado à "bruxaria" ou "alquimia". Um simples cozinhado "não convencional" poderia ser conotado com práticas pouco recomendáveis de bruxaria. Se ao tempo dos druidas esses cozinhados estariam reservados a uma classe sacerdotal, com a chegada da Idade Média, nem tão pouco isso iria ser bem recebido.

As classes dirigentes da sociedade nunca viram o livre uso de plantas com bons olhos:
- o aspecto medicinal seria positivo, para alguns... mas o aspecto psicotrópico das drogas causaria um problema social grave. Uma coisa é a cocaína na Coca, outra coisa é o refrigerante Coca Cola.
Por isso, a chegada do chá, do café, coincidiu com uma prática alargada que foi recuperar medicamentos nas selvas tropicais, ou outras paragens remotas, como no caso das Quinas e do quinino.

Subitamente a sociedade admitia de novo a experimentação de plantas para o uso benéfico da população, com a contrapartida de controlar o problema nefasto do seu abuso... Mas, foi paradigmático a China, de onde saíra o simbólico chá, ver-se confrontada com a alienação da população por via da Guerra do Ópio.

Transversalmente, nas mais diversas tribos do globo, aparece uma prática religiosa de xamãs que criam condições de alteração de consciência, seja através de plantas, de venenos em doses toleradas, ou outras. A medicina ligava-se às práticas religiosas neste aspecto, sendo comum o duplo papel - médico e religioso, dos xamãs.
Os xamãs em diferentes culturas (imagem da wikipedia)

Nalgumas tribos índias o ritual de iniciação da adolescência passava por um retiro introspectivo do indivíduo, sujeito a alterações de consciência (plantas, veneno de serpente), que o confrontavam consigo próprio, com os seus medos e fantasmas. Serviria como uma entrada num mundo espiritual, mas não visaria apenas a educação do próprio jovem... serviria também para que desse relevo de realidade a um mundo de espíritos, onde contaria com o seu xamã como guardião.
Peter Gabriel - San Jacinto
(relatando a experiência iniciática de um jovem índio)
I hold the line - the line of strength that pulls me through the fear 
San Jacinto - I hold the line 
San Jacinto - the poison bite and darkness take my sight - 
I hold the line - And the tears roll down my swollen cheek - think I'm losing it - getting weaker 
I hold the line - I hold the line San Jacinto - yellow eagle flies down from the sun - from the sun

Ao contrário de uma sociedade tribal, as civilizações desenvolveram-se numa base de privacidade, onde a individualidade não é respeitada, é condicionada. Numa pequena tribo, os conceitos de privacidade fazem pouco sentido e, por outro lado, conhecendo-se melhor os convivas, os seus problemas serão problemas de todo o grupo. Ao contrário, as civilizações fizeram pagar a privacidade com a desconfiança... sendo permitidos segredos, são todos suspeitos disso mesmo. Por melhores sistemas de vigilância que sejam implementados, a desconfiança serve apenas como chama que se alimenta a si própria.

Os xamãs, e análogos, encontram um mundo alternativo... de universos que se quiseram impor e sucumbiram às próprias contradições. Um caos ausente que encontra uma porta para se manifestar através de irracionalidades presentes... irracionalidades que na sua contradição têm tanto de destruidoras, como de criadoras de belos universos em manifestações artísticas. Um caos presente na iminência destruidora de uma simples sinapse de comando, contra uma ordem regeneradora, que se soube sobrepor à aniquilação. E falo no passado, porque é o passado de todos os universos que falharam, mas que reservaram o direito de se manifestar no único que os poderia albergar. Foi esse o preço da racionalidade albergar a irracionalidade, a beleza, a inocência do amor, as incertezas, e a perversidade hedonista e niilista das suas manipulações... é isso que teremos que transportar em cada presente - todas ilusões e mentiras colapsadas dos "amanhãs que cantariam", e que encontraram maior expressão na única porta que lhes ficou aberta - a irracionalidade e aparente fragilidade humana.


Nota adicional (24/7/2013)
Não sendo o chá, propriamente dito, objecto de análise destes textos que escrevi, não quero deixar de sinalizar uma bela obra: 
(1905)

Começa assim a prosa romantizada de Venceslau de Moraes:
É no Oriente, e em especial no Extremo-Oriente, que as coisas communs da creação ou os usos e costumes triviaes da vida são susceptiveis de merecer um tal requinte de solemnidade sentimental e de praxes de rito, que constituam um verdadeiro culto. No espirito do europeu, despoetizado pela chateza dos ideais da epoca, atribulado pelas multiplices exigencias da vida, pervertido pela febre do negocio, não medram de há muito os cultos. Especializando a observação ao chá, havemos de convir que este artigo de commercio, que de tão longe nos vem, propositadamente adulterado conforme o nosso gosto, no fim de contas se resume n'uma detestavel infusão que entrou em moda no sport social, simples pretexto para repastos pelintras, para reuniões banaes, para palestras vãs. 
Este parágrafo ilustra bem como a generalidade da sociedade ocidental iria tratar a informação... os barões assinalados teriam as suas bibliotecas privadas de espampanantes encadernações... de livros nunca abertos.
As camélias chinesas ou japonesas serviriam um ritual de chá que seria uma encadernação do livro que tinha outro significado quando reportado ao local de origem.
Num pequeno texto, fácil de ler, Moraes coloca muita informação sobre o ritual do chá no Japão, que vai desde mitos, costumes, histórias, até à própria produção, em particular no rio Uji:


O texto de Moraes está decorado com belas e informativas ilustrações japonesas da época, que servem como uma fotografia de tempos passados a Oriente, no quadro duma estabilidade colonial e comercial da belle époque que antecederia as convulsões mundiais do Séc. XX.

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Com chás (3)

23.07.13
Chá Mate.
O Chimarrão, ou Chá Mate, é uma infusão popular do Sul do Brasil até à Argentina, e também em toda a América do Sul. O recipiente por onde se bebe esta infusão é normalmente a parte inferior de uma cabaça (ou cuia):
Cabaça (cuia) por onde se bebe o chá mate.

O assunto do chá na cabaça parece ser aqui um pouco forçado, por via do título dos textos e tema anterior. No entanto, posso fazer uma ligação simples e interessante, indo parar rapidamente das pampas argentinas à zona sul, à Patagónia, cuja conquista se deu na transição para o Séc. XX. A partir daí, deixou-se de ouvir falar naquela raça de gigantes que enchia a imaginação europeia desde a viagem de Magalhães.
Sim, já falei disto aqui, aquiaqui ou aqui... e sendo certo que não gosto de me repetir, há um ligeiro detalhe que devo adicionar. Repisco a famosa imagem de contacto entre patagões e europeus, e ao lado coloco uma imagem do chinês Yao Ming, a estrela de basquetebol da NBA, que alinhou pelos Houston Rockets:
 
Imagem de Patagões no contacto europeu, e imagem de Yao Ming na NBA
(a ligação mostra ainda outros 5 jogadores de 2,30 m)
... a desproporção é muito semelhante.

Bom, e o que nos diz o "Viajante Universal", antes de falar sobre o Taiti... fala por acaso da "Terra Magallanica", da altura dos patagões, e de como era um mito infundado que fossem "gigantes", porque:
Sua controvertida estatura excede geralmente à dos Europeus: medidos escrupulosamente os mais altos, achou-se que não passavam de 7 pés e 1,25 polegadas (2,17 m); e a comum estatura era de 6,5 até 7 pés (ou seja, entre 2,00 e 2,13 metros). Segundo reflecte Mr. Bougainville não é tão notável seu talhe como sua corpulência, que em alguns chegava a 4 pés e 4 polegadas (1,35m) na circunferência do peito; porém seus pés e mãos não correspondem ao membrudo das outras partes (!) Todos estão cobertos de carne sem poder-se chamar gordos: a tensão de seus músculos manifesta a sua força, e não é desagradável sua figura (...)
Uma estatura que (nos medidos) variava entre 2 e 2,20 metros torna claro que a imagem da ilustração era bem verosímil, e estávamos em presença de um povo quase gigante, em que Yao Ming seria um indivíduo normal, e não uma excepção. Aliás, recordamos, era isso que dizia Buffon (1774-89):
- "As raças de gigantes antigamente tão comuns na Ásia, já aí não subsistem. Por que razão as encontramos hoje na América?"

Como dissemos, a pergunta de Buffon, teria uma actualização no Séc. XX:
- Por que razão desapareceram os gigantes do globo?
Há mercados e mercadorias, e a Argentina muito foi subsidiada pelos "mercados" na sua expansão irracional para o terreno patagão, conhecendo um crescimento económico notável no início do Séc. XX. Ao mesmo tempo os patagões foram aniquilados, e passaram a ser confundidos com os Tehuelche.

Por muito que tente a objectividade, há uma confusão de sentimentos associada ao drama de extinção de um povo que tinha o problema nato de ser diferente... dizia Camões (Lusíadas, Canto X - 141):
Dês que passar a via mais que meia
Que ao Antártico Pólo vai da Linha,
Düa estatura quási giganteia
Homens verá, da terra ali vizinha;
 
E mais avante o Estreito que se arreia
Co nome dele agora, o qual caminha
Pera outro mar e terra que fica onde
Com suas frias asas o Austro a esconde.
Agora, "Duma estatura quase gigantesca, homens já não verá..." porque a mediocridade assim o exigiu, e continuará a tentar exigir o impossível para que os ratos se possam esconder nos buracos financeiros, sendo certo que serão os primeiros a abandonar qualquer barca infernal que conduzam.

