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Pelo lado chinês, encontramos uma versão sínica de um mapa muito semelhante ao Theatrum Mundi de Lavanha, ou de Ortélio, denominada Wanguo Quantu, e datada c. 1620:
Wanguo Quantu, mapa do jesuíta Giulio Aleni (c. 1620)

É justificado o mapa pela colocação central do Império do Meio, evitando assim a tradicional colocação europeia nessa posição central. Podemos ver que os chineses não pareciam ter problemas em aceitar um mapa que evidenciasse o Estreito de Anian (dito de Bering), ao contrário do que foi depois referido por Carvalho da Costa (ver texto sobre Nova Zimla). Aliás o contorno americano, ou da costa russa, parece reflectir o conhecimento geral dessa zona, tal como já tinha sido verificado nos outros "theatrum mundi".

Antes, teria aparecido no tratado Sancai Tuhui um outro mapa, o Shanhai Yudi Quantu (1606, com base em Matteo Ricci), que mostrava uma concepção mais próxima dos primeiros mapas europeus do Séc. XVI (como o de Waldseemuller):
Mapa Shanhai Yudi Quantu (1606), aqui com tradução de Roderich Ptak.

Na tradução deste mapa é possível ver algumas legendas curiosas:
  • Um Mar Vermelho "oriental" na península californiana, conforme mencionado aqui nos Sinais Vermelhos e anteriormente. Aparece também o habitual Mar Vermelho "ocidental" na África.
  • Yawaima - no noroeste americano, que corresponderia à zona de Fusang (o nome Yawai pode sugerir alguma conexão a Hawai).
  • Mar de Keluotuo - que poderá ser a Baía de Hudson.
  • Na Europa apenas a França é nomeada... enquanto que na zona ibérica é escrito "mais de 30 reinos", podendo referir-se a toda a Europa! Parece ainda haver uma confusão entre o Mar Negro e o Cáspio (o que não nos surpreende).
  • A Líbia é a África, e na zona do Atlas é colocada a legenda "montanhas mais altas da Terra"
  • A sul, a Magellania refere já a confusão de concatenação da Austrália com a a Antártida - de um lado fala-se em "terra de papagaios", e do outro na Terra do Fogo e "picos brancos". A legenda dirá ainda que "poucos teriam chegado a essas paragens a sul".
Se o outro mapa tem a clara marca do cartógrafo ocidental (Giulio Aleni), neste mapa reflectem-se mais as influências na concepção e nomenclatura, especialmente pela referência a Magalhães. Não se parece notar nenhuma cartografia própria dos chineses, mantendo as mesmas restrições/mitos ocidentais, especialmente sobre a parte sul na "Magellania". O "mar gelado" aparece apenas mencionado a norte do Canadá...

Sendo expectável que os chineses tivessem conhecimento, pelas grandes navegações que teriam feito, de outras paragens, como por exemplo a Austrália, estes mapas mostram uma grande sintonia no que era transmitido a Ocidente e a Oriente(*)... sugerindo a existência de uma única ordem global dominante!

Nota:
(*) Esta concepção restritiva é ainda visível em mapas coreanos, mesmo do séc. XIX.

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 09:34

Pelo lado chinês, encontramos uma versão sínica de um mapa muito semelhante ao Theatrum Mundi de Lavanha, ou de Ortélio, denominada Wanguo Quantu, e datada c. 1620:
Wanguo Quantu, mapa do jesuíta Giulio Aleni (c. 1620)

É justificado o mapa pela colocação central do Império do Meio, evitando assim a tradicional colocação europeia nessa posição central. Podemos ver que os chineses não pareciam ter problemas em aceitar um mapa que evidenciasse o Estreito de Anian (dito de Bering), ao contrário do que foi depois referido por Carvalho da Costa (ver texto sobre Nova Zimla). Aliás o contorno americano, ou da costa russa, parece reflectir o conhecimento geral dessa zona, tal como já tinha sido verificado nos outros "theatrum mundi".

Antes, teria aparecido no tratado Sancai Tuhui um outro mapa, o Shanhai Yudi Quantu (1606, com base em Matteo Ricci), que mostrava uma concepção mais próxima dos primeiros mapas europeus do Séc. XVI (como o de Waldseemuller):
Mapa Shanhai Yudi Quantu (1606), aqui com tradução de Roderich Ptak.

