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Nave espiritual

20.10.13
É suposto a palavra "nave" derivar de "navis" do latim, que por sua vez sairia de um "naos" grego.
Em todos os casos tratam-se de embarcações para... navegar.
Se "navio" pode advir do latim e "nau" do grego, é de notar que a letra "v" apresentou duplicidades, não apenas na troca dos "b" pelos "v", mas também na troca de "v" por "u"... ou seja, o "navis" latino poderia pronunciar-se "nauis", da mesma forma que "Julius" seria escrito "IVLIVS". 
Esta duplicidade entre o "u" e o "v" não desapareceu com a invenção do "w" que também manteve a duplicidade de ser lido como "u", pela via inglesa, e como "v", pela via francesa e germânica.

Ao contrário dos ingleses não falamos de "navio espacial", e a designação "nave espacial" parece ser tipicamente das línguas ibéricas, porquanto a palavra "nave" solitariamente teria perdido o significado marítimo e seria mais aplicada na arquitectura de catedrais, falando-se habitualmente da sua "nave central".
 
Naves centrais do Mosteiro de Alcobaça e do Mosteiro da Batalha

A relação da nave marítima com a estrutura das catedrais é bem conhecida. Havia uma grande semelhança invertida entre o fundo dos navios e o tecto das catedrais. Os fiéis seriam assim convidados para uma embarcação que teria a sua quilha penetrante nos céus, tal como a quilha dos navios entraria nas águas... afinal também a parte espiritual sediada na cabeça estaria mais próxima dos céus do que os pés que conduziam o corpo.
É num mundo medieval, onde as navegações marítimas estavam praticamente proibidas que vamos encontrar alusões a outras naves, de carácter espiritual. Ao contrário de anfiteatros, o formato linear, sob o comprido, que passaria a ser característica típica das igrejas, não era o mais adequado para comunicar a uma plateia de fiéis. Envolvia uma direcção - as igrejas estavam normalmente viradas a Nascente, e o próprio sacerdote, virando costas aos fiéis, tomava posição semelhante na embarcação, primeiro na proa em direcção a esse renascimento figurado numa alvorada (após o controverso Concílio do Vaticano II, em 1962, estas tradições caem, diz-se que por influência maçónica na igreja).

Movendo-nos um pouco para outra parte do globo, para as Caves de Ellora, Índia, datadas do Séc. VII, encontramos uma estrutura de topo curiosamente semelhante... em que o tecto poderia bem representar o fundo de um navio:
Nave da Cave... Cave 10 (dita do Buda Carpinteiro)

De acordo com a Revista Panorama (número de 8 Julho 1837), já Diogo Couto dava conta da existência destas Grutas de Ellora, bem como da Ilha de Elefanta (ou Elefante) e da Ilha de Salsete. É interessante que a Ilha de Elefanta tenha feito parte do dote de Catarina de Bragança a Carlos II de Inglaterra, o que simbolicamente mostra já uma cedência do poder aos ingleses sobre a Índia. No entanto, creio que na Ilha de Elefanta, dedicada a Xiva não se apresenta este tipo de estrutura.

As estruturas dedicadas a Xiva envolviam mais construções de Pirâmides, como são os vários templos Tamil, como seja Chidambaram (partes atribuídas ao Séc. XIII):

ou os templos hindús de Annamalayiar (datados do Séc. XV):

ou ainda, do mais recente Templo de Meenakshi (datado do Séc. XVII):

bem como de vários outros (ver lista). Estes templos piramidais têm também uma linha de orientação definida, ao contrário do que acontece com as habituais pirâmides... mas não deixam de exibir características que remetem para conjuntos monumentais egípcios ou mexicanos. É mais difícil perceber aqui se havia algum significado religioso especial, mas a orientação não é constante, e o efeito de nave não estará presente nestes templos. 

Finalmente, sobre as construções com forma do fundo de barco, convém lembrar a menção que já fizemos às mapalias da Numídia, no relato do Rei Hiempsal II. Segundo esse relato, os persas que acompanharam Hércules na expedição que este fez à Hispânia, ficaram a habitar a costa africana, usando os cascos invertidos dos seus navios para fazerem casas. Esta tradição ter-se-ia mantido como forma de construção no Norte de África, no fabrico das mapalias (também chamadas magalias). 
Mapalias da Numídia - inversão dos cascos dos barcos dos companheiros persas de Hércules.


Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 06:04

Nave espiritual

20.10.13
É suposto a palavra "nave" derivar de "navis" do latim, que por sua vez sairia de um "naos" grego.
Em todos os casos tratam-se de embarcações para... navegar.
Se "navio" pode advir do latim e "nau" do grego, é de notar que a letra "v" apresentou duplicidades, não apenas na troca dos "b" pelos "v", mas também na troca de "v" por "u"... ou seja, o "navis" latino poderia pronunciar-se "nauis", da mesma forma que "Julius" seria escrito "IVLIVS". 
Esta duplicidade entre o "u" e o "v" não desapareceu com a invenção do "w" que também manteve a duplicidade de ser lido como "u", pela via inglesa, e como "v", pela via francesa e germânica.

Ao contrário dos ingleses não falamos de "navio espacial", e a designação "nave espacial" parece ser tipicamente das línguas ibéricas, porquanto a palavra "nave" solitariamente teria perdido o significado marítimo e seria mais aplicada na arquitectura de catedrais, falando-se habitualmente da sua "nave central".
 
Naves centrais do Mosteiro de Alcobaça e do Mosteiro da Batalha

A relação da nave marítima com a estrutura das catedrais é bem conhecida. Havia uma grande semelhança invertida entre o fundo dos navios e o tecto das catedrais. Os fiéis seriam assim convidados para uma embarcação que teria a sua quilha penetrante nos céus, tal como a quilha dos navios entraria nas águas... afinal também a parte espiritual sediada na cabeça estaria mais próxima dos céus do que os pés que conduziam o corpo.
É num mundo medieval, onde as navegações marítimas estavam praticamente proibidas que vamos encontrar alusões a outras naves, de carácter espiritual. Ao contrário de anfiteatros, o formato linear, sob o comprido, que passaria a ser característica típica das igrejas, não era o mais adequado para comunicar a uma plateia de fiéis. Envolvia uma direcção - as igrejas estavam normalmente viradas a Nascente, e o próprio sacerdote, virando costas aos fiéis, tomava posição semelhante na embarcação, primeiro na proa em direcção a esse renascimento figurado numa alvorada (após o controverso Concílio do Vaticano II, em 1962, estas tradições caem, diz-se que por influência maçónica na igreja).

Movendo-nos um pouco para outra parte do globo, para as Caves de Ellora, Índia, datadas do Séc. VII, encontramos uma estrutura de topo curiosamente semelhante... em que o tecto poderia bem representar o fundo de um navio:
Nave da Cave... Cave 10 (dita do Buda Carpinteiro)

De acordo com a Revista Panorama (número de 8 Julho 1837), já Diogo Couto dava conta da existência destas Grutas de Ellora, bem como da Ilha de Elefanta (ou Elefante) e da Ilha de Salsete. É interessante que a Ilha de Elefanta tenha feito parte do dote de Catarina de Bragança a Carlos II de Inglaterra, o que simbolicamente mostra já uma cedência do poder aos ingleses sobre a Índia. No entanto, creio que na Ilha de Elefanta, dedicada a Xiva não se apresenta este tipo de estrutura.

As estruturas dedicadas a Xiva envolviam mais construções de Pirâmides, como são os vários templos Tamil, como seja Chidambaram (partes atribuídas ao Séc. XIII):

ou os templos hindús de Annamalayiar (datados do Séc. XV):

ou ainda, do mais recente Templo de Meenakshi (datado do Séc. XVII):

bem como de vários outros (ver lista). Estes templos piramidais têm também uma linha de orientação definida, ao contrário do que acontece com as habituais pirâmides... mas não deixam de exibir características que remetem para conjuntos monumentais egípcios ou mexicanos. É mais difícil perceber aqui se havia algum significado religioso especial, mas a orientação não é constante, e o efeito de nave não estará presente nestes templos. 

Finalmente, sobre as construções com forma do fundo de barco, convém lembrar a menção que já fizemos às mapalias da Numídia, no relato do Rei Hiempsal II. Segundo esse relato, os persas que acompanharam Hércules na expedição que este fez à Hispânia, ficaram a habitar a costa africana, usando os cascos invertidos dos seus navios para fazerem casas. Esta tradição ter-se-ia mantido como forma de construção no Norte de África, no fabrico das mapalias (também chamadas magalias). 
Mapalias da Numídia - inversão dos cascos dos barcos dos companheiros persas de Hércules.