Qual a relação dos patagões com o chimarrão, com o chá mate?
Começa pelo nome dos seus fiéis cães:
- "São tão fieis companheiros destes Índios os cães, que rara vez os vimos sem um grande número deles: sua casta é quase semelhante à que em Buenos Aires chamam Cimarrões, dos quais certamente trazem a sua origem (...)"
Quanto à palavra "mate", talvez o "xeique-mate" tenha sido decidido à hora de Londres do chá, chá mate!
A pequena palha chamar-se bomba, também não remeterá necessariamente a bombear o líquido.
Depois, a história ganha detalhes mais sinistros, porque a própria zona Gaúcha, do Chimarrão, já teria uma imigração das Canárias, onde tinha ocorrido uma aniquilação dos Guanches, tidos também como gigantes, aquando da conquista espanhola... "com suas frias asas o Austro a esconde". Esta palavra "austro", que escondeu a ilha australiana, mostrou a bicéfala asa imperial da casa austríaca.

Infusão.
Poderia ficar por aqui, porque o tema assim se justificava.
Porém, esta relação está longe de ser suficiente para quem não aprecia chá...
Há muitas possibilidades de infusões... sendo que o simples chá de limão poderia ter constituído uma bebida popular. Porém, a própria escassez alimentar de citrinos, associada ao escorbuto, é outro facto que merece menção. O nome das laranjas estar associado ao nome de Portugal, é outro ponto que evidencia algo estranho. As laranjeiras eram árvores ornamentais, pelo menos entre persas e árabes.
Se é dito que o nome laranja vem do sânscrito "naranga", onde variou para "naranja" entre árabes, nós ficámos com essa derivação do nome, enquanto italianos, gregos, turcos, e outros árabes usavam "portocala" para designar a laranja. Portanto, usamos o nome vindo do Médio Oriente, e aí usa-se o nome vindo daqui? Não é isso que me leva a seguir o texto...

Afinal o que se bebia na Antiguidade até à Idade Média?... 
Não seria café, nem chá... nem sequer um cházinho de limão!
Bom, na Europa havia o vinho, as misturas com mel, hidromel, e variantes de cerveja. Porém, entre os árabes, por via religiosa, nem isso seria permitido. Há uma tradição do chá árabe, mas ainda assim parece vir da Pérsia, só no Séc. XV (tal como o café, por via etíope)... ou seja, quase ao mesmo tempo que os descobrimentos vão tomar essa importação de chá vinda da China. Na China seria já popular muitos séculos antes, sendo a sua introdução remetida a um dos 3 míticos soberanos chineses, Shennong.
Shenong faria uma investigação sobre a natureza das plantas, tal como os druídas celtas (simbolizados por Panoramix), ou outros xamãs, também se entreteriam com as suas "poções" e "mézinhas":

Da cabaça passamos ao caldeirão:
... afinal, quem estava associado à confecção de estranhas infusões com particularidades "mágicas"? 
... a livre ideia de ferver plantas colhidas no campo, seria benvinda a uma sociedade onde a apenas alguns estava reservado o direito de fazer "poções"?

Ou seja, para banir veleidades de experiências psicotrópicas com ervas, parecem ter sidos introduzidos bloqueadores morais. Na Idade Média fazer uma infusão num caldeirão seria algo associado à "bruxaria" ou "alquimia". Um simples cozinhado "não convencional" poderia ser conotado com práticas pouco recomendáveis de bruxaria. Se ao tempo dos druidas esses cozinhados estariam reservados a uma classe sacerdotal, com a chegada da Idade Média, nem tão pouco isso iria ser bem recebido.

As classes dirigentes da sociedade nunca viram o livre uso de plantas com bons olhos:
- o aspecto medicinal seria positivo, para alguns... mas o aspecto psicotrópico das drogas causaria um problema social grave. Uma coisa é a cocaína na Coca, outra coisa é o refrigerante Coca Cola.
Por isso, a chegada do chá, do café, coincidiu com uma prática alargada que foi recuperar medicamentos nas selvas tropicais, ou outras paragens remotas, como no caso das Quinas e do quinino.

Subitamente a sociedade admitia de novo a experimentação de plantas para o uso benéfico da população, com a contrapartida de controlar o problema nefasto do seu abuso... Mas, foi paradigmático a China, de onde saíra o simbólico chá, ver-se confrontada com a alienação da população por via da Guerra do Ópio.

Transversalmente, nas mais diversas tribos do globo, aparece uma prática religiosa de xamãs que criam condições de alteração de consciência, seja através de plantas, de venenos em doses toleradas, ou outras. A medicina ligava-se às práticas religiosas neste aspecto, sendo comum o duplo papel - médico e religioso, dos xamãs.
Os xamãs em diferentes culturas (imagem da wikipedia)

Nalgumas tribos índias o ritual de iniciação da adolescência passava por um retiro introspectivo do indivíduo, sujeito a alterações de consciência (plantas, veneno de serpente), que o confrontavam consigo próprio, com os seus medos e fantasmas. Serviria como uma entrada num mundo espiritual, mas não visaria apenas a educação do próprio jovem... serviria também para que desse relevo de realidade a um mundo de espíritos, onde contaria com o seu xamã como guardião.
Peter Gabriel - San Jacinto
(relatando a experiência iniciática de um jovem índio)
I hold the line - the line of strength that pulls me through the fear 
San Jacinto - I hold the line 
San Jacinto - the poison bite and darkness take my sight - 
I hold the line - And the tears roll down my swollen cheek - think I'm losing it - getting weaker 
I hold the line - I hold the line San Jacinto - yellow eagle flies down from the sun - from the sun

Ao contrário de uma sociedade tribal, as civilizações desenvolveram-se numa base de privacidade, onde a individualidade não é respeitada, é condicionada. Numa pequena tribo, os conceitos de privacidade fazem pouco sentido e, por outro lado, conhecendo-se melhor os convivas, os seus problemas serão problemas de todo o grupo. Ao contrário, as civilizações fizeram pagar a privacidade com a desconfiança... sendo permitidos segredos, são todos suspeitos disso mesmo. Por melhores sistemas de vigilância que sejam implementados, a desconfiança serve apenas como chama que se alimenta a si própria.

Os xamãs, e análogos, encontram um mundo alternativo... de universos que se quiseram impor e sucumbiram às próprias contradições. Um caos ausente que encontra uma porta para se manifestar através de irracionalidades presentes... irracionalidades que na sua contradição têm tanto de destruidoras, como de criadoras de belos universos em manifestações artísticas. Um caos presente na iminência destruidora de uma simples sinapse de comando, contra uma ordem regeneradora, que se soube sobrepor à aniquilação. E falo no passado, porque é o passado de todos os universos que falharam, mas que reservaram o direito de se manifestar no único que os poderia albergar. Foi esse o preço da racionalidade albergar a irracionalidade, a beleza, a inocência do amor, as incertezas, e a perversidade hedonista e niilista das suas manipulações... é isso que teremos que transportar em cada presente - todas ilusões e mentiras colapsadas dos "amanhãs que cantariam", e que encontraram maior expressão na única porta que lhes ficou aberta - a irracionalidade e aparente fragilidade humana.


Nota adicional (24/7/2013)
Não sendo o chá, propriamente dito, objecto de análise destes textos que escrevi, não quero deixar de sinalizar uma bela obra: 
(1905)

Começa assim a prosa romantizada de Venceslau de Moraes:
É no Oriente, e em especial no Extremo-Oriente, que as coisas communs da creação ou os usos e costumes triviaes da vida são susceptiveis de merecer um tal requinte de solemnidade sentimental e de praxes de rito, que constituam um verdadeiro culto. No espirito do europeu, despoetizado pela chateza dos ideais da epoca, atribulado pelas multiplices exigencias da vida, pervertido pela febre do negocio, não medram de há muito os cultos. Especializando a observação ao chá, havemos de convir que este artigo de commercio, que de tão longe nos vem, propositadamente adulterado conforme o nosso gosto, no fim de contas se resume n'uma detestavel infusão que entrou em moda no sport social, simples pretexto para repastos pelintras, para reuniões banaes, para palestras vãs. 
Este parágrafo ilustra bem como a generalidade da sociedade ocidental iria tratar a informação... os barões assinalados teriam as suas bibliotecas privadas de espampanantes encadernações... de livros nunca abertos.
As camélias chinesas ou japonesas serviriam um ritual de chá que seria uma encadernação do livro que tinha outro significado quando reportado ao local de origem.
Num pequeno texto, fácil de ler, Moraes coloca muita informação sobre o ritual do chá no Japão, que vai desde mitos, costumes, histórias, até à própria produção, em particular no rio Uji:


O texto de Moraes está decorado com belas e informativas ilustrações japonesas da época, que servem como uma fotografia de tempos passados a Oriente, no quadro duma estabilidade colonial e comercial da belle époque que antecederia as convulsões mundiais do Séc. XX.