Na tradução deste mapa é possível ver algumas legendas curiosas:
  • Um Mar Vermelho "oriental" na península californiana, conforme mencionado aqui nos Sinais Vermelhos e anteriormente. Aparece também o habitual Mar Vermelho "ocidental" na África.
  • Yawaima - no noroeste americano, que corresponderia à zona de Fusang (o nome Yawai pode sugerir alguma conexão a Hawai).
  • Mar de Keluotuo - que poderá ser a Baía de Hudson.
  • Na Europa apenas a França é nomeada... enquanto que na zona ibérica é escrito "mais de 30 reinos", podendo referir-se a toda a Europa! Parece ainda haver uma confusão entre o Mar Negro e o Cáspio (o que não nos surpreende).
  • A Líbia é a África, e na zona do Atlas é colocada a legenda "montanhas mais altas da Terra"
  • A sul, a Magellania refere já a confusão de concatenação da Austrália com a a Antártida - de um lado fala-se em "terra de papagaios", e do outro na Terra do Fogo e "picos brancos". A legenda dirá ainda que "poucos teriam chegado a essas paragens a sul".
Se o outro mapa tem a clara marca do cartógrafo ocidental (Giulio Aleni), neste mapa reflectem-se mais as influências na concepção e nomenclatura, especialmente pela referência a Magalhães. Não se parece notar nenhuma cartografia própria dos chineses, mantendo as mesmas restrições/mitos ocidentais, especialmente sobre a parte sul na "Magellania". O "mar gelado" aparece apenas mencionado a norte do Canadá...

Sendo expectável que os chineses tivessem conhecimento, pelas grandes navegações que teriam feito, de outras paragens, como por exemplo a Austrália, estes mapas mostram uma grande sintonia no que era transmitido a Ocidente e a Oriente(*)... sugerindo a existência de uma única ordem global dominante!

Nota:
(*) Esta concepção restritiva é ainda visível em mapas coreanos, mesmo do séc. XIX.

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publicado às 09:34

Seres e DaQin

08.07.11
Tendo mencionado os Seres, designação que os Romanos usariam para os Chineses, é interessante notar que em português o significado de "seres" adequa-se ainda hoje a uma noção abstracta para um povo indefinido.
A grande vantagem da wikipedia é a partilha de conhecimento ainda pelo outro lado... e assim podemos chegar ao contraponto - os Chineses designariam o império Romano por DaQin, e a visão do mundo pelo lado chinês, seria representada num mapa denominado Sihai Huayi Zongtu, em que colocámos algumas legendas, para dar seguimento à ideia de que o Oceano Ocidental para os chineses seria definido pela extensão do Mar Cáspio, conforma mapa já apresentado
Mapa Sihai Huayi Zongtu e o mapa com o Cáspio enquanto mar.

Apesar de estar datado para o Séc. XVI, o mapa chinês ao referir a designação DaQin aponta claramente para tempos de memória do contacto com o outro império, o Qin ocidental, o DaQin.

Pela extensão de água que se prolongaria do Mar Cáspio até à Sibéria, justifica-se que Da Qin, o império Romano, fosse considerado para além do Oceano Ocidental, o prolongamento do Cáspio. Apesar de estar representado um oceano circundante, notamos que sem uma efectiva visita por territórios já dominados por Romanos e Partos-persas, seria delicada a confirmação da ligação terrestre feita apenas na zona persa.

É reportada a especial embaixada de Zhang Qian às zonas ocidentais logo no Séc II a.C., no início da dinastia Han. Na wikipedia é ainda referida a descrição do historiador romano Florus no tempo de Augusto:
Even the rest of the nations of the world which were not subject to the imperial sway were sensible of its grandeur, and looked with reverence to the Roman people, the great conqueror of nations. Thus even Scythians and Sarmatians sent envoys to seek the friendship of Rome. Nay, the Seres came likewise, and the Indians who dwelt beneath the vertical sun, bringing presents of precious stones and pearls and elephants, but thinking all of less moment than the vastness of the journey which they had undertaken, and which they said had occupied four years. In truth it needed but to look at their complexion to see that they were people of another world than ours.
A última frase "... para ver que eram povos de um mundo diferente do nosso" aplica-se não só aos Seres, mas também aos Indianos, Citas, Sarmácios. A jornada de algumas embaixadas teria chegado a durar quatro anos.