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publicado às 06:04

Com chás (2)

12.07.13
Vieira.
Já aqui tínhamos apresentado uma moeda que tinha o símbolo da empresa de D. Sebastião:

Serena Celsa Favent, era o moto, e se o esclarecimento favorece a excelência, aqui temos uma concha, a vieira venusiana, e um peixe, símbolo cristão, sob uma constelação estelar (Pleiades?) enquadrada com o crescente selene, lunar.
Devemos notar que as conchas estão ligadas ao baptismo, havendo mesmo pias baptismais com essa forma:
 
Pia baptismal - Igreja NªSrª Navegantes (Armação de Pera, imagem).

Portanto, há uma ligação da concha à libertação do "pecado original", da expulsão do Paraíso. 
Bom, e tendo acabado de falar nas ilhas polinésias, do Taiti no texto anterior, de forma algo natural estabelecemos a noção de "ilha paradisíaca"... como se congenitamente o fosse reconhecido naquelas paisagens.


Pelicano.
Para além do peixe, também o pelicano, pelo auto-sacrifício pela prole, é considerado um símbolo de Cristo, tendo sido primeiro adoptado por D. João II como seu símbolo.
Vamos encontrar esse símbolo com um influente conselheiro dos reis ingleses Henrique VII e Henrique VIII, tratava-se de Richard Foxe, bispo de Winchester:

Leito de morte de Henry VII Tudor (1509) com destaque para Richard Fox, Bispo de Winchester, 
vêem-se as quinas portuguesas e o pelicano de D. João II.

O que faria o Bispo de Winchester, o conselheiro mais influente de Henrique VII, e depois de Henrique VIII (até ser substituído por Wolsey), usar armas com quinas e o pelicano, símbolos do já defunto D. João II?
Estava aqui implícito que a política de D. João II teria uma continuação pelo lado inglês?

Richard Foxe vai fundar o Colégio Corpus Christi de Oxford, que ainda hoje usa o símbolo do pelicano:
  
Richard Fox, o pátio central com o Pelicano do Corpus Christi de Oxford, e as armas do colégio,
que incluem ainda as armas de Hugh Oldham (com 3 mochos e rosas vermelhas de Lancaster)

Mais tarde, também Isabel I, filha de Henrique VIII, a rainha que determinará a expansão inglesa, irá adoptar o pelicano como símbolo no seu papel de "mãe" da Igreja Anglicana. A simbologia cristã do pelicano remontará a S. Tomás de Aquino, a sua ligação às quinas portuguesas só fica evidente através de Fox, e da influência que terá tido na regência dos Tudor.

A tomba de Fox está na catedral de Winchester da Santíssima Trindade, que era a mais influente à época, e que curiosamente esteve em perigo de colapso por inundação das fundações, sendo "salva" pelo trabalho contínuo de um escafandrista, William Walker, entre 1906-11, que tem um busto na catedral cuja cripta ainda se encontra imersa em água. 

Catedral de Winchester, o escafandrista Walker, e a cripta inundada (com escultura moderna).

Cordeiros.
Curiosamente, 50 anos antes, outro Bispo de Winchester, Henry Beaufort, ficou famoso por dirigir o processo inquisitório que condenou Joana d'Arc à fogueira. Tratava-se de um meio-irmão de Filipa de Lancastre, sendo um dos muitos filhos de John de Gaunt (com Katherine Swynford, no terceiro casamento que originou a linha Beaufort). 
Henry Beaufort, o inquisidor, e Joana d'Arc... 
um cordeiro entregue à fogueira.

Joana d'Arc tinha sido entregue por Philippe III de Borgonha (casado com Isabel de Portugal, filha de D. João I, sobrinha do inquisidor). Margaret Beaufort, também sobrinha deste Henry, será mãe do rei Henrique VII, que derrota Ricardo III, tornando-se o primeiro dos Tudor. Henrique VII usa a rosa de Lancaster, mas ao casar com uma rosa de York, terminará a Guerra das Rosas com a união.
Um detalhe importante é Henrique VII usar num retrato o colar do Tosão de Ouro, o símbolo da Ordem fundada por Philippe III de Borgonha, aquando do casamento com Isabel de Portugal.
Phillipe III de Bourgogne, fundador da Ordem do Tosão de Ouro (esq.)
Henry VII Tudor, membro da Ordem do Tosão de Ouro (dir.)
Ambos usam o colar da ordem, com o cordeiro sacrificial.

Duque de Kent, chefe da Grande Loja de Londres, com colar da Maçonaria.

Juntei uma imagem de colar da maçonaria porque o compasso, ou o esquadro, descaindo em forma de V invertido, assemelham-se ao cordeiro sacrificial, que vemos nos colares da Ordem do Tosão de Ouro.
Conforme já referi noutros textos, o cordeiro tem vários significados, não apenas ligados à lenda de Jasão e dos Argonautas. É claro que a Ordem surgindo no contexto do casamento da irmã do Infante D. Henrique, carrega um aspecto dos Descobrimentos ligado aos "Argonautas" e ao Velo de Ouro.
Descobrir foi desvelar, tirar véus... na forma Ariana deste carneiro, o Velo seria a pele de Aries, uma pele de Ouro, ou de Oro, forma abreviada de Hórus, o olho vigilante que se pode ligar ao verbo Orar.
Descobrir foi revelar, levantar Velas e não tanto retirá-las. As cara-velas do Infante velaram pelo véus antigos, e a Ordem do Tosão ou "Velo de Ouro", pode ser vista como preservação do "véu de Hórus".
Jasão teve que vencer o Dragão da Cólquida para obter o Velo de Ouro, tal como Hércules teve que vencer o dragão Ládon, que guardava as ocidentais Hespérides, num dos 12 trabalhos (ou 12 Oras...).
Ao mesmo tempo aparecia a Ordem do Dragão, de que fez parte o Infante D. Pedro, e que já ligámos à Dra-cola, ou Cola do Dragão, em que o "Colar" se refere ao pescoço, tal como Coço e Cola se referem à retaguarda, entrelaçada ao pescoço... (sobre o significado antigo de "coço da procissão" ser "atrás da procissão", ler D. Manuel Clemente)

A história do cordeiro tem ainda o aspecto hebraico que remete à Páscoa, ou à paz-côa, quando Abraão é sujeito ao teste de obediência divino, e o seu filho Isaac é substituído pelo cordeiro no sacrifício:
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, miserere nobis... dona nobis pacem
É um bocado complicado falar deste ponto, porque o sacrifício do cordeiro ordeiro envolve aqui um conceito perverso, no outro verso interpretativo. Deus não permitiria o sacrifício do filho eleito, apenas dos cordeiros... e por isso os cordeiros poderiam ser sacrificados, até que Deus se manifestasse em sentido contrário. E quem eram os cordeiros a sacrificar? O sacrifício indiscriminado traria a presença de Deus?
Pois... até que ponto os Árias foram pastores de Aries, cordeiros? Até que ponto os pastores sacrificariam os seus cordeiros para reencontrarem Deus, ou o Messias?
Esta filosofia continha uma aposta tripla 1X2, se Deus não interviesse perante a iniquidade, os pastores beneficiariam do velo de ouro, uma opção hedonista face à ausência divina. De forma oposta, justificariam a sua acção perante o divino, requerendo a sua presença, afinal a sua omnipotência só permitiria o sacrifício dos sacrificáveis. A incógnita X seria a recusa teológica de outras possibilidades... obviamente possível por crença, mas afinal insustentável racionalmente. Azar, este universo foi definido justamente pela racionalidade, e os absurdos levam ao vazio contraditório - o caos irracional fica no seu exterior. O tempo permite o absurdo diferido, temporário, mas não o simultâneo e permanente. Todos os filhos de Gaia são introspectivamente recuperáveis, pela lógica do arrependimento, do reconhecimento de erros, mas não é possível a recuperação dos irrecuperáveis. A persistência eterna no absurdo foi simplesmente excluída, nem tampouco poderia ser humana. Logicamente, não poderia ser doutra forma... os erros podem viver nas ilusões temporárias, que acolhem elementos do caos, mas não o caos completo. Desse oceano caótico importamos a imprevisibilidade, elementos artísticos e sentimentais, mas esses impulsos devem sujeitar-se ao enquadramento racional, sob pena de serem o convite ao estabelecimento do irracional, e à recusa da principal faculdade humana, que nos distingue das alimárias, a racionalidade.