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publicado às 06:05

Com chás

10.07.13
Perante as informações dispersas, algo contraditórias, abundantes na irrelevância e escassas na importância, é sempre um risco especular novas hipóteses sobre as primeiras migrações humanas. Não há suficiente informação nem para rebater, nem para sustentar categoricamente nenhuma hipótese... o resto é inércia conveniente. Com chás, é mais fácil alinhar pela teoria que se foi estabelecendo, por mais interrogações que se deixem sem resposta... mas o espírito inquieto prefere o caminho das conchas - neste caso procurar uma versão consistente que responda a interrogações fundamentais.

Constava no Séc. XVI que o nome Nova Guiné era devido à oposição à outra Guiné, africana. Tal como a Guiana, todas estas terras partilhavam a proximidade equatorial em diversos continentes. 
O registo mais antigo do nome Guiana é o nome do território basco francês, na zona da Aquitânia, que esteve na origem da Guerra dos Cem Anos.
Essa Guiana occitana fazia parte dos domínios ingleses, nomeadamente de Eduardo III, fundador da Ordem da Jarreteira, que quebrando as promessas de paz com o rei francês, passou o Ducado da Guiana ao filho, o Princípe Negro, Eduardo de Woodstock! A mesma Guiana esteve em posse do irmão, Eduardo de Gant, pai de D. Filipa de Lencastre... e foi reivindicação inglesa até ao fim da Guerra dos Cem Anos.

De forma rápida, chegamos da Guiana occitana/basca ao nome da Nova Guiné, e no texto anterior procurámos ver se fazia sentido o caminho inverso, partindo de uma Velha Guiana.

Tudo isto parece arbitrário, mas há uma questão fundamental, que carece de resposta:
- Como manter no decurso de milénios uma guerra brutal entre tribos rivais numa ilha limitada?
- Não seria natural que uma das tribos ganhasse ascendente, aniquilando as restantes?
Quando a violência vai ao ponto de antropofagia cultural, o único valor dados aos outros parecia ser o de recurso alimentar... No entanto, as diversas tribos coexistiram ao ponto de criarem quase 900 línguas diferentes, o que mostra uma assumida diferença e herança ancestral.
Como manter o equilíbrio entre tribos que visavam aniquilar as outras?
Ao fim de tantos milénios, o que evitou que uma das tribos crescesse a ponto de criar um exército de guerreiros que derrotasse as restantes?... 
Como se deu o controlo populacional na ilha?
Eram as batalhas apenas rituais destinados a esse controlo populacional? Ou seja, não visavam a destruição dos rivais, mas apenas uma "selecção" dos mais jovens?
Afinal, se a agricultura deu ali os primeiros passos, e se havia uma técnica apurada no manejo de arco e flecha, acrescido do uso de venenos naturais, onde foi estabelecido o limite do génio inovador, para estabelecerem novas defesas e armamento? 
A imaginação ficou nos rituais algo estranhos e exóticos? 
Quem orientou essa educação guerreira ineficaz para batalha?
Quem aconselharia uma política não expansionista, deixando a tribo sob ameaça constante de se ver aniquilada (ou comida...) pelas tribos rivais?

Portanto, há aqui uma quantidade apreciável de perguntas que estão sem resposta.
À falta de melhor, a única resposta que encontro é a de uma coordenação global dos xamãs locais.
Os xamãs, conselheiros típicos da favorabilidade da batalha, da educação condicionada por rituais, exerceriam um papel fulcral na formação daquelas sociedades. A eventual fragilidade de cada um seria irrelevante perante o papel coordenado dos restantes. Ou seja, se um fosse banido, essa tribo arriscaria o ataque coordenado das outras tribos, ordenado pelos outros xamãs... 

Esta evolução para uma coordenação entre xamãs seria um processo natural de reflexão social. 
Afinal, quando uma tribo dominasse por completo a ilha, o que se seguiria? 
Uma regência única? Não havendo inimigos na ilha, entrar-se-ia numa competição interna... mas onde apareceriam esses focos de dissensão, seriam controlados pelos xamãs, ou organizariam-se contra eles?
Como se controlaria uma explosão populacional? 
Rapa Nui (pintura de Hodges, 1775) e o problema dos Coelhos da Páscoa...

Um aumento descontrolado da população esgotaria os espaços e os recursos, entrando-se num conflito e colapso social, semelhante ao que se supõe ter ocorrido na Ilha da Páscoa.
As ilhas polinésias apresentavam esta dualidade... por um lado ambientes paradisíacos, mas quando a liberdade permitia o descontrolo populacional, a reprodução dos coelhinhos era um modelo inevitável para prever o que se seguiria - um esgotar de recursos, conflitos crescentes caóticos levando ao colapso social.
Por isso, a nova "Paz-côa", a "paz filtrada", trazia um ovo diferente do de Colombo[*], trazia um acordo de paz que visaria um controlo populacional... o "crescei e multiplicai-vos" tinha o limite Malthusiano, o limite da estrutura para os recursos disponíveis. 
[*] Sobre a tradição dos ovos da Páscoa, 

Não é preciso ler Robinson Crusoe, para ver que os paraísos tropicais traziam vários problemas, onde foram aplicadas diversas soluções ao longo de gerações... normalmente condicionando a mentalidade pela educação, pelos rituais, pela cultura, pelas histórias. Não se trataria apenas de um problema de sobrevivência, seguir-se-ia um problema de vivência... ou seja, que objectivos de vida manteriam um funcionamento regular da sociedade?  Sob esse aspecto, a manutenção dos inimigos tribais, como na Nova Guiné, reteria um foco de atenção para a vivência... parece ter sido essa a solução encontrada, durante inúmeras gerações.
No Taiti, ilha cuja descoberta deve remontar a Pedro Fernandes Queirós[**], ocorreu a famosa história da revolta da Bounty. Alguns marinheiros amotinaram-se, querendo viver em tal paraíso, ofereceram armas para o desequilíbrio de forças, em favor de um rei, Pomare I, que assegurou o controlo total da ilha entre 1788 e 1791. O capitão Bligh retornou, e perante a ameaça externa o rei entregou os amotinados que lhe tinham fornecido o poder. O Taiti entraria em contacto com os ocidentais como reino unificado, mas em 1842 os franceses usariam as famílias dos rivais depostos para impor um protectorado francês contra a rainha Pomare IV, e ainda hoje o Taiti faz parte da França (... o país modelo da liberdade dos povos, que nunca abdicou das suas colónias, sem deixar de acusar os outros de colonialismo).
Sim, é verdade que falta a folha com as páginas 110 e 111, mas o 
borrão consegue fazer ler o nome de Pedro Fernandes Queirós
(... foi pior a emenda que o soneto!)

Ainda sobre o Taiti, o mesmo livro "O Viajante Universal" refere a particularidade de na viagem de Wallis ter sido reportado haver habitantes "ruivos", e Bougainville, chegando no ano seguinte, refere o uso de conchas como castanholas, e de pérolas como o único meio de moeda de troca. 
O Taiti afinal tanto tempo incógnito é abordado por Wallis, Bougainville e Cook em 1767, 1768 e 1769.
Os espanhóis cruzariam o Pacífico durante 250 anos, e afinal parecia difícil era não passar pelo Taiti.
A viagem de Cook tem um propósito científico - o trânsito de Vénus em Junho de 1769.
O mítico nascimento de Vénus, como pérola saída de uma concha
... parece "maluquice" uma mulher sair de uma concha, mas isso depende do tamanho da concha:
Segundo o National Geographic as conchas da 
zona do Recife Australiano podem atingir... 1m 20cm.
Com essa dimensão, poderiam bem albergar uma criança!

Portanto, afinal a ideia de uma criança poder sair de uma concha, faz sentido na zona das Ilhas Malucas, nos Mares Austrais... e as pérolas, as pérolas saem de "Ostras", ou será preciso "ostracizar" para dizer que saem de "Austras"?
Quanto às pérolas taitianas podem ser "pérolas negras", e como dissémos, serviam de moeda. 
Desde os primeiros registos civilizacionais que foi dada grande importância às pérolas, antes mesmo de pedras preciosas, porque saíam naturalmente brilhantes da "ostra". 
Sumérios, chineses, egípcios, japoneses, gregos, romanos, etc... todos tinham os seus pescadores de pérolas... os hindus afirmariam que teria sido Krishna a criar a primeira. Diferentes culturas, algumas que pouco teriam de marítimas, teriam os seus mergulhadores especializados em suster respiração e encontrar pérolas nas ostras. A maior pérola é disforme e ostenta o nome de Lao Tzé. Cleópatra dissolveu uma pérola para mostrar a Marco António que poderia ter uma refeição mais cara que o orçamento de uma cidade, e outras pérolas como "La Peregrina" têm histórias de 500 anos.