Um ponto que já tinha merecido a nossa atenção, e que volta a estar presente neste excerto, é a importância que era dada aos indianos que "habitavam zonas debaixo do Sol vertical". A inexistência de sombra que podia ocorrer nestas paragens era considerada como algo excêntrico. 
Ora, estando a India bem acima da linha equatorial, esta observação só faz sentido como referência à linha definindo o Trópico de Cancer... ou seja, conforme já mencionámos é possível que na época de Augusto este Trópico estivesse bem abaixo do ponto actual, abaixo da conhecida Arabia Felix e acima do sul da India... ou seja, perto dos 10º de latitude.

Catigara vietnamita
Nas referências às paragens orientais, aparece Catigara (ou Kattigara), enquanto o porto mais oriental do Mar Índico, e que já foi identificado com a zona do Delta de Mekong, mais propriamente com Oc Eo
O Vietname tem uma particularidade interessante que é ser praticamente o único país asiático que adoptou o alfabeto latino (ver colocação no mapa dos alfabetos), supostamente por influência dos missionários portugueses no Séc. XVI e XVII. É aliás no Delta de Mekong, na zona de Catigara, que Camões teria salvo a nado os seus Lusíadas!
Aparentemente terão sido recuperados achados romanos nessa zona do Delta do Mekong... o que pode dar um significado bem mais antigo à presença do alfabeto latino nessas paragens! Teria sido depois disfarçado pela presença e influência europeia posterior...

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publicado às 07:54

Seres e DaQin

08.07.11
Tendo mencionado os Seres, designação que os Romanos usariam para os Chineses, é interessante notar que em português o significado de "seres" adequa-se ainda hoje a uma noção abstracta para um povo indefinido.
A grande vantagem da wikipedia é a partilha de conhecimento ainda pelo outro lado... e assim podemos chegar ao contraponto - os Chineses designariam o império Romano por DaQin, e a visão do mundo pelo lado chinês, seria representada num mapa denominado Sihai Huayi Zongtu, em que colocámos algumas legendas, para dar seguimento à ideia de que o Oceano Ocidental para os chineses seria definido pela extensão do Mar Cáspio, conforma mapa já apresentado
Mapa Sihai Huayi Zongtu e o mapa com o Cáspio enquanto mar.

Apesar de estar datado para o Séc. XVI, o mapa chinês ao referir a designação DaQin aponta claramente para tempos de memória do contacto com o outro império, o Qin ocidental, o DaQin.

Pela extensão de água que se prolongaria do Mar Cáspio até à Sibéria, justifica-se que Da Qin, o império Romano, fosse considerado para além do Oceano Ocidental, o prolongamento do Cáspio. Apesar de estar representado um oceano circundante, notamos que sem uma efectiva visita por territórios já dominados por Romanos e Partos-persas, seria delicada a confirmação da ligação terrestre feita apenas na zona persa.

É reportada a especial embaixada de Zhang Qian às zonas ocidentais logo no Séc II a.C., no início da dinastia Han. Na wikipedia é ainda referida a descrição do historiador romano Florus no tempo de Augusto:
Even the rest of the nations of the world which were not subject to the imperial sway were sensible of its grandeur, and looked with reverence to the Roman people, the great conqueror of nations. Thus even Scythians and Sarmatians sent envoys to seek the friendship of Rome. Nay, the Seres came likewise, and the Indians who dwelt beneath the vertical sun, bringing presents of precious stones and pearls and elephants, but thinking all of less moment than the vastness of the journey which they had undertaken, and which they said had occupied four years. In truth it needed but to look at their complexion to see that they were people of another world than ours.
A última frase "... para ver que eram povos de um mundo diferente do nosso" aplica-se não só aos Seres, mas também aos Indianos, Citas, Sarmácios. A jornada de algumas embaixadas teria chegado a durar quatro anos.

Um ponto que já tinha merecido a nossa atenção, e que volta a estar presente neste excerto, é a importância que era dada aos indianos que "habitavam zonas debaixo do Sol vertical". A inexistência de sombra que podia ocorrer nestas paragens era considerada como algo excêntrico. 
Ora, estando a India bem acima da linha equatorial, esta observação só faz sentido como referência à linha definindo o Trópico de Cancer... ou seja, conforme já mencionámos é possível que na época de Augusto este Trópico estivesse bem abaixo do ponto actual, abaixo da conhecida Arabia Felix e acima do sul da India... ou seja, perto dos 10º de latitude.