Chapéus...
Há muitos, vários formatos de chapéus. Assim, para além do colar com o cordeirinho sacrificial, também o chapéu usado por Filipe III de Borgonha fez moda, ficou conhecido como "chapéu borgonhês", e resistiu aos tempos, sendo ainda hoje uma indumentária usada pela Confraria do Vinho do Porto:
É claro que no caso da confraria de vinho usa-se no colar uma taça de escanção, para averiguar da cor do vinho, afinal simbolicamente tratado como "sangue de Cristo".
A taça do vinho da Última Ceia foi habitualmente designada como Graal, e houve já quem sugerisse que o nome Portugal encerraria um críptico "por-tu-graal", que assim se complementaria, pela associação de Porto e Gaia, nas caves do famoso vinho, que sozinhas asseguravam as contrapartidas do Tratado de Methuen. Para adivinhos, há outros vinhos... os famosos vinhos da Borgonha, ou de Bordéus, da antiga região da Guiana occitana-basca, entre outros preciosos néctares de um Baco divino di-vinho, cuja preservação de antiguidade necessita do devido arrefecimento em caves bem seladas.

Baptista
Não longe, encontramos a Igreja Matriz de Vila do Conde, cuja a entrada é interessante.
De construção biscainha, apresenta de um lado as armas de D. Manuel (num caso raro, em que ainda aparece a dupla esfera armilar, sugerida por D. João II), e do outro lado temos: a âncora da Póvoa de Varzim, o antigo barco de Vila do Conde, e um outro brazão com uma figura humana que emerge de uma concha (símbolo associado à localidade de S. Pedro de Rates).
Igreja Matriz, de S. João Baptista, em Vila do Conde (imagem).

Como a Igreja é dedicada a S. João Baptista (que aparece no topo da porta), a concha será baptismal, mas também referente à mítica presença do Apóstolo Santiago, que teria ordenado S. Pedro de Rates como primeiro Bispo de Braga (45 a 60 d.C.).
Há assim essa dupla ligação a conchas, cuidando ambas para o simbolismo do renascimento, numa igreja renascentista emanuelina. O homem que sai da concha aparece depois, com D. Sebastião, na forma de peixe, invocando esse Renascimento cristão, que seria o renascimento de Cristo, na forma humana.
O ritual baptista parece remeter para uma origem aquática, pela imersão do baptizado, ou mais simbolicamente vertendo água na sua cabeça.
No entanto, há variações baptistas.
Um outro aspecto de baptismo, era o baptismo com óleo, aplicado na unção de sacerdotes.
Aí podemos ver outro aspecto das vieiras que, virtude dos tempos, são reencontradas no símbolo de uma famosa companhia petrolífera:

A vieira usada como símbolo de petróleo pela Shell.

O petróleo, também designado como "ouro negro", passou a encerrar outros véus, ou velos de ouro negro... mas para essas considerações remetemos para um texto anterior.

Poderíamos ainda falar de outros aspectos interessantes das vieiras, nomeadamente pela sua geometria.
Há uma confluência entre parte de um quadrado e parte de um círculo, podendo ser usado para simbolizar a relação do número Pi na quadratura do círculo.
Por outro lado, as divisões naturais das vieiras (ou outras conchas) poderiam servir para marcar ângulos, constituindo um simples instrumento de posicionamento, semelhante a um vulgar quadrante, para simples uso náutico, em navegações primitivas. Esse seria um aspecto prático de orientação astral para qualquer peregrino, associando a vieira ao cajado do pastor.

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publicado às 22:13

Com chás (2)

12.07.13
Vieira.
Já aqui tínhamos apresentado uma moeda que tinha o símbolo da empresa de D. Sebastião:

Serena Celsa Favent, era o moto, e se o esclarecimento favorece a excelência, aqui temos uma concha, a vieira venusiana, e um peixe, símbolo cristão, sob uma constelação estelar (Pleiades?) enquadrada com o crescente selene, lunar.
Devemos notar que as conchas estão ligadas ao baptismo, havendo mesmo pias baptismais com essa forma:
 
Pia baptismal - Igreja NªSrª Navegantes (Armação de Pera, imagem)e concha baptismal (imagem)

Portanto, há uma ligação da concha à libertação do "pecado original", da expulsão do Paraíso. 
Bom, e tendo acabado de falar nas ilhas polinésias, do Taiti no texto anterior, de forma algo natural estabelecemos a noção de "ilha paradisíaca"... como se congenitamente o fosse reconhecido naquelas paisagens.


Pelicano.
Para além do peixe, também o pelicano, pelo auto-sacrifício pela prole, é considerado um símbolo de Cristo, tendo sido primeiro adoptado por D. João II como seu símbolo.
Vamos encontrar esse símbolo com um influente conselheiro dos reis ingleses Henrique VII e Henrique VIII, tratava-se de Richard Foxe, bispo de Winchester:

Leito de morte de Henry VII Tudor (1509) com destaque para Richard Fox, Bispo de Winchester, 
vêem-se as quinas portuguesas e o pelicano de D. João II.

O que faria o Bispo de Winchester, o conselheiro mais influente de Henrique VII, e depois de Henrique VIII (até ser substituído por Wolsey), usar armas com quinas e o pelicano, símbolos do já defunto D. João II?
Estava aqui implícito que a política de D. João II teria uma continuação pelo lado inglês?

Richard Foxe vai fundar o Colégio Corpus Christi de Oxford, que ainda hoje usa o símbolo do pelicano:
  
Richard Fox, o pátio central com o Pelicano do Corpus Christi de Oxford, e as armas do colégio,
que incluem ainda as armas de Hugh Oldham (com 3 mochos e rosas vermelhas de Lancaster)

Mais tarde, também Isabel I, filha de Henrique VIII, a rainha que determinará a expansão inglesa, irá adoptar o pelicano como símbolo no seu papel de "mãe" da Igreja Anglicana. A simbologia cristã do pelicano remontará a S. Tomás de Aquino, a sua ligação às quinas portuguesas só fica evidente através de Fox, e da influência que terá tido na regência dos Tudor.

A tomba de Fox está na catedral de Winchester da Santíssima Trindade, que era a mais influente à época, e que curiosamente esteve em perigo de colapso por inundação das fundações, sendo "salva" pelo trabalho contínuo de um escafandrista, William Walker, entre 1906-11, que tem um busto na catedral cuja cripta ainda se encontra imersa em água. 

Catedral de Winchester, o escafandrista Walker, e a cripta inundada (com escultura moderna).

Cordeiros.
Curiosamente, 50 anos antes, outro Bispo de Winchester, Henry Beaufort, ficou famoso por dirigir o processo inquisitório que condenou Joana d'Arc à fogueira. Tratava-se de um meio-irmão de Filipa de Lancastre, sendo um dos muitos filhos de John de Gaunt (com Katherine Swynford, no terceiro casamento que originou a linha Beaufort). 
Henry Beaufort, o inquisidor, e Joana d'Arc... 
um cordeiro entregue à fogueira.

Joana d'Arc tinha sido entregue por Philippe III de Borgonha (casado com Isabel de Portugal, filha de D. João I, sobrinha do inquisidor). Margaret Beaufort, também sobrinha deste Henry, será mãe do rei Henrique VII, que derrota Ricardo III, tornando-se o primeiro dos Tudor. Henrique VII usa a rosa de Lancaster, mas ao casar com uma rosa de York, terminará a Guerra das Rosas com a união.
Um detalhe importante é Henrique VII usar num retrato o colar do Tosão de Ouro, o símbolo da Ordem fundada por Philippe III de Borgonha, aquando do casamento com Isabel de Portugal.
Phillipe III de Bourgogne, fundador da Ordem do Tosão de Ouro (esq.)
Henry VII Tudor, membro da Ordem do Tosão de Ouro (dir.)
Ambos usam o colar da ordem, com o cordeiro sacrificial.

Duque de Kent, chefe da Grande Loja de Londres, com colar da Maçonaria.