Se há local que tipicamente se prestava a uma população marítima vocacionada para apanhar as primeiras pérolas terá sido a Oceania. Bom, e agora vamos regressar ao mapa do logotipo:
O que tem de especial, de novo, este mapa?
Não é o que tem... é o que falta.
O último registo marcado a Oriente... é a Nova Guiné!
Os mapas começam a ser modificados, e são sucessivamente inventados contornos alternativos...
A Nova Guiné vai ficar incompleta, a Austrália não vai aparecer, o mundo fica suspenso até Cook.
Timidamente serão marcadas as Ilhas Salomão (o nome parece simbólico), ao lado da Nova Guiné, e os holandeses vão arriscar entrar pela Austrália até ao limite definido pelo meridiano português de Tordesilhas (convém reparar que os holandeses se especializaram mais no hemisfério português).

A pérola com o nome "La Peregrina" leva-nos à continuação!
Qual era a rota de peregrinação típica durante quase toda a Idade Média?
Havia a cruzada a Jerusalém, a via Francigena, que levava a Roma... mas curiosamente a peregrinação mais importante, era a de Santiago de Compostela:
Caminhos europeus de Santiago de Compostela
"Estrada de Santiago"... a Via Láctea 
A vieira indicando o Caminho de Santiago.

O que fazia tantos peregrinos europeus seguirem a rota do Apóstolo Santo Iago?
É claro que havia todo o factor religioso, mas nem sequer podemos considerar que se tratasse de uma figura crucial no cristianismo, e mesmo a lenda envolvendo a sua presença na Galiza seria muito controversa.
Acresce que a Estrada de Santiago nem acabaria ali... muitos seguiam o caminho até Finisterra!
Finisterra, onde seria o ponto mais ocidental (por erro, já que era o Cabo Magno), e constando que as rotas eram mais ancestrais, remetem-nos para uma tradição celta, associada a quê?
- À Vieira... que se diz também "venera", ou seja, a uma Vénus, saída da concha!

É claro que a vieira foi tida como símbolo do peregrino pela sua eventual utilidade para beber água, tal como a cabaça... mas sobre a cabaça evitarei falar. Apenas direi que se a concha tinha este lado feminino, a cabaça, um dos primeiros alvos de agricultura, poderia encerrar um aspecto masculino... que se resume no contexto da Oceania à palavra koteka, porque as coisas são como são, e o resto são preconceitos induzidos pelos xamãs da nossa cultura. É assumido que os cultos de fertilidade foram primevos.
Bom, e se as taitianas usavam conchas, a migração cigana da Índia até à Andaluzia popularizou as castanholas
... que têm origem reportada aos fenícios, afinal a civilização que se baseou num domínio marítimo, desde o Mediterrâneo até ao Atlântico. Seriam os fenícios a definir o alfabeto que dominaria o mundo das línguas indo-europeias, e não só.

Compostela poderia aparecer no contexto de peregrinação marítima como uma rota que terminava num grande lago proibido à navegação, seria um "santo lago" que se ligava a "Santo Iago", tal como alguns cultos de Santo Antão estão claramente ligados às Antas. Curiosamente a outra Santiago, do Chile, foi repousar à beira de um lago ainda maior, o oceano Pacífico. Com o decorrer das descobertas, o caminho estava aberto para o lago atlântico, e a contra-reforma terminou a harmonia católica - o caminho de Santiago deixou de ser popular durante os quase cinco séculos seguintes, tendo apenas sido reavivado recentemente.

Objectivamente, o que se pode reter daqui?
Muito pouco, grande parte do texto pode ser considerado especulativo e arbitrário nas associações.
Afinal, se Vénus é Venera, daí tanto vem a palavra "venerar" como a palavra "venérea". 
Se um Puto é um pequeno anjo, associável a Cupido, para fazermos o feminino associado à mãe Vénus, devemos recorrer ao filme japonês LaPuta: Castle in the Sky, em que o nome Laputa se refere a uma cidade nos céus, na obra Gulliver de Jonathan Swift.
Os xamãs guardaram os métodos e as conchinhas, os cravos e as pimentas, e no seu percurso peregrino fizeram as naves subir aos céus, até que reencontraram o simbolismo perdido. Superada a prova, passaram a magos que bebem chá... os problemas são os mesmos, e os métodos pouco diferentes.

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publicado às 06:48

Com chás

10.07.13
Perante as informações dispersas, algo contraditórias, abundantes na irrelevância e escassas na importância, é sempre um risco especular novas hipóteses sobre as primeiras migrações humanas. Não há suficiente informação nem para rebater, nem para sustentar categoricamente nenhuma hipótese... o resto é inércia conveniente. Com chás, é mais fácil alinhar pela teoria que se foi estabelecendo, por mais interrogações que se deixem sem resposta... mas o espírito inquieto prefere o caminho das conchas - neste caso procurar uma versão consistente que responda a interrogações fundamentais.

Constava no Séc. XVI que o nome Nova Guiné era devido à oposição à outra Guiné, africana. Tal como a Guiana, todas estas terras partilhavam a proximidade equatorial em diversos continentes. 
O registo mais antigo do nome Guiana é o nome do território basco francês, na zona da Aquitânia, que esteve na origem da Guerra dos Cem Anos.
Essa Guiana occitana fazia parte dos domínios ingleses, nomeadamente de Eduardo III, fundador da Ordem da Jarreteira, que quebrando as promessas de paz com o rei francês, passou o Ducado da Guiana ao filho, o Princípe Negro, Eduardo de Woodstock! A mesma Guiana esteve em posse do irmão, Eduardo de Gant, pai de D. Filipa de Lencastre... e foi reivindicação inglesa até ao fim da Guerra dos Cem Anos.

De forma rápida, chegamos da Guiana occitana/basca ao nome da Nova Guiné, e no texto anterior procurámos ver se fazia sentido o caminho inverso, partindo de uma Velha Guiana.

Tudo isto parece arbitrário, mas há uma questão fundamental, que carece de resposta:
- Como manter no decurso de milénios uma guerra brutal entre tribos rivais numa ilha limitada?
- Não seria natural que uma das tribos ganhasse ascendente, aniquilando as restantes?
Quando a violência vai ao ponto de antropofagia cultural, o único valor dados aos outros parecia ser o de recurso alimentar... No entanto, as diversas tribos coexistiram ao ponto de criarem quase 900 línguas diferentes, o que mostra uma assumida diferença e herança ancestral.
Como manter o equilíbrio entre tribos que visavam aniquilar as outras?
Ao fim de tantos milénios, o que evitou que uma das tribos crescesse a ponto de criar um exército de guerreiros que derrotasse as restantes?... 
Como se deu o controlo populacional na ilha?
Eram as batalhas apenas rituais destinados a esse controlo populacional? Ou seja, não visavam a destruição dos rivais, mas apenas uma "selecção" dos mais jovens?
Afinal, se a agricultura deu ali os primeiros passos, e se havia uma técnica apurada no manejo de arco e flecha, acrescido do uso de venenos naturais, onde foi estabelecido o limite do génio inovador, para estabelecerem novas defesas e armamento? 
A imaginação ficou nos rituais algo estranhos e exóticos? 
Quem orientou essa educação guerreira ineficaz para batalha?
Quem aconselharia uma política não expansionista, deixando a tribo sob ameaça constante de se ver aniquilada (ou comida...) pelas tribos rivais?

Portanto, há aqui uma quantidade apreciável de perguntas que estão sem resposta.
À falta de melhor, a única resposta que encontro é a de uma coordenação global dos xamãs locais.
Os xamãs, conselheiros típicos da favorabilidade da batalha, da educação condicionada por rituais, exerceriam um papel fulcral na formação daquelas sociedades. A eventual fragilidade de cada um seria irrelevante perante o papel coordenado dos restantes. Ou seja, se um fosse banido, essa tribo arriscaria o ataque coordenado das outras tribos, ordenado pelos outros xamãs... 

Esta evolução para uma coordenação entre xamãs seria um processo natural de reflexão social. 
Afinal, quando uma tribo dominasse por completo a ilha, o que se seguiria? 
Uma regência única? Não havendo inimigos na ilha, entrar-se-ia numa competição interna... mas onde apareceriam esses focos de dissensão, seriam controlados pelos xamãs, ou organizariam-se contra eles?
Como se controlaria uma explosão populacional? 
Rapa Nui (pintura de Hodges, 1775) e o problema dos Coelhos da Páscoa...