Catigara vietnamita
Nas referências às paragens orientais, aparece Catigara (ou Kattigara), enquanto o porto mais oriental do Mar Índico, e que já foi identificado com a zona do Delta de Mekong, mais propriamente com Oc Eo
O Vietname tem uma particularidade interessante que é ser praticamente o único país asiático que adoptou o alfabeto latino (ver colocação no mapa dos alfabetos), supostamente por influência dos missionários portugueses no Séc. XVI e XVII. É aliás no Delta de Mekong, na zona de Catigara, que Camões teria salvo a nado os seus Lusíadas!
Aparentemente terão sido recuperados achados romanos nessa zona do Delta do Mekong... o que pode dar um significado bem mais antigo à presença do alfabeto latino nessas paragens! Teria sido depois disfarçado pela presença e influência europeia posterior...

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publicado às 07:54

Pelo lado chinês, encontramos uma versão sínica de um mapa muito semelhante ao Theatrum Mundi de Lavanha, ou de Ortélio, denominada Wanguo Quantu, e datada c. 1620:
Wanguo Quantu, mapa do jesuíta Giulio Aleni (c. 1620)

É justificado o mapa pela colocação central do Império do Meio, evitando assim a tradicional colocação europeia nessa posição central. Podemos ver que os chineses não pareciam ter problemas em aceitar um mapa que evidenciasse o Estreito de Anian (dito de Bering), ao contrário do que foi depois referido por Carvalho da Costa (ver texto sobre Nova Zimla). Aliás o contorno americano, ou da costa russa, parece reflectir o conhecimento geral dessa zona, tal como já tinha sido verificado nos outros "theatrum mundi".

Antes, teria aparecido no tratado Sancai Tuhui um outro mapa, o Shanhai Yudi Quantu (1606, com base em Matteo Ricci), que mostrava uma concepção mais próxima dos primeiros mapas europeus do Séc. XVI (como o de Waldseemuller):
Mapa Shanhai Yudi Quantu (1606), aqui com tradução de Roderich Ptak.

Na tradução deste mapa é possível ver algumas legendas curiosas:
  • Um Mar Vermelho "oriental" na península californiana, conforme mencionado aqui nos Sinais Vermelhos e anteriormente. Aparece também o habitual Mar Vermelho "ocidental" na África.
  • Yawaima - no noroeste americano, que corresponderia à zona de Fusang (o nome Yawai pode sugerir alguma conexão a Hawai).
  • Mar de Keluotuo - que poderá ser a Baía de Hudson.
  • Na Europa apenas a França é nomeada... enquanto que na zona ibérica é escrito "mais de 30 reinos", podendo referir-se a toda a Europa! Parece ainda haver uma confusão entre o Mar Negro e o Cáspio (o que não nos surpreende).
  • A Líbia é a África, e na zona do Atlas é colocada a legenda "montanhas mais altas da Terra"
  • A sul, a Magellania refere já a confusão de concatenação da Austrália com a a Antártida - de um lado fala-se em "terra de papagaios", e do outro na Terra do Fogo e "picos brancos". A legenda dirá ainda que "poucos teriam chegado a essas paragens a sul".
Se o outro mapa tem a clara marca do cartógrafo ocidental (Giulio Aleni), neste mapa reflectem-se mais as influências na concepção e nomenclatura, especialmente pela referência a Magalhães. Não se parece notar nenhuma cartografia própria dos chineses, mantendo as mesmas restrições/mitos ocidentais, especialmente sobre a parte sul na "Magellania". O "mar gelado" aparece apenas mencionado a norte do Canadá...

Sendo expectável que os chineses tivessem conhecimento, pelas grandes navegações que teriam feito, de outras paragens, como por exemplo a Austrália, estes mapas mostram uma grande sintonia no que era transmitido a Ocidente e a Oriente(*)... sugerindo a existência de uma única ordem global dominante!

Nota:
(*) Esta concepção restritiva é ainda visível em mapas coreanos, mesmo do séc. XIX.

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