Juntei uma imagem de colar da maçonaria porque o compasso, ou o esquadro, descaindo em forma de V invertido, assemelham-se ao cordeiro sacrificial, que vemos nos colares da Ordem do Tosão de Ouro.
Conforme já referi noutros textos, o cordeiro tem vários significados, não apenas ligados à lenda de Jasão e dos Argonautas. É claro que a Ordem surgindo no contexto do casamento da irmã do Infante D. Henrique, carrega um aspecto dos Descobrimentos ligado aos "Argonautas" e ao Velo de Ouro.
Descobrir foi desvelar, tirar véus... na forma Ariana deste carneiro, o Velo seria a pele de Aries, uma pele de Ouro, ou de Oro, forma abreviada de Hórus, o olho vigilante que se pode ligar ao verbo Orar.
Descobrir foi revelar, levantar Velas e não tanto retirá-las. As cara-velas do Infante velaram pelo véus antigos, e a Ordem do Tosão ou "Velo de Ouro", pode ser vista como preservação do "véu de Hórus".
Jasão teve que vencer o Dragão da Cólquida para obter o Velo de Ouro, tal como Hércules teve que vencer o dragão Ládon, que guardava as ocidentais Hespérides, num dos 12 trabalhos (ou 12 Oras...).
Ao mesmo tempo aparecia a Ordem do Dragão, de que fez parte o Infante D. Pedro, e que já ligámos à Dra-cola, ou Cola do Dragão, em que o "Colar" se refere ao pescoço, tal como Coço e Cola se referem à retaguarda, entrelaçada ao pescoço... (sobre o significado antigo de "coço da procissão" ser "atrás da procissão", ler D. Manuel Clemente)

A história do cordeiro tem ainda o aspecto hebraico que remete à Páscoa, ou à paz-côa, quando Abraão é sujeito ao teste de obediência divino, e o seu filho Isaac é substituído pelo cordeiro no sacrifício:
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, miserere nobis... dona nobis pacem
É um bocado complicado falar deste ponto, porque o sacrifício do cordeiro ordeiro envolve aqui um conceito perverso, no outro verso interpretativo. Deus não permitiria o sacrifício do filho eleito, apenas dos cordeiros... e por isso os cordeiros poderiam ser sacrificados, até que Deus se manifestasse em sentido contrário. E quem eram os cordeiros a sacrificar? O sacrifício indiscriminado traria a presença de Deus?
Pois... até que ponto os Árias foram pastores de Aries, cordeiros? Até que ponto os pastores sacrificariam os seus cordeiros para reencontrarem Deus, ou o Messias?
Esta filosofia continha uma aposta tripla 1X2, se Deus não interviesse perante a iniquidade, os pastores beneficiariam do velo de ouro, uma opção hedonista face à ausência divina. De forma oposta, justificariam a sua acção perante o divino, requerendo a sua presença, afinal a sua omnipotência só permitiria o sacrifício dos sacrificáveis. A incógnita X seria a recusa teológica de outras possibilidades... obviamente possível por crença, mas afinal insustentável racionalmente. Azar, este universo foi definido justamente pela racionalidade, e os absurdos levam ao vazio contraditório - o caos irracional fica no seu exterior. O tempo permite o absurdo diferido, temporário, mas não o simultâneo e permanente. Todos os filhos de Gaia são introspectivamente recuperáveis, pela lógica do arrependimento, do reconhecimento de erros, mas não é possível a recuperação dos irrecuperáveis. A persistência eterna no absurdo foi simplesmente excluída, nem tampouco poderia ser humana. Logicamente, não poderia ser doutra forma... os erros podem viver nas ilusões temporárias, que acolhem elementos do caos, mas não o caos completo. Desse oceano caótico importamos a imprevisibilidade, elementos artísticos e sentimentais, mas esses impulsos devem sujeitar-se ao enquadramento racional, sob pena de serem o convite ao estabelecimento do irracional, e à recusa da principal faculdade humana, que nos distingue das alimárias, a racionalidade.

Chapéus...
Há muitos, vários formatos de chapéus. Assim, para além do colar com o cordeirinho sacrificial, também o chapéu usado por Filipe III de Borgonha fez moda, ficou conhecido como "chapéu borgonhês", e resistiu aos tempos, sendo ainda hoje uma indumentária usada pela Confraria do Vinho do Porto:
É claro que no caso da confraria de vinho usa-se no colar uma taça de escanção, para averiguar da cor do vinho, afinal simbolicamente tratado como "sangue de Cristo".
A taça do vinho da Última Ceia foi habitualmente designada como Graal, e houve já quem sugerisse que o nome Portugal encerraria um críptico "por-tu-graal", que assim se complementaria, pela associação de Porto e Gaia, nas caves do famoso vinho, que sozinhas asseguravam as contrapartidas do Tratado de Methuen. Para adivinhos, há outros vinhos... os famosos vinhos da Borgonha, ou de Bordéus, da antiga região da Guiana occitana-basca, entre outros preciosos néctares de um Baco divino di-vinho, cuja preservação de antiguidade necessita do devido arrefecimento em caves bem seladas.

Baptista
Não longe, encontramos a Igreja Matriz de Vila do Conde, cuja a entrada é interessante.
De construção biscainha, apresenta de um lado as armas de D. Manuel (num caso raro, em que ainda aparece a dupla esfera armilar, sugerida por D. João II), e do outro lado temos: a âncora da Póvoa de Varzim, o antigo barco de Vila do Conde, e um outro brazão com uma figura humana que emerge de uma concha (símbolo associado à localidade de S. Pedro de Rates).
Igreja Matriz, de S. João Baptista, em Vila do Conde (imagem).

Como a Igreja é dedicada a S. João Baptista (que aparece no topo da porta), a concha será baptismal, mas também referente à mítica presença do Apóstolo Santiago, que teria ordenado S. Pedro de Rates como primeiro Bispo de Braga (45 a 60 d.C.).
Há assim essa dupla ligação a conchas, cuidando ambas para o simbolismo do renascimento, numa igreja renascentista emanuelina. O homem que sai da concha aparece depois, com D. Sebastião, na forma de peixe, invocando esse Renascimento cristão, que seria o renascimento de Cristo, na forma humana.
O ritual baptista parece remeter para uma origem aquática, pela imersão do baptizado, ou mais simbolicamente vertendo água na sua cabeça.
No entanto, há variações baptistas.
Um outro aspecto de baptismo, era o baptismo com óleo, aplicado na unção de sacerdotes.
Aí podemos ver outro aspecto das vieiras que, virtude dos tempos, são reencontradas no símbolo de uma famosa companhia petrolífera:

A vieira usada como símbolo de petróleo pela Shell.

O petróleo, também designado como "ouro negro", passou a encerrar outros véus, ou velos de ouro negro... mas para essas considerações remetemos para um texto anterior.

Poderíamos ainda falar de outros aspectos interessantes das vieiras, nomeadamente pela sua geometria.
Há uma confluência entre parte de um quadrado e parte de um círculo, podendo ser usado para simbolizar a relação do número Pi na quadratura do círculo.
Por outro lado, as divisões naturais das vieiras (ou outras conchas) poderiam servir para marcar ângulos, constituindo um simples instrumento de posicionamento, semelhante a um vulgar quadrante, para simples uso náutico, em navegações primitivas. Esse seria um aspecto prático de orientação astral para qualquer peregrino, associando a vieira ao cajado do pastor.

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publicado às 22:13

Sirenes

26.12.12
Na 2ª Parte da Monarquia Lusitana, Frei Bernardo de Brito vai arriscar um tema controverso:
- "Homens Marinhos", que é como quem diz no feminino "sereias" ou "sirenes"...
Brito sabe que o tema é controverso, e diz (pág 7, livro 5):
Nem pareça isto coisa impossível aos leitores escrupulosos de coisas pouco vulgares, porque no mesmo tempo, mandaram os Franceses outra embaixada ao Imperador Tibério, sobre um número grande destes monstros, que o mesmo mar lançara mortos na praia, e afirma Plínio (...)
Brito já antes tinha citado Plínio para falar numa "mulher marinha" que o mar lançara na costa de Lisboa, "cujos gritos ou uivos, ao tempo que morria, ouviram os moradores da terra a grande distância". Talvez faltasse a Brito o termo "sirene" que para além de designar "sereia", foi depois (no Séc. XIX) usado para designar um som característico de alarme. Mas, de entre os inúmeros exemplos que Brito cita, é também frequente serem mudos - "Meyer Baliollano, nos Anais da Flandres, conta que em 1403 foi tomada e trazida à cidade de Harlem uma mulher marítima muda, mas perfeita e proporcionada nas demais partes, a qual viveu muitos anos(...)".

A sereia, da Copenhaga de Hans Christian Andersen.

A questão habitual com que nos defrontamos ao ler textos antigos é misturar-se uma sequência de relatos perfeitamente concordantes com a história oficial - Brito está a relatar a época de Tibério - com relatos inverosímeis - Brito relata uma embaixada Lusitana a Roma por causa de um "homem-marinho" [cf. Nota 1].
Como Brito sabe que o assunto seria risível, avança com uma dezena de exemplos documentados (Plínio, Damião de Goes, Nicephoro Calisto, Mariano, Meyer Baliollano, Guiciardino, Luis Veues, Alberto Magno, Pineda, Cornelio de Amsterdam, Pyerio Valeriano e o Conde D. Pedro).