Um aumento descontrolado da população esgotaria os espaços e os recursos, entrando-se num conflito e colapso social, semelhante ao que se supõe ter ocorrido na Ilha da Páscoa.
As ilhas polinésias apresentavam esta dualidade... por um lado ambientes paradisíacos, mas quando a liberdade permitia o descontrolo populacional, a reprodução dos coelhinhos era um modelo inevitável para prever o que se seguiria - um esgotar de recursos, conflitos crescentes caóticos levando ao colapso social.
Por isso, a nova "Paz-côa", a "paz filtrada", trazia um ovo diferente do de Colombo[*], trazia um acordo de paz que visaria um controlo populacional... o "crescei e multiplicai-vos" tinha o limite Malthusiano, o limite da estrutura para os recursos disponíveis. 
[*] Sobre a tradição dos ovos da Páscoa, 

Não é preciso ler Robinson Crusoe, para ver que os paraísos tropicais traziam vários problemas, onde foram aplicadas diversas soluções ao longo de gerações... normalmente condicionando a mentalidade pela educação, pelos rituais, pela cultura, pelas histórias. Não se trataria apenas de um problema de sobrevivência, seguir-se-ia um problema de vivência... ou seja, que objectivos de vida manteriam um funcionamento regular da sociedade?  Sob esse aspecto, a manutenção dos inimigos tribais, como na Nova Guiné, reteria um foco de atenção para a vivência... parece ter sido essa a solução encontrada, durante inúmeras gerações.
No Taiti, ilha cuja descoberta deve remontar a Pedro Fernandes Queirós[**], ocorreu a famosa história da revolta da Bounty. Alguns marinheiros amotinaram-se, querendo viver em tal paraíso, ofereceram armas para o desequilíbrio de forças, em favor de um rei, Pomare I, que assegurou o controlo total da ilha entre 1788 e 1791. O capitão Bligh retornou, e perante a ameaça externa o rei entregou os amotinados que lhe tinham fornecido o poder. O Taiti entraria em contacto com os ocidentais como reino unificado, mas em 1842 os franceses usariam as famílias dos rivais depostos para impor um protectorado francês contra a rainha Pomare IV, e ainda hoje o Taiti faz parte da França (... o país modelo da liberdade dos povos, que nunca abdicou das suas colónias, sem deixar de acusar os outros de colonialismo).
Sim, é verdade que falta a folha com as páginas 110 e 111, mas o 
borrão consegue fazer ler o nome de Pedro Fernandes Queirós
(... foi pior a emenda que o soneto!)

Ainda sobre o Taiti, o mesmo livro "O Viajante Universal" refere a particularidade de na viagem de Wallis ter sido reportado haver habitantes "ruivos", e Bougainville, chegando no ano seguinte, refere o uso de conchas como castanholas, e de pérolas como o único meio de moeda de troca. 
O Taiti afinal tanto tempo incógnito é abordado por Wallis, Bougainville e Cook em 1767, 1768 e 1769.
Os espanhóis cruzariam o Pacífico durante 250 anos, e afinal parecia difícil era não passar pelo Taiti.
A viagem de Cook tem um propósito científico - o trânsito de Vénus em Junho de 1769.
O mítico nascimento de Vénus, como pérola saída de uma concha
... parece "maluquice" uma mulher sair de uma concha, mas isso depende do tamanho da concha:
Segundo o National Geographic as conchas da 
zona do Recife Australiano podem atingir... 1m 20cm.
Com essa dimensão, poderiam bem albergar uma criança!

Portanto, afinal a ideia de uma criança poder sair de uma concha, faz sentido na zona das Ilhas Malucas, nos Mares Austrais... e as pérolas, as pérolas saem de "Ostras", ou será preciso "ostracizar" para dizer que saem de "Austras"?
Quanto às pérolas taitianas podem ser "pérolas negras", e como dissémos, serviam de moeda. 
Desde os primeiros registos civilizacionais que foi dada grande importância às pérolas, antes mesmo de pedras preciosas, porque saíam naturalmente brilhantes da "ostra". 
Sumérios, chineses, egípcios, japoneses, gregos, romanos, etc... todos tinham os seus pescadores de pérolas... os hindus afirmariam que teria sido Krishna a criar a primeira. Diferentes culturas, algumas que pouco teriam de marítimas, teriam os seus mergulhadores especializados em suster respiração e encontrar pérolas nas ostras. A maior pérola é disforme e ostenta o nome de Lao Tzé. Cleópatra dissolveu uma pérola para mostrar a Marco António que poderia ter uma refeição mais cara que o orçamento de uma cidade, e outras pérolas como "La Peregrina" têm histórias de 500 anos.

Se há local que tipicamente se prestava a uma população marítima vocacionada para apanhar as primeiras pérolas terá sido a Oceania. Bom, e agora vamos regressar ao mapa do logotipo:
O que tem de especial, de novo, este mapa?
Não é o que tem... é o que falta.
O último registo marcado a Oriente... é a Nova Guiné!
Os mapas começam a ser modificados, e são sucessivamente inventados contornos alternativos...
A Nova Guiné vai ficar incompleta, a Austrália não vai aparecer, o mundo fica suspenso até Cook.
Timidamente serão marcadas as Ilhas Salomão (o nome parece simbólico), ao lado da Nova Guiné, e os holandeses vão arriscar entrar pela Austrália até ao limite definido pelo meridiano português de Tordesilhas (convém reparar que os holandeses se especializaram mais no hemisfério português).

A pérola com o nome "La Peregrina" leva-nos à continuação!
Qual era a rota de peregrinação típica durante quase toda a Idade Média?
Havia a cruzada a Jerusalém, a via Francigena, que levava a Roma... mas curiosamente a peregrinação mais importante, era a de Santiago de Compostela:
Caminhos europeus de Santiago de Compostela
"Estrada de Santiago"... a Via Láctea 
A vieira indicando o Caminho de Santiago.

O que fazia tantos peregrinos europeus seguirem a rota do Apóstolo Santo Iago?
É claro que havia todo o factor religioso, mas nem sequer podemos considerar que se tratasse de uma figura crucial no cristianismo, e mesmo a lenda envolvendo a sua presença na Galiza seria muito controversa.
Acresce que a Estrada de Santiago nem acabaria ali... muitos seguiam o caminho até Finisterra!
Finisterra, onde seria o ponto mais ocidental (por erro, já que era o Cabo Magno), e constando que as rotas eram mais ancestrais, remetem-nos para uma tradição celta, associada a quê?
- À Vieira... que se diz também "venera", ou seja, a uma Vénus, saída da concha!

É claro que a vieira foi tida como símbolo do peregrino pela sua eventual utilidade para beber água, tal como a cabaça... mas sobre a cabaça evitarei falar. Apenas direi que se a concha tinha este lado feminino, a cabaça, um dos primeiros alvos de agricultura, poderia encerrar um aspecto masculino... que se resume no contexto da Oceania à palavra koteka, porque as coisas são como são, e o resto são preconceitos induzidos pelos xamãs da nossa cultura. É assumido que os cultos de fertilidade foram primevos.
Bom, e se as taitianas usavam conchas, a migração cigana da Índia até à Andaluzia popularizou as castanholas
... que têm origem reportada aos fenícios, afinal a civilização que se baseou num domínio marítimo, desde o Mediterrâneo até ao Atlântico. Seriam os fenícios a definir o alfabeto que dominaria o mundo das línguas indo-europeias, e não só.

Compostela poderia aparecer no contexto de peregrinação marítima como uma rota que terminava num grande lago proibido à navegação, seria um "santo lago" que se ligava a "Santo Iago", tal como alguns cultos de Santo Antão estão claramente ligados às Antas. Curiosamente a outra Santiago, do Chile, foi repousar à beira de um lago ainda maior, o oceano Pacífico. Com o decorrer das descobertas, o caminho estava aberto para o lago atlântico, e a contra-reforma terminou a harmonia católica - o caminho de Santiago deixou de ser popular durante os quase cinco séculos seguintes, tendo apenas sido reavivado recentemente.

Objectivamente, o que se pode reter daqui?
Muito pouco, grande parte do texto pode ser considerado especulativo e arbitrário nas associações.
Afinal, se Vénus é Venera, daí tanto vem a palavra "venerar" como a palavra "venérea". 
Se um Puto é um pequeno anjo, associável a Cupido, para fazermos o feminino associado à mãe Vénus, devemos recorrer ao filme japonês LaPuta: Castle in the Sky, em que o nome Laputa se refere a uma cidade nos céus, na obra Gulliver de Jonathan Swift.
Os xamãs guardaram os métodos e as conchinhas, os cravos e as pimentas, e no seu percurso peregrino fizeram as naves subir aos céus, até que reencontraram o simbolismo perdido. Superada a prova, passaram a magos que bebem chá... os problemas são os mesmos, e os métodos pouco diferentes.

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publicado às 06:48

Um dos relatos mais surpreendentes que li está na 
Historia Brittonum (c. 830 d.C), 
escrita por Nennius, monge galês. Dificilmente se encontram relatos mais próximos do período conturbado que sucedeu à queda do Império Romano do Ocidente (exceptuando Gildas que não é tão informativo).