Não se pode acusar Bernardo de Brito de falta de citações e documentação. A História actual usa os mesmos métodos. A sua diferença face a qualquer autor moderno é que hoje há uma auto-censura educacional, que leva a omitir assuntos, sob pena de ser alvo de chacota, por não ser "sério".  
É isso que fará a Escola que faz Escola a partir de Alexandre Herculano. Corta todas as fontes antigas que contrariem o "politicamente incorrecto", que invoquem o "fabuloso". É uma forma diferente de censura, é mais poderosa, benigna e eficaz - aparece sob a forma de auto-censura para evitar a exposição ao ridículo. Um pensador que estiver certo de uma teoria contra-corrente sofre hoje uma censura tão poderosa quanto a que sofreu Galileu. Galileu não conseguiu convencer os outros, hoje ao fim de algum tempo o pensador é levado a desconfiar da sua sanidade. Galileu viu os seus livros banidos, o tal pensador nem conseguiria publicar um livro sério.

Em condições normais, rir-me-ia desta crença em "homens-marinhos", explicitada por Bernardo Brito. Porém, as condições estão longe de ser normais... houve uma ocultação demasiado grande de demasiados assuntos. Há razões objectivas de desconfiar - não apenas das afirmações de Brito, mas também da sua negação, pelos opositores naturais.
Resta-nos o bom senso, que vamos acumulando pela experiência... e sob esse aspecto, não tenho nenhuma informação que me permita eliminar definitivamente a hipótese de "homens-marinhos", e ainda que considere implausível, não a vou rejeitar a priori essa possibilidade.

Acabando de falar de sereias, no correr do texto sobre o tempo de Tibério, Brito vai abordar logo de seguida a morte de Jesus Cristo. Mais uma vez parece-nos estranho, politicamente incorrecto, mas Brito parece cingir-se à cronologia - ambos os factos teriam ocorrido na mesma governação.
Sob esse assunto, Bernardo Brito não será menos polémico, mas a fácil censura encontrará aí a oposição da  fé católica, a quem não interessam sereias, mas para quem os acontecimentos da vida de Jesus fazem parte da sua religião. Diz Brito
Tornando pois à continuação do império e vida de Tibério Caesar, conta Paulo Orósio, e Eutropio, que aos anos 16 da sua monarquia, no mês de Março houve um terramoto universal no mundo, acompanhado de um eclipse tão extraordinário, que não houve sábio (havendo grandes naquele tempo) que soubesse dar razão a tão novo modo de oposição como então tiveram o Sol e a Lua : tudo o qual foi aquele geral sentimento que a Natureza mostrou na morte do seu Criador, e nosso Redentor Jesus Cristo, referido no Evangelho Sagrado (Mateus, Marcos), e por coisa tão notável, e que não menos se viu nestas partes de Portugal e Espanha (onde diz Laimundo que se mostravam rochas abertas deste terramoto), que nas de Ásia e Judeia (...)
Também sobre este assunto poderia Bernardo Brito citar Plínio, já que conforme aqui referimos é suficientemente estranho o registo de anomalias que poderiam estar na causa do desajuste do Solarium Augusti, o enorme relógio solar que Octávio Augusto fizera no Campo de Marte, e que a partir dessa altura tinha ficado inútil.
É ainda curioso Brito estabelecer exactamente o dia da morte de Jesus - sexta-feira, 25 de Março, incluindo o nome dos "ladrões" também crucificados (Dimas, arrependido, e Gestas), falando ainda da ressurreição a 27 de Março, de ter feito S. Pedro seu vigário a 4 de Abril, junto ao mar da Galileia, e da "subida ao céu" apenas a 6 de Maio... tendo após 10 dias "consolado e confirmado os seu discípulos com a vinda do Espírito Santo, dando-lhe a força e sabedoria necessárias (...)"
Creio que estes detalhes, com datas precisas, estão completamente omissos na tradição católica.
Ao contrário, as datas adoptadas para a Sexta-Feira Santa usam como referência a Páscoa judaica, ajustada ao calendário lunar e não solar. Isto não deixa de ser interessante porque o carácter universal que tomou o cristianismo, não deixou de se vergar à agenda judaica. Isso poderia ser aceitável no islamismo, que vê Jesus apenas como um profeta, e usa ainda o calendário lunar. No entanto, a Bíblia católica, apesar de considerar Jesus como o Messias, não deixou de integrar o Testamento dos Velhos, incorporando por completo toda a tradição judaica fundamental, enquanto nos Evangelhos são raras as referências a esse texto, praticamente dispensando a sua leitura.

Nota 1: (26/12/2012) Sobre a embaixada que os lusitanos enviaram a Tibério diz Bernardo Brito:
"Por este próprio tempo conta Plínio que mandaram os portugueses de Lisboa uma solene embaixada a Roma, e com ela dar conta ao imperador de um portento que aparecia naquela costa, que era um homem marinho, da forma que vulgarmente o pintam, e saindo em terra, entre as rochas que pendiam sobre o mar, e faziam uma semelhança de cova, tocava uma buzina feita de concha de búzio, com tanta força, que o som dela fez advertir os moradores da terra, em quem a tangia, ficando tão admirados de sua visita, que lhe pareceu matéria bastante para com ela formarem a embaixada."

Nota 2: Convirá não esquecer também a descrição do "monstro-marinho", a Ipupiara de Pero de Magalhães Gandavo.

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 07:23

Sirenes

26.12.12
Na 2ª Parte da Monarquia Lusitana, Frei Bernardo de Brito vai arriscar um tema controverso:
- "Homens Marinhos", que é como quem diz no feminino "sereias" ou "sirenes"...
Brito sabe que o tema é controverso, e diz (pág 7, livro 5):
Nem pareça isto coisa impossível aos leitores escrupulosos de coisas pouco vulgares, porque no mesmo tempo, mandaram os Franceses outra embaixada ao Imperador Tibério, sobre um número grande destes monstros, que o mesmo mar lançara mortos na praia, e afirma Plínio (...)
Brito já antes tinha citado Plínio para falar numa "mulher marinha" que o mar lançara na costa de Lisboa, "cujos gritos ou uivos, ao tempo que morria, ouviram os moradores da terra a grande distância". Talvez faltasse a Brito o termo "sirene" que para além de designar "sereia", foi depois (no Séc. XIX) usado para designar um som característico de alarme. Mas, de entre os inúmeros exemplos que Brito cita, é também frequente serem mudos - "Meyer Baliollano, nos Anais da Flandres, conta que em 1403 foi tomada e trazida à cidade de Harlem uma mulher marítima muda, mas perfeita e proporcionada nas demais partes, a qual viveu muitos anos(...)".

A sereia, da Copenhaga de Hans Christian Andersen.

A questão habitual com que nos defrontamos ao ler textos antigos é misturar-se uma sequência de relatos perfeitamente concordantes com a história oficial - Brito está a relatar a época de Tibério - com relatos inverosímeis - Brito relata uma embaixada Lusitana a Roma por causa de um "homem-marinho" [cf. Nota 1].
Como Brito sabe que o assunto seria risível, avança com uma dezena de exemplos documentados (Plínio, Damião de Goes, Nicephoro Calisto, Mariano, Meyer Baliollano, Guiciardino, Luis Veues, Alberto Magno, Pineda, Cornelio de Amsterdam, Pyerio Valeriano e o Conde D. Pedro).

Não se pode acusar Bernardo de Brito de falta de citações e documentação. A História actual usa os mesmos métodos. A sua diferença face a qualquer autor moderno é que hoje há uma auto-censura educacional, que leva a omitir assuntos, sob pena de ser alvo de chacota, por não ser "sério".  
É isso que fará a Escola que faz Escola a partir de Alexandre Herculano. Corta todas as fontes antigas que contrariem o "politicamente incorrecto", que invoquem o "fabuloso". É uma forma diferente de censura, é mais poderosa, benigna e eficaz - aparece sob a forma de auto-censura para evitar a exposição ao ridículo. Um pensador que estiver certo de uma teoria contra-corrente sofre hoje uma censura tão poderosa quanto a que sofreu Galileu. Galileu não conseguiu convencer os outros, hoje ao fim de algum tempo o pensador é levado a desconfiar da sua sanidade. Galileu viu os seus livros banidos, o tal pensador nem conseguiria publicar um livro sério.

Em condições normais, rir-me-ia desta crença em "homens-marinhos", explicitada por Bernardo Brito. Porém, as condições estão longe de ser normais... houve uma ocultação demasiado grande de demasiados assuntos. Há razões objectivas de desconfiar - não apenas das afirmações de Brito, mas também da sua negação, pelos opositores naturais.
Resta-nos o bom senso, que vamos acumulando pela experiência... e sob esse aspecto, não tenho nenhuma informação que me permita eliminar definitivamente a hipótese de "homens-marinhos", e ainda que considere implausível, não a vou rejeitar a priori essa possibilidade.