Turrim vitream in medio mari
No entanto, talvez o que mais surpreende é uma descrição das primeiras tentativas de colonização da Irlanda, que mais uma vez é atribuída a migrações da Hispânia. Eis a parte mais estranha:
After these came three sons of a Spanish soldier with thirty ships, each of which contained thirty wives; and having remained there during the space of a year, there appeared to them, in the middle of the sea, a tower of glass, the summit of which seemed covered with men, to whom they often spoke, but received no answer. At length they determined to besiege the tower; and after a year's preparation, advanced towards it, with the whole number of their ships, and all the women, one ship only excepted, which had been wrecked, and in which were thirty men, and as many women; but when all had disembarked on the shore which surrounded the tower, the sea opened and swallowed them up. Ireland, however, was peopled, to the present period, from the family remaining in the vessel which was wrecked. Afterwards, others came from Spain, and possessed themselves of various parts of Britain.
A menos de efeito alucinogénico de cogumelos, a informação passada como histórica por Nennius descreve algo muito bizarro. Tratava-se de uma "Torre Vítrea" no meio do mar (turrim vitream in medio mare), e no topo haveria homens, que não respondiam aos hispânicos, que tinham chegado à Irlanda em 30 navios.
Depois de procurar mais informação sobre o assunto, verifiquei haver uma interpretação quase tão bizarra quanto a descrição - tratar-se-ia de um iceberg com focas em cima... pelo nível de apuramento da explicação, pode ser coisa oficial.
Tudo bem, vamos admitir que os hispânicos eram ignorantes, nunca tinham visto um iceberg, chamavam-lhe torre vítrea, e achavam que as focas eram parecidas com humanos. Acontece que Nennius diz que demoraram um ano a preparar o ataque... ou seja, o iceberg ficou ali estacionado durante um ano com as focas em cima. Pior, uma vez sitiado o iceberg, desembarcando todos na sua periferia, e cercadas as focas, o conjunto foi todo submergido, desaparecendo tudo.
Antes de ler a versão explicativa com o iceberg e as focas, interpretei abusivamente, e considerei poder tratar-se de um submergível, com uma torre vítrea de comando e observação, que incomodaria os novos colonos, a ponto de eles considerarem a sua abordagem... e quando o fizeram, submergiu!
Porém, como somos ensinados que nenhum desses aparelhos seria possível naquela época, só a versão das focas ao comando do iceberg estacionário é que deve fazer sentido...

A travessia de 40 anos
Este episódio é o terceiro contado por Nennius. Ao que parece os hispânicos insistiam na colonização da Irlanda, que seria meio inóspita para quem está habituado a climas mais temperados, mas a coisa afigurava-se complicada. Da primeira vez tinham saído da Hispânia mil (escotos) sob o comando de Partholomus, e sendo quatro mil ao fim de alguns anos, todos teriam morrido no espaço de uma semana (pode ter sido dos cogumelos)! Da segunda vez teria sido um tal de Nimech, mas teria regressado ao fim de poucos anos com todos os que o tinham seguido. Desta terceira vez, como vimos, foi o problema das focas... mas terá havido sobreviventes, e com a chegada de nova gente da Hispânia, a colonização acabou por se verificar.

Geoffrey of Monmouth na Historia Regum Britanniae (livro III, cap.XII) conta uma versão posterior mais resumida da colonização. Segundo ele, o mesmo Partholoim (pequena variação no nome face a Nennius), com uma frota de 30 navios (o número da 3ª expedição de Nennius), abordara o rei bretão Barbtruc no sentido de lhe dar asilo, pela sua expulsão da Hispânia. Segundo Monmouth, tratavam-se de "Barclenses" - nome demasiado próximo de "Barcelenses" (aludimos a uma possível origem da região de Barcelos, Barcelona, ou ainda Basca - ver a hipótese "Basclense"). Na sua versão, o rei bretão teria cedido, encaminhando-os para a Irlanda, que se encontrava desabitada, e à data de Geoffrey ainda aí viveriam os seus descendentes.

Num ponto está em acordo com Nennius, que também afirma que a Irlanda estava desabitada à chegada dos escotos. Aliás afirma que a Irlanda seria desabitada até à época da travessia do Mar Vermelho pelos Israelitas.
Surge aqui um novo ponto interessante.
Entre os escotos haveria um nobre de origem cita, com grande família, que tinha sido banido, e que tinha tido um percurso notável. Neste ponto a versão de Nennius coincide parcialmente, numa nobreza cita, com a da Declaração de Arbroath mencionada aqui.
O percurso notável desse nobre cita tem semelhanças com o de Moisés...
Após a sua expulsão da Cítia, ter-se-ia refugiado no Egipto, e dado o desaparecimento da nobreza egípcia no Mar Vermelho, os egípcios consideraram que ele poderia tentar apoderar-se do poder, e expulsaram-no de novo. Nennius refere então:
Thus reduced, he wandered forty-two years in Africa, and arrived with his family at the altars of the Philistines, by the Lake of Osiers. Then passing between Rusicada and the hilly country of Syria, they travelled by the river Malva through Mauritania as far as the Pillars of Hercules; and crossing the Tyrrhene Sea, landed in Spain, where they continued many years, having greatly increased and multiplied Thence, a thousand and two years after the Egyptians were lost in the Red Sea, they passed into Ireland, and the district of Dalrieta. 
ou seja, deambulou 42 anos em África, provavelmente no deserto saariano.
O percurso indicado por Nennius mostra a confusão de nomenclatura. O país montanhoso da Síria, seria provavelmente a Tunísia, e o nome "Síria" estaria muito provavelmente ligado à origem fenícia de Cartago. O rio Malva existe - trata-se do actual rio Moulouya, conforme pode ser verificado aqui, já na zona de Marrocos.

Chegam assim aos Pilares de Hércules, estreito de Gibraltar, e vão passar o "Mar Tirreno" para chegar à Hispânia... Percebe-se imediatamente que o nome Mar Tirreno nada tinha a ver com a limitação dada actualmente (que o circunscreve hoje à área entre a Itália, Sardenha e Sicíla). Tratava-se muito provavelmente de todo o Mar Mediterrâneo, ou pelo menos da parte vizinha ao Estreito de Gibraltar.

continuado a 20/12/2012
Aliás, o nome Tirreno pode sugerir outra origem - da colónia fenícia Tiro (ver).
Como é habitual nestas coisas, podemos estar em presença de uma junção de histórias - por um lado a passagem do Mar Vermelho, por outro lado a deambulação de 40 anos no deserto.
Já falámos do Mar VermelhoEbreus do Ebro, e Nennius referindo-se aos filhos de Jafé (Japheth), netos de Noé, diz:
from the fifth, Tubal, arose the Hebrei, Hispani, and Itali.
[quintus Tubal, a quo Hebraei et Hispani et Itali]

Portanto, inclui no conjunto dos filhos de Tubal três populações distintas: Hebreus, Hispânicos e Itálicos (não necessariamente latinos, talvez etruscos). Estabelece-se mais uma ligação explícita entre Hebreus e Hispânia, para além das várias implícitas que já fomos comentando aqui noutros textos.

É claro que todas estas relações são confusas, as informações são (propositadamente?) contraditórias, e é difícil seguir com alguma certeza, apenas vamos estabelecendo algumas relações, que podem formar um corpo mais consistente. Assim, Nennius acaba por falar numa origem britânica que remontaria ao consul romano Brutus, de onde derivaria o nome Britania. Se por um lado seria o mesmo Brutus que passaria o Lima, num tempo demasiado recente, por outro lado esse tempo é anterior, vai até à Guerra de Tróia. Tal como os romanos, também os britânicos procuram uma descedência por algum Eneias troiano.

O texto de Nennius é especialmente conhecido por referir o Rei Artur, sendo talvez o primeiro fazê-lo. Ilustra a tentativa dos britânicos susterem a invasão dos Saxões, frisando em particular o convite ao seu estabelecimento feito pelo Rei Vortigern. Não indo ao aspecto fabuloso de Monmouth, Nennius reporta 12 batalhas vitoriosas de Artur, em particular a de Mount Baden, onde poderá ter exagerado no número de opositores eliminados só por Artur - 960, num só dia.

Traduções, transcrições, e Filisteus
Adiciono um pequeno detalhe instrutivo... no link inicial, que segui, na tradução da Fordham University de Nova York, aparece:
"The twelfth was a most severe contest, when Arthur penetrated to the hill of Badon. In this engagement, nine hundred and forty fell by his hand alone, no one but the Lord affording him assistance. In all these engagements the Britons were successful. For no strength can avail against the will of the Almighty."
Por outro lado, seguindo a versão transcrita em latim aqui lemos apenas:
"Duodecimum fuit bellum in monte Badonis, in quo corruerunt in uno die nongenti sexaginta viri de uno impetu Arthur; et nemo prostravit eos nisi ipse solus, et in omnibus bellis victor exstitit."

Ou seja, a menos que o tradutor tivesse outra versão, há um claro colorido e uma decoração que não está presente na transcrição do latim. Até o número é diferente num caso diz-se 940, noutro 960.
No entanto, estes detalhes não são assim tão importantes. Pode haver alterações, imprecisões, mas o que importa sempre é a visão de conjunto. De qualquer forma, há detalhes que alteram as coisas, e assim retomando o texto anterior, relativo ao mapa, agora em latim lemos:
at ille per quadraginta et duos annos ambulavit per Africam, et venerunt ad aras Filistinorum per lacum Salinarum et venerunt inter Rusicadam et montes Azariae et venerunt per flumen Malvam et transierunt per Maritaniam ad columnas Herculis et navigaverunt Tyrrenum mare et pervenerunt ad Hispaniam usque et ibi habitaverunt per multos annos et creverunt et multiplicati sunt nimis et gens illorum multiplicata est nimis. 
Portanto, temos o Lago Salinarum (em vez de Osiers), e Montes Azariae (em vez de "hilly country of Syria").  Isto muda um pouco as coisas. Já falámos do Lago Tritonis, e à época de Nennius já deveria estar a transformar-se numa enorme superfície salgada, que é hoje o Chott el-Jerid, de onde o nome "Salinarum". Depois dessa região tunisina, há já na Argélia uma cidade, junto à cadeia montanhosa do Atlas que ainda se chama Azaria. Rusicada era também uma cidade romana na zona argelina (foi identificada a Skikda, cidade costeira), e estes locais estão no mapa anterior.
Os Altares dos Filisteus nesta zona (Tunísia/Argélia-Atlas) é ainda mais relevante. Os filisteus deveriam estar na zona de Gaza, junto a Israel... onde desenvolveram lutas com os Hebreus. Porém, se atendermos a que acabámos de realçar a  conexão dos Hebreus com a Hispânia, podemos perceber que o ponto de conflito com os filisteus poderia ocorrer noutro lado - no Norte de África.

Maximus, Ambrósio, Ida e Conan
A Historia Brittonum de Nennius parece ser encarada como meio fantasiosa, e no entanto, não deixam de ali estar alguns acontecimentos que poderiam passar por falsos e não eram, como os referentes a Maximus (de quem falámos no texto anterior), já que a memória desse imperador tinha sido eliminada por decreto romano.
Nennius, como todos os restantes, terá seguido variada documentação. Poderá é ter seguido alguma que não devia... mas na maioria dos "historiadores" da Antiguidade há esse problema, falam de coisas que são hoje desacreditadas. Escolhe-se assim uma parte do que é dito,  que cola com a versão oficial, e o resto é negligenciado. Não sei se há algum historiador antigo que seja considerado fiável, do princípio ao fim, e se há, é porque se tem apenas uma parte histórica muito limitada e particular (o caso de alguns romanos). Ora, não haver nenhum historiador geral da Antiguidade, fiável, do princípio ao fim, é no mínimo um sintoma do problema subjacente há muito tempo.

Tem-se associado a figura do romano Ambrosius Aurelianus à lenda do Rei Artur (e.g. este filme), mas Nennius, como outros, refere-se a Ambrósio de forma distinta de Artur. O ponto comum seria a resistência ao invasor.
Nennius fala depois de Ida, Rei da Bernicia, reino anglo-saxão. Curiosamente esse nome será também o de (Santa) Ida, mãe dos reis de Jerusalém, e mulher do conde do Bulhão, de que já falámos, e que era Eustácio II, um comandante na invasão normanda em Hastings (1066).

Finalmente, regressando à Torre Vítrea, regressamos a Conan... temos numa edição de 1838 da Historia Brittonum, publicada pela English Historical Society, a seguinte observação:

Turrim vitream: Concerning the tower of glass and its frequent occurrence in the early Welsh legends, see Roberts’s Cambr. Antiq. pp. 75, 78, and Davies’s Mythology of the British Druids, p. 212. O’Connor states that this tower was built by a certain Conan upon the island called Tor-Inis, or Tory Island, and refers to a poem written long before A.D. 908, in proof of the antiquity of the tradition, Prolog. I. xxxvi

Ou seja, que a "Torre Vitrea" seria uma antiga lenda galesa, associada a uma torre na ilha de Tory (ver aqui também), construída por um certo Conan...

Ilha de Tory, onde estaria a Torre Vítrea de Conan (em panoramio)

No segundo filme de Conan (Destroyer), encontra-se justamente um episódio no "castelo de gelo do mago Toth-Amon" (ver), reportando talvez essa associação lendária a Conan e por outro lado à migração do cita via Egipto.

Esta descrição da Torre Vítrea pode ser considerada como alegórica, fantasiosa, associada a outras lendas medievais. Por exemplo, Geoffrey Monmouth (livro III, cap. XV) descreve o episódio do tirano Morvidus que teria sido devorado por um "monstro" na costa da Irlanda.
No entanto, a Torre Vítrea dificilmente pode ser enquadrada no tipo de mitos medievais comuns, não há propriamente nenhuma conotação heróica ou religiosa. Há apenas um episódio que é descrito com algum detalhe, sem qualificativos, explicações ou implicações. Se fosse algo que abalasse menos os preconceitos, seria mais facilmente aceite, assim permanece como desafio às explicações mais racionais.
22/12/2012

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publicado às 05:29

Um dos relatos mais surpreendentes que li está na 
Historia Brittonum (c. 830 d.C), 
escrita por Nennius, monge galês. Dificilmente se encontram relatos mais próximos do período conturbado que sucedeu à queda do Império Romano do Ocidente (exceptuando Gildas que não é tão informativo).

Turrim vitream in medio mari
No entanto, talvez o que mais surpreende é uma descrição das primeiras tentativas de colonização da Irlanda, que mais uma vez é atribuída a migrações da Hispânia. Eis a parte mais estranha:
After these came three sons of a Spanish soldier with thirty ships, each of which contained thirty wives; and having remained there during the space of a year, there appeared to them, in the middle of the sea, a tower of glass, the summit of which seemed covered with men, to whom they often spoke, but received no answer. At length they determined to besiege the tower; and after a year's preparation, advanced towards it, with the whole number of their ships, and all the women, one ship only excepted, which had been wrecked, and in which were thirty men, and as many women; but when all had disembarked on the shore which surrounded the tower, the sea opened and swallowed them up. Ireland, however, was peopled, to the present period, from the family remaining in the vessel which was wrecked. Afterwards, others came from Spain, and possessed themselves of various parts of Britain.
A menos de efeito alucinogénico de cogumelos, a informação passada como histórica por Nennius descreve algo muito bizarro. Tratava-se de uma "Torre Vítrea" no meio do mar (turrim vitream in medio mare), e no topo haveria homens, que não respondiam aos hispânicos, que tinham chegado à Irlanda em 30 navios.
Depois de procurar mais informação sobre o assunto, verifiquei haver uma interpretação quase tão bizarra quanto a descrição - tratar-se-ia de um iceberg com focas em cima... pelo nível de apuramento da explicação, pode ser coisa oficial.
Tudo bem, vamos admitir que os hispânicos eram ignorantes, nunca tinham visto um iceberg, chamavam-lhe torre vítrea, e achavam que as focas eram parecidas com humanos. Acontece que Nennius diz que demoraram um ano a preparar o ataque... ou seja, o iceberg ficou ali estacionado durante um ano com as focas em cima. Pior, uma vez sitiado o iceberg, desembarcando todos na sua periferia, e cercadas as focas, o conjunto foi todo submergido, desaparecendo tudo.
Antes de ler a versão explicativa com o iceberg e as focas, interpretei abusivamente, e considerei poder tratar-se de um submergível, com uma torre vítrea de comando e observação, que incomodaria os novos colonos, a ponto de eles considerarem a sua abordagem... e quando o fizeram, submergiu!
Porém, como somos ensinados que nenhum desses aparelhos seria possível naquela época, só a versão das focas ao comando do iceberg estacionário é que deve fazer sentido...

A travessia de 40 anos
Este episódio é o terceiro contado por Nennius. Ao que parece os hispânicos insistiam na colonização da Irlanda, que seria meio inóspita para quem está habituado a climas mais temperados, mas a coisa afigurava-se complicada. Da primeira vez tinham saído da Hispânia mil (escotos) sob o comando de Partholomus, e sendo quatro mil ao fim de alguns anos, todos teriam morrido no espaço de uma semana (pode ter sido dos cogumelos)! Da segunda vez teria sido um tal de Nimech, mas teria regressado ao fim de poucos anos com todos os que o tinham seguido. Desta terceira vez, como vimos, foi o problema das focas... mas terá havido sobreviventes, e com a chegada de nova gente da Hispânia, a colonização acabou por se verificar.

Geoffrey of Monmouth na Historia Regum Britanniae (livro III, cap.XII) conta uma versão posterior mais resumida da colonização. Segundo ele, o mesmo Partholoim (pequena variação no nome face a Nennius), com uma frota de 30 navios (o número da 3ª expedição de Nennius), abordara o rei bretão Barbtruc no sentido de lhe dar asilo, pela sua expulsão da Hispânia. Segundo Monmouth, tratavam-se de "Barclenses" - nome demasiado próximo de "Barcelenses" (aludimos a uma possível origem da região de Barcelos, Barcelona, ou ainda Basca - ver a hipótese "Basclense"). Na sua versão, o rei bretão teria cedido, encaminhando-os para a Irlanda, que se encontrava desabitada, e à data de Geoffrey ainda aí viveriam os seus descendentes.

Num ponto está em acordo com Nennius, que também afirma que a Irlanda estava desabitada à chegada dos escotos. Aliás afirma que a Irlanda seria desabitada até à época da travessia do Mar Vermelho pelos Israelitas.
Surge aqui um novo ponto interessante.
Entre os escotos haveria um nobre de origem cita, com grande família, que tinha sido banido, e que tinha tido um percurso notável. Neste ponto a versão de Nennius coincide parcialmente, numa nobreza cita, com a da Declaração de Arbroath mencionada aqui.
O percurso notável desse nobre cita tem semelhanças com o de Moisés...
Após a sua expulsão da Cítia, ter-se-ia refugiado no Egipto, e dado o desaparecimento da nobreza egípcia no Mar Vermelho, os egípcios consideraram que ele poderia tentar apoderar-se do poder, e expulsaram-no de novo. Nennius refere então:
Thus reduced, he wandered forty-two years in Africa, and arrived with his family at the altars of the Philistines, by the Lake of Osiers. Then passing between Rusicada and the hilly country of Syria, they travelled by the river Malva through Mauritania as far as the Pillars of Hercules; and crossing the Tyrrhene Sea, landed in Spain, where they continued many years, having greatly increased and multiplied Thence, a thousand and two years after the Egyptians were lost in the Red Sea, they passed into Ireland, and the district of Dalrieta. 
ou seja, deambulou 42 anos em África, provavelmente no deserto saariano.
O percurso indicado por Nennius mostra a confusão de nomenclatura. O país montanhoso da Síria, seria provavelmente a Tunísia, e o nome "Síria" estaria muito provavelmente ligado à origem fenícia de Cartago. O rio Malva existe - trata-se do actual rio Moulouya, conforme pode ser verificado aqui, já na zona de Marrocos.