Acabando de falar de sereias, no correr do texto sobre o tempo de Tibério, Brito vai abordar logo de seguida a morte de Jesus Cristo. Mais uma vez parece-nos estranho, politicamente incorrecto, mas Brito parece cingir-se à cronologia - ambos os factos teriam ocorrido na mesma governação.
Sob esse assunto, Bernardo Brito não será menos polémico, mas a fácil censura encontrará aí a oposição da  fé católica, a quem não interessam sereias, mas para quem os acontecimentos da vida de Jesus fazem parte da sua religião. Diz Brito
Tornando pois à continuação do império e vida de Tibério Caesar, conta Paulo Orósio, e Eutropio, que aos anos 16 da sua monarquia, no mês de Março houve um terramoto universal no mundo, acompanhado de um eclipse tão extraordinário, que não houve sábio (havendo grandes naquele tempo) que soubesse dar razão a tão novo modo de oposição como então tiveram o Sol e a Lua : tudo o qual foi aquele geral sentimento que a Natureza mostrou na morte do seu Criador, e nosso Redentor Jesus Cristo, referido no Evangelho Sagrado (Mateus, Marcos), e por coisa tão notável, e que não menos se viu nestas partes de Portugal e Espanha (onde diz Laimundo que se mostravam rochas abertas deste terramoto), que nas de Ásia e Judeia (...)
Também sobre este assunto poderia Bernardo Brito citar Plínio, já que conforme aqui referimos é suficientemente estranho o registo de anomalias que poderiam estar na causa do desajuste do Solarium Augusti, o enorme relógio solar que Octávio Augusto fizera no Campo de Marte, e que a partir dessa altura tinha ficado inútil.
É ainda curioso Brito estabelecer exactamente o dia da morte de Jesus - sexta-feira, 25 de Março, incluindo o nome dos "ladrões" também crucificados (Dimas, arrependido, e Gestas), falando ainda da ressurreição a 27 de Março, de ter feito S. Pedro seu vigário a 4 de Abril, junto ao mar da Galileia, e da "subida ao céu" apenas a 6 de Maio... tendo após 10 dias "consolado e confirmado os seu discípulos com a vinda do Espírito Santo, dando-lhe a força e sabedoria necessárias (...)"
Creio que estes detalhes, com datas precisas, estão completamente omissos na tradição católica.
Ao contrário, as datas adoptadas para a Sexta-Feira Santa usam como referência a Páscoa judaica, ajustada ao calendário lunar e não solar. Isto não deixa de ser interessante porque o carácter universal que tomou o cristianismo, não deixou de se vergar à agenda judaica. Isso poderia ser aceitável no islamismo, que vê Jesus apenas como um profeta, e usa ainda o calendário lunar. No entanto, a Bíblia católica, apesar de considerar Jesus como o Messias, não deixou de integrar o Testamento dos Velhos, incorporando por completo toda a tradição judaica fundamental, enquanto nos Evangelhos são raras as referências a esse texto, praticamente dispensando a sua leitura.

Nota 1: (26/12/2012) Sobre a embaixada que os lusitanos enviaram a Tibério diz Bernardo Brito:
"Por este próprio tempo conta Plínio que mandaram os portugueses de Lisboa uma solene embaixada a Roma, e com ela dar conta ao imperador de um portento que aparecia naquela costa, que era um homem marinho, da forma que vulgarmente o pintam, e saindo em terra, entre as rochas que pendiam sobre o mar, e faziam uma semelhança de cova, tocava uma buzina feita de concha de búzio, com tanta força, que o som dela fez advertir os moradores da terra, em quem a tangia, ficando tão admirados de sua visita, que lhe pareceu matéria bastante para com ela formarem a embaixada."

Nota 2: Convirá não esquecer também a descrição do "monstro-marinho", a Ipupiara de Pero de Magalhães Gandavo.

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publicado às 07:23

Sirenes

25.12.12
Na 2ª Parte da Monarquia Lusitana, Frei Bernardo de Brito vai arriscar um tema controverso:
- "Homens Marinhos", que é como quem diz no feminino "sereias" ou "sirenes"...
Brito sabe que o tema é controverso, e diz (pág 7, livro 5):
Nem pareça isto coisa impossível aos leitores escrupulosos de coisas pouco vulgares, porque no mesmo tempo, mandaram os Franceses outra embaixada ao Imperador Tibério, sobre um número grande destes monstros, que o mesmo mar lançara mortos na praia, e afirma Plínio (...)
Brito já antes tinha citado Plínio para falar numa "mulher marinha" que o mar lançara na costa de Lisboa, "cujos gritos ou uivos, ao tempo que morria, ouviram os moradores da terra a grande distância". Talvez faltasse a Brito o termo "sirene" que para além de designar "sereia", foi depois (no Séc. XIX) usado para designar um som característico de alarme. Mas, de entre os inúmeros exemplos que Brito cita, é também frequente serem mudos - "Meyer Baliollano, nos Anais da Flandres, conta que em 1403 foi tomada e trazida à cidade de Harlem uma mulher marítima muda, mas perfeita e proporcionada nas demais partes, a qual viveu muitos anos(...)".

A sereia, da Copenhaga de Hans Christian Andersen.

A questão habitual com que nos defrontamos ao ler textos antigos é misturar-se uma sequência de relatos perfeitamente concordantes com a história oficial - Brito está a relatar a época de Tibério - com relatos inverosímeis - Brito relata uma embaixada Lusitana a Roma por causa de um "homem-marinho" [cf. Nota 1].
Como Brito sabe que o assunto seria risível, avança com uma dezena de exemplos documentados (Plínio, Damião de Goes, Nicephoro Calisto, Mariano, Meyer Baliollano, Guiciardino, Luis Veues, Alberto Magno, Pineda, Cornelio de Amsterdam, Pyerio Valeriano e o Conde D. Pedro).

Não se pode acusar Bernardo de Brito de falta de citações e documentação. A História actual usa os mesmos métodos. A sua diferença face a qualquer autor moderno é que hoje há uma auto-censura educacional, que leva a omitir assuntos, sob pena de ser alvo de chacota, por não ser "sério".  
É isso que fará a Escola que faz Escola a partir de Alexandre Herculano. Corta todas as fontes antigas que contrariem o "politicamente incorrecto", que invoquem o "fabuloso". É uma forma diferente de censura, é mais poderosa, benigna e eficaz - aparece sob a forma de auto-censura para evitar a exposição ao ridículo. Um pensador que estiver certo de uma teoria contra-corrente sofre hoje uma censura tão poderosa quanto a que sofreu Galileu. Galileu não conseguiu convencer os outros, hoje ao fim de algum tempo o pensador é levado a desconfiar da sua sanidade. Galileu viu os seus livros banidos, o tal pensador nem conseguiria publicar um livro sério.

Em condições normais, rir-me-ia desta crença em "homens-marinhos", explicitada por Bernardo Brito. Porém, as condições estão longe de ser normais... houve uma ocultação demasiado grande de demasiados assuntos. Há razões objectivas de desconfiar - não apenas das afirmações de Brito, mas também da sua negação, pelos opositores naturais.
Resta-nos o bom senso, que vamos acumulando pela experiência... e sob esse aspecto, não tenho nenhuma informação que me permita eliminar definitivamente a hipótese de "homens-marinhos", e ainda que considere implausível, não a vou rejeitar a priori essa possibilidade.