Chegam assim aos Pilares de Hércules, estreito de Gibraltar, e vão passar o "Mar Tirreno" para chegar à Hispânia... Percebe-se imediatamente que o nome Mar Tirreno nada tinha a ver com a limitação dada actualmente (que o circunscreve hoje à área entre a Itália, Sardenha e Sicíla). Tratava-se muito provavelmente de todo o Mar Mediterrâneo, ou pelo menos da parte vizinha ao Estreito de Gibraltar.

continuado a 20/12/2012
Aliás, o nome Tirreno pode sugerir outra origem - da colónia fenícia Tiro (ver).
Como é habitual nestas coisas, podemos estar em presença de uma junção de histórias - por um lado a passagem do Mar Vermelho, por outro lado a deambulação de 40 anos no deserto.
Já falámos do Mar VermelhoEbreus do Ebro, e Nennius referindo-se aos filhos de Jafé (Japheth), netos de Noé, diz:
from the fifth, Tubal, arose the Hebrei, Hispani, and Itali.
[quintus Tubal, a quo Hebraei et Hispani et Itali]

Portanto, inclui no conjunto dos filhos de Tubal três populações distintas: Hebreus, Hispânicos e Itálicos (não necessariamente latinos, talvez etruscos). Estabelece-se mais uma ligação explícita entre Hebreus e Hispânia, para além das várias implícitas que já fomos comentando aqui noutros textos.

É claro que todas estas relações são confusas, as informações são (propositadamente?) contraditórias, e é difícil seguir com alguma certeza, apenas vamos estabelecendo algumas relações, que podem formar um corpo mais consistente. Assim, Nennius acaba por falar numa origem britânica que remontaria ao consul romano Brutus, de onde derivaria o nome Britania. Se por um lado seria o mesmo Brutus que passaria o Lima, num tempo demasiado recente, por outro lado esse tempo é anterior, vai até à Guerra de Tróia. Tal como os romanos, também os britânicos procuram uma descedência por algum Eneias troiano.

O texto de Nennius é especialmente conhecido por referir o Rei Artur, sendo talvez o primeiro fazê-lo. Ilustra a tentativa dos britânicos susterem a invasão dos Saxões, frisando em particular o convite ao seu estabelecimento feito pelo Rei Vortigern. Não indo ao aspecto fabuloso de Monmouth, Nennius reporta 12 batalhas vitoriosas de Artur, em particular a de Mount Baden, onde poderá ter exagerado no número de opositores eliminados só por Artur - 960, num só dia.

Traduções, transcrições, e Filisteus
Adiciono um pequeno detalhe instrutivo... no link inicial, que segui, na tradução da Fordham University de Nova York, aparece:
"The twelfth was a most severe contest, when Arthur penetrated to the hill of Badon. In this engagement, nine hundred and forty fell by his hand alone, no one but the Lord affording him assistance. In all these engagements the Britons were successful. For no strength can avail against the will of the Almighty."
Por outro lado, seguindo a versão transcrita em latim aqui lemos apenas:
"Duodecimum fuit bellum in monte Badonis, in quo corruerunt in uno die nongenti sexaginta viri de uno impetu Arthur; et nemo prostravit eos nisi ipse solus, et in omnibus bellis victor exstitit."

Ou seja, a menos que o tradutor tivesse outra versão, há um claro colorido e uma decoração que não está presente na transcrição do latim. Até o número é diferente num caso diz-se 940, noutro 960.
No entanto, estes detalhes não são assim tão importantes. Pode haver alterações, imprecisões, mas o que importa sempre é a visão de conjunto. De qualquer forma, há detalhes que alteram as coisas, e assim retomando o texto anterior, relativo ao mapa, agora em latim lemos:
at ille per quadraginta et duos annos ambulavit per Africam, et venerunt ad aras Filistinorum per lacum Salinarum et venerunt inter Rusicadam et montes Azariae et venerunt per flumen Malvam et transierunt per Maritaniam ad columnas Herculis et navigaverunt Tyrrenum mare et pervenerunt ad Hispaniam usque et ibi habitaverunt per multos annos et creverunt et multiplicati sunt nimis et gens illorum multiplicata est nimis. 
Portanto, temos o Lago Salinarum (em vez de Osiers), e Montes Azariae (em vez de "hilly country of Syria").  Isto muda um pouco as coisas. Já falámos do Lago Tritonis, e à época de Nennius já deveria estar a transformar-se numa enorme superfície salgada, que é hoje o Chott el-Jerid, de onde o nome "Salinarum". Depois dessa região tunisina, há já na Argélia uma cidade, junto à cadeia montanhosa do Atlas que ainda se chama Azaria. Rusicada era também uma cidade romana na zona argelina (foi identificada a Skikda, cidade costeira), e estes locais estão no mapa anterior.
Os Altares dos Filisteus nesta zona (Tunísia/Argélia-Atlas) é ainda mais relevante. Os filisteus deveriam estar na zona de Gaza, junto a Israel... onde desenvolveram lutas com os Hebreus. Porém, se atendermos a que acabámos de realçar a  conexão dos Hebreus com a Hispânia, podemos perceber que o ponto de conflito com os filisteus poderia ocorrer noutro lado - no Norte de África.

Maximus, Ambrósio, Ida e Conan
A Historia Brittonum de Nennius parece ser encarada como meio fantasiosa, e no entanto, não deixam de ali estar alguns acontecimentos que poderiam passar por falsos e não eram, como os referentes a Maximus (de quem falámos no texto anterior), já que a memória desse imperador tinha sido eliminada por decreto romano.
Nennius, como todos os restantes, terá seguido variada documentação. Poderá é ter seguido alguma que não devia... mas na maioria dos "historiadores" da Antiguidade há esse problema, falam de coisas que são hoje desacreditadas. Escolhe-se assim uma parte do que é dito,  que cola com a versão oficial, e o resto é negligenciado. Não sei se há algum historiador antigo que seja considerado fiável, do princípio ao fim, e se há, é porque se tem apenas uma parte histórica muito limitada e particular (o caso de alguns romanos). Ora, não haver nenhum historiador geral da Antiguidade, fiável, do princípio ao fim, é no mínimo um sintoma do problema subjacente há muito tempo.

Tem-se associado a figura do romano Ambrosius Aurelianus à lenda do Rei Artur (e.g. este filme), mas Nennius, como outros, refere-se a Ambrósio de forma distinta de Artur. O ponto comum seria a resistência ao invasor.
Nennius fala depois de Ida, Rei da Bernicia, reino anglo-saxão. Curiosamente esse nome será também o de (Santa) Ida, mãe dos reis de Jerusalém, e mulher do conde do Bulhão, de que já falámos, e que era Eustácio II, um comandante na invasão normanda em Hastings (1066).

Finalmente, regressando à Torre Vítrea, regressamos a Conan... temos numa edição de 1838 da Historia Brittonum, publicada pela English Historical Society, a seguinte observação:

Turrim vitream: Concerning the tower of glass and its frequent occurrence in the early Welsh legends, see Roberts’s Cambr. Antiq. pp. 75, 78, and Davies’s Mythology of the British Druids, p. 212. O’Connor states that this tower was built by a certain Conan upon the island called Tor-Inis, or Tory Island, and refers to a poem written long before A.D. 908, in proof of the antiquity of the tradition, Prolog. I. xxxvi

Ou seja, que a "Torre Vitrea" seria uma antiga lenda galesa, associada a uma torre na ilha de Tory (ver aqui também), construída por um certo Conan...

Ilha de Tory, onde estaria a Torre Vítrea de Conan (em panoramio)

No segundo filme de Conan (Destroyer), encontra-se justamente um episódio no "castelo de gelo do mago Toth-Amon" (ver), reportando talvez essa associação lendária a Conan e por outro lado à migração do cita via Egipto.

Esta descrição da Torre Vítrea pode ser considerada como alegórica, fantasiosa, associada a outras lendas medievais. Por exemplo, Geoffrey Monmouth (livro III, cap. XV) descreve o episódio do tirano Morvidus que teria sido devorado por um "monstro" na costa da Irlanda.
No entanto, a Torre Vítrea dificilmente pode ser enquadrada no tipo de mitos medievais comuns, não há propriamente nenhuma conotação heróica ou religiosa. Há apenas um episódio que é descrito com algum detalhe, sem qualificativos, explicações ou implicações. Se fosse algo que abalasse menos os preconceitos, seria mais facilmente aceite, assim permanece como desafio às explicações mais racionais.
22/12/2012

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