Acabando de falar de sereias, no correr do texto sobre o tempo de Tibério, Brito vai abordar logo de seguida a morte de Jesus Cristo. Mais uma vez parece-nos estranho, politicamente incorrecto, mas Brito parece cingir-se à cronologia - ambos os factos teriam ocorrido na mesma governação.
Sob esse assunto, Bernardo Brito não será menos polémico, mas a fácil censura encontrará aí a oposição da  fé católica, a quem não interessam sereias, mas para quem os acontecimentos da vida de Jesus fazem parte da sua religião. Diz Brito
Tornando pois à continuação do império e vida de Tibério Caesar, conta Paulo Orósio, e Eutropio, que aos anos 16 da sua monarquia, no mês de Março houve um terramoto universal no mundo, acompanhado de um eclipse tão extraordinário, que não houve sábio (havendo grandes naquele tempo) que soubesse dar razão a tão novo modo de oposição como então tiveram o Sol e a Lua : tudo o qual foi aquele geral sentimento que a Natureza mostrou na morte do seu Criador, e nosso Redentor Jesus Cristo, referido no Evangelho Sagrado (Mateus, Marcos), e por coisa tão notável, e que não menos se viu nestas partes de Portugal e Espanha (onde diz Laimundo que se mostravam rochas abertas deste terramoto), que nas de Ásia e Judeia (...)
Também sobre este assunto poderia Bernardo Brito citar Plínio, já que conforme aqui referimos é suficientemente estranho o registo de anomalias que poderiam estar na causa do desajuste do Solarium Augusti, o enorme relógio solar que Octávio Augusto fizera no Campo de Marte, e que a partir dessa altura tinha ficado inútil.
É ainda curioso Brito estabelecer exactamente o dia da morte de Jesus - sexta-feira, 25 de Março, incluindo o nome dos "ladrões" também crucificados (Dimas, arrependido, e Gestas), falando ainda da ressurreição a 27 de Março, de ter feito S. Pedro seu vigário a 4 de Abril, junto ao mar da Galileia, e da "subida ao céu" apenas a 6 de Maio... tendo após 10 dias "consolado e confirmado os seu discípulos com a vinda do Espírito Santo, dando-lhe a força e sabedoria necessárias (...)"
Creio que estes detalhes, com datas precisas, estão completamente omissos na tradição católica.
Ao contrário, as datas adoptadas para a Sexta-Feira Santa usam como referência a Páscoa judaica, ajustada ao calendário lunar e não solar. Isto não deixa de ser interessante porque o carácter universal que tomou o cristianismo, não deixou de se vergar à agenda judaica. Isso poderia ser aceitável no islamismo, que vê Jesus apenas como um profeta, e usa ainda o calendário lunar. No entanto, a Bíblia católica, apesar de considerar Jesus como o Messias, não deixou de integrar o Testamento dos Velhos, incorporando por completo toda a tradição judaica fundamental, enquanto nos Evangelhos são raras as referências a esse texto, praticamente dispensando a sua leitura.

Nota 1: (26/12/2012) Sobre a embaixada que os lusitanos enviaram a Tibério diz Bernardo Brito:
"Por este próprio tempo conta Plínio que mandaram os portugueses de Lisboa uma solene embaixada a Roma, e com ela dar conta ao imperador de um portento que aparecia naquela costa, que era um homem marinho, da forma que vulgarmente o pintam, e saindo em terra, entre as rochas que pendiam sobre o mar, e faziam uma semelhança de cova, tocava uma buzina feita de concha de búzio, com tanta força, que o som dela fez advertir os moradores da terra, em quem a tangia, ficando tão admirados de sua visita, que lhe pareceu matéria bastante para com ela formarem a embaixada."

Nota 2: Convirá não esquecer também a descrição do "monstro-marinho", a Ipupiara de Pero de Magalhães Gandavo.

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publicado às 23:23

Na sequência do texto anterior, sobre a eventual presença de Cristo na Índia, comentei sobre o papel dos missionários budistas na divulgação da religião. Esse aspecto está bem salientado no livro 
"An Inglorious Columbus", de Edward Vining, 1885

O livro fala do relato missionário de Hui Shan, monge budista do Séc. V, que teria abordado o desconhecido país de Fusang em conjunto com um grupo de budistas do Afeganistão.  Este seria o mesmo Fusang reportado por Marco Polo, e que começava a constar na Cartografia do Séc. XVIII, conforme já aqui abordámos.
Na realidade este debate sobre uma Fusang americana começa a ser explícito em França, em 1761, por Joseph de Guignes, que lança nesse ano duas memórias (cf. wiki):
  • Recherches sur les Navigations des Chinois du Cote de l'Amerique, et sur quelques Peuples situés a l'extremite orientale de l"asie. (1761)
  • Le Fou-Sang des Chinois est-il l'Amérique? Mémoires de l'Académie des Inscriptions et Belles Lettres, tome 28, Paris, 1761
A Companhia das Índias Francesa cessaria funções pouco depois, e passados 5 anos Cook é autorizado a zarpar pelo Pacífico - o Fusang americano desaparece sem rasto. No entanto, durante o Séc. XIX e até à 1ª Guerra Mundial, a questão da ligação chinesa à América estará presente nas discussões, como verificámos com Cândido Costa
Dez anos antes de Vining, em 1875 Charles Leland já tinha lançado o livro:
 Fusang or the Discovery of America by Chinese Buddhist Priests in the Fifth Century
que praticamente aborda o mesmo tema. Ou ainda, 
Notices of Fusang de William Wells, 1881, traduzido de Ma Twan-Lin (Séc. XIII).

É perfeitamente natural que a determinação dos monges budistas, na propagação da sua religião, os tivesse levado a paragens americanas. As civilizações americanas, por exemplo a Azteca ou a Inca não parecem ter acolhido essa filosofia, e se os houve, não restaram nenhuns Budas de pé, nem sentados ou mesmo deitados... ainda que Vining tenha procurado encontrar poses budistas nalgumas figuras Aztecas. De acordo com Vining, a rota seguida por Hwui Shan teria sido a seguinte:
E. Vining - suposta navegação feita por Hwui Sheng

A terra de Fusang, Fu Sang Kwoh, situar-se-ia na região californiana, e já na parte mexicana encontramos assinalado o "país das mulheres"... lembrando a motivação feminina que levou à designação do Amazonas, já em plena América do Sul.

Fu sang seria o nome dado a uma árvore sagrada, associada ao Aloe ou Agave Americano (ver chinahistoryforum.com), ou Piteira, uma espécie de cacto que quando floresce produz uma notável árvore:
A "árvore" da Piteira - Aloe ou Agave Americano

Noutra versão, o nome Fu Sang é associado a uma outra árvore - a Amoreira. A este propósito, citamos Alexander M'Alan:
Mulberry land is there, say the Chinese.
Mulberry land is here, say the Mexicans.
no livro Ancient Chinese account of the Grand Canyon (1913).

Porém, de entre estes autores, Joseph de Guignes levanta uma hipótese surpreendente, e que foi fortemente rebatida pelos seus contemporâneos - Teria sido a China uma colónia egípcia?
E se a argumentação assentava essencialmente no carácter ideográfico de ambas as escritas, não sei por que razão não seria de levantar o recíproco... até porque o Egipto apareceu quase singular a ocidente na sua faceta ideográfica. Essa argumentação continha ainda a pretensão da ligação chinesa aos povos mexicanos, que também tinham desenvolvido escritas ideográficas.

É interessante encontrar estas possibilidades abordados no Séc. XVIII, e talvez só pecassem por tardias... e por mais inverosímeis que possam parecer, é mais estranho terem desaparecido, e no meio do politicamente correcto, numa altura em que sabemos já da existência de pirâmides na China, ninguém ousa retomar as ligações.

Será que os construtores de pirâmides estavam destinados a desenvolver escritas ideográficas? 
Não parecerá estranho terem sido desenvolvidas pirâmides no Egipto, na China, no México, e sempre associadas a povos com escritas ideográficas? Não será de suspeitar de um elo comum?
Para esse efeito, Vining vai buscar uma notável associação feita por Humboldt, entre a designação dos animais associados aos signos tibetanos e os hieróglifos mexicanos para a ordem dos dias, evidenciando uma coincidência que dificilmente se poderá tomar como acidental:
Tabela de Humboldt - signos tibetanos e dias mexicanos

Ainda que se ofereça perguntar por que razão os mexicanos falariam em tigres, talvez se trate de associação com o jaguar, não sendo de excluir outras possibilidades menos convencionais - afinal foram encontradas representações de leões - ver Leão de Techialoyan, e ver agora também as piteiras, que constavam na página ao lado...

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 05:31

Na sequência do texto anterior, sobre a eventual presença de Cristo na Índia, comentei sobre o papel dos missionários budistas na divulgação da religião. Esse aspecto está bem salientado no livro 
"An Inglorious Columbus", de Edward Vining, 1885

O livro fala do relato missionário de Hui Shan, monge budista do Séc. V, que teria abordado o desconhecido país de Fusang em conjunto com um grupo de budistas do Afeganistão.  Este seria o mesmo Fusang reportado por Marco Polo, e que começava a constar na Cartografia do Séc. XVIII, conforme já aqui abordámos.
Na realidade este debate sobre uma Fusang americana começa a ser explícito em França, em 1761, por Joseph de Guignes, que lança nesse ano duas memórias (cf. wiki):
  • Recherches sur les Navigations des Chinois du Cote de l'Amerique, et sur quelques Peuples situés a l'extremite orientale de l"asie. (1761)
  • Le Fou-Sang des Chinois est-il l'Amérique? Mémoires de l'Académie des Inscriptions et Belles Lettres, tome 28, Paris, 1761
A Companhia das Índias Francesa cessaria funções pouco depois, e passados 5 anos Cook é autorizado a zarpar pelo Pacífico - o Fusang americano desaparece sem rasto. No entanto, durante o Séc. XIX e até à 1ª Guerra Mundial, a questão da ligação chinesa à América estará presente nas discussões, como verificámos com Cândido Costa
Dez anos antes de Vining, em 1875 Charles Leland já tinha lançado o livro:
 Fusang or the Discovery of America by Chinese Buddhist Priests in the Fifth Century
que praticamente aborda o mesmo tema. Ou ainda, 
Notices of Fusang de William Wells, 1881, traduzido de Ma Twan-Lin (Séc. XIII).

É perfeitamente natural que a determinação dos monges budistas, na propagação da sua religião, os tivesse levado a paragens americanas. As civilizações americanas, por exemplo a Azteca ou a Inca não parecem ter acolhido essa filosofia, e se os houve, não restaram nenhuns Budas de pé, nem sentados ou mesmo deitados... ainda que Vining tenha procurado encontrar poses budistas nalgumas figuras Aztecas. De acordo com Vining, a rota seguida por Hwui Shan teria sido a seguinte:
E. Vining - suposta navegação feita por Hwui Sheng

A terra de Fusang, Fu Sang Kwoh, situar-se-ia na região californiana, e já na parte mexicana encontramos assinalado o "país das mulheres"... lembrando a motivação feminina que levou à designação do Amazonas, já em plena América do Sul.

Fu sang seria o nome dado a uma árvore sagrada, associada ao Aloe ou Agave Americano (ver chinahistoryforum.com), ou Piteira, uma espécie de cacto que quando floresce produz uma notável árvore:
A "árvore" da Piteira - Aloe ou Agave Americano

Noutra versão, o nome Fu Sang é associado a uma outra árvore - a Amoreira. A este propósito, citamos Alexander M'Alan:
Mulberry land is there, say the Chinese.
Mulberry land is here, say the Mexicans.
no livro Ancient Chinese account of the Grand Canyon (1913).

Porém, de entre estes autores, Joseph de Guignes levanta uma hipótese surpreendente, e que foi fortemente rebatida pelos seus contemporâneos - Teria sido a China uma colónia egípcia?
E se a argumentação assentava essencialmente no carácter ideográfico de ambas as escritas, não sei por que razão não seria de levantar o recíproco... até porque o Egipto apareceu quase singular a ocidente na sua faceta ideográfica. Essa argumentação continha ainda a pretensão da ligação chinesa aos povos mexicanos, que também tinham desenvolvido escritas ideográficas.

É interessante encontrar estas possibilidades abordados no Séc. XVIII, e talvez só pecassem por tardias... e por mais inverosímeis que possam parecer, é mais estranho terem desaparecido, e no meio do politicamente correcto, numa altura em que sabemos já da existência de pirâmides na China, ninguém ousa retomar as ligações.

Será que os construtores de pirâmides estavam destinados a desenvolver escritas ideográficas? 
Não parecerá estranho terem sido desenvolvidas pirâmides no Egipto, na China, no México, e sempre associadas a povos com escritas ideográficas? Não será de suspeitar de um elo comum?
Para esse efeito, Vining vai buscar uma notável associação feita por Humboldt, entre a designação dos animais associados aos signos tibetanos e os hieróglifos mexicanos para a ordem dos dias, evidenciando uma coincidência que dificilmente se poderá tomar como acidental:
Tabela de Humboldt - signos tibetanos e dias mexicanos

Ainda que se ofereça perguntar por que razão os mexicanos falariam em tigres, talvez se trate de associação com o jaguar, não sendo de excluir outras possibilidades menos convencionais - afinal foram encontradas representações de leões - ver Leão de Techialoyan, e ver agora também as piteiras, que constavam na página ao lado...

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publicado às 05:31

Na sequência do texto anterior, sobre a eventual presença de Cristo na Índia, comentei sobre o papel dos missionários budistas na divulgação da religião. Esse aspecto está bem salientado no livro 
"An Inglorious Columbus", de Edward Vining, 1885

O livro fala do relato missionário de Hui Shan, monge budista do Séc. V, que teria abordado o desconhecido país de Fusang em conjunto com um grupo de budistas do Afeganistão.  Este seria o mesmo Fusang reportado por Marco Polo, e que começava a constar na Cartografia do Séc. XVIII, conforme já aqui abordámos.
Na realidade este debate sobre uma Fusang americana começa a ser explícito em França, em 1761, por Joseph de Guignes, que lança nesse ano duas memórias (cf. wiki):
  • Recherches sur les Navigations des Chinois du Cote de l'Amerique, et sur quelques Peuples situés a l'extremite orientale de l"asie. (1761)
  • Le Fou-Sang des Chinois est-il l'Amérique? Mémoires de l'Académie des Inscriptions et Belles Lettres, tome 28, Paris, 1761
A Companhia das Índias Francesa cessaria funções pouco depois, e passados 5 anos Cook é autorizado a zarpar pelo Pacífico - o Fusang americano desaparece sem rasto. No entanto, durante o Séc. XIX e até à 1ª Guerra Mundial, a questão da ligação chinesa à América estará presente nas discussões, como verificámos com Cândido Costa
Dez anos antes de Vining, em 1875 Charles Leland já tinha lançado o livro:
 Fusang or the Discovery of America by Chinese Buddhist Priests in the Fifth Century
que praticamente aborda o mesmo tema. Ou ainda, 
Notices of Fusang de William Wells, 1881, traduzido de Ma Twan-Lin (Séc. XIII).

É perfeitamente natural que a determinação dos monges budistas, na propagação da sua religião, os tivesse levado a paragens americanas. As civilizações americanas, por exemplo a Azteca ou a Inca não parecem ter acolhido essa filosofia, e se os houve, não restaram nenhuns Budas de pé, nem sentados ou mesmo deitados... ainda que Vining tenha procurado encontrar poses budistas nalgumas figuras Aztecas. De acordo com Vining, a rota seguida por Hwui Shan teria sido a seguinte:
E. Vining - suposta navegação feita por Hwui Sheng

A terra de Fusang, Fu Sang Kwoh, situar-se-ia na região californiana, e já na parte mexicana encontramos assinalado o "país das mulheres"... lembrando a motivação feminina que levou à designação do Amazonas, já em plena América do Sul.

Fu sang seria o nome dado a uma árvore sagrada, associada ao Aloe ou Agave Americano (ver chinahistoryforum.com), ou Piteira, uma espécie de cacto que quando floresce produz uma notável árvore:
A "árvore" da Piteira - Aloe ou Agave Americano

Noutra versão, o nome Fu Sang é associado a uma outra árvore - a Amoreira. A este propósito, citamos Alexander M'Alan:
Mulberry land is there, say the Chinese.
Mulberry land is here, say the Mexicans.
no livro Ancient Chinese account of the Grand Canyon (1913).

Porém, de entre estes autores, Joseph de Guignes levanta uma hipótese surpreendente, e que foi fortemente rebatida pelos seus contemporâneos - Teria sido a China uma colónia egípcia?
E se a argumentação assentava essencialmente no carácter ideográfico de ambas as escritas, não sei por que razão não seria de levantar o recíproco... até porque o Egipto apareceu quase singular a ocidente na sua faceta ideográfica. Essa argumentação continha ainda a pretensão da ligação chinesa aos povos mexicanos, que também tinham desenvolvido escritas ideográficas.

É interessante encontrar estas possibilidades abordados no Séc. XVIII, e talvez só pecassem por tardias... e por mais inverosímeis que possam parecer, é mais estranho terem desaparecido, e no meio do politicamente correcto, numa altura em que sabemos já da existência de pirâmides na China, ninguém ousa retomar as ligações.

Será que os construtores de pirâmides estavam destinados a desenvolver escritas ideográficas? 
Não parecerá estranho terem sido desenvolvidas pirâmides no Egipto, na China, no México, e sempre associadas a povos com escritas ideográficas? Não será de suspeitar de um elo comum?
Para esse efeito, Vining vai buscar uma notável associação feita por Humboldt, entre a designação dos animais associados aos signos tibetanos e os hieróglifos mexicanos para a ordem dos dias, evidenciando uma coincidência que dificilmente se poderá tomar como acidental:
Tabela de Humboldt - signos tibetanos e dias mexicanos

Ainda que se ofereça perguntar por que razão os mexicanos falariam em tigres, talvez se trate de associação com o jaguar, não sendo de excluir outras possibilidades menos convencionais - afinal foram encontradas representações de leões - ver Leão de Techialoyan, e ver agora também as piteiras, que constavam na página ao lado...

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