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Num comentário recente, a Maria da Fonte mencionou o Manuscrito 512, da Biblioteca Nacional brasileira, onde se descreve a descoberta de "uma oculta e grande povoação antiquíssima" no interior brasileiro.
... última página do Manuscrito 512, que se transcreve na íntegra (em baixo).

A história envolvente é suficientemente fascinante, porque está longe de começar ou terminar com este manuscrito. O manuscrito começa por referenciar "o grande descobridor Moribeca", e ao que consta este Moribeca do Mato Grosso, meio-português, meio-índio, tornou-se uma lenda da segunda metade do Séc. XVI, pois ostentaria grande riqueza de ouro e prata, tendo levado "a expedições portuguesas com 1400 homens que desapareceram na selva"...
Esta é a parte anterior ao manuscrito, que faz referência a Moribeca, e a parte posterior continua especialmente com as expedições amazónicas do Coronel Percy Fawcett, que se vai basear no Manuscrito 512. Em 1925, na sua 9ª exploração, perde-se definitivamente na selva amazónica.
A cidade perdida, a que Fawcett chamou "Lost City of Z", foi nome de um livro de 2009, e de um filme por estrear (previsto para 2015), .

Desconhecia o assunto, mas lendo o relato notei seguinte a passagem:
  • "Três dias caminhamos rio abaixo, e topamos uma catadupa de tanto estrondo pela força das águas, e resistência no lugar, que julgámos não faria maior as bocas do decantado Nilo: depois deste salto espraia de sorte o rio, que parece o grande Oceano"...

Os rios em questão são denominados Pará-oaçú e Uná, e não fora a referência ao sertão da Bahia (quantos baías e "lagoas de patos" há no Brasil?), e esta descrição assentaria melhor noutros rios: 
- Paraná-Igoaçú. e nas famosas Quedas do Iguaçu,

Acontece que a região sul do Brasil ficou conhecida pelas missões jesuítas abandonadas:
Quedas do Iguaçu (azul), e as missões jesuítas: S. Miguel Arcanjo e S. Ignacio Mini

São bem conhecidas algumas imagens destas duas missões jesuítas (que fazem parte de um conjunto UNESCO das missões jesuítas em território Guarani).
 Ruínas da Missão de S. Ignacio Mini - Argentina (wikipedia)
Ruínas da Missão de S. Miguel Arcanjo - Brasil (panoramio)

Qual a relação entre estas missões jesuítas abandonadas e as cidades perdidas?
Aparentemente, nenhuma.
Se as ruínas da Missão de S. Miguel Arcanjo dão de facto ideia de uma igreja (mas dir-se-ia mais de uma igreja ou edifício romano, nos tempos finais da Roma Imperial...), onde estão os traços tão identificadores de que era uma igreja ao tempo do barroco?

O que dizer então das ruínas da missão de S. Ignacio Menor? 
Há algum vestígio de sinal cristão, sem ser uma placa que aparece distintamente (e dir-se-à talvez recentemente...) esculpida na parede. Quem são os dois personagens que ladeiam a entrada?
Pois, não encontramos resposta a esta questão.

Portanto, aquilo que nos pode parecer é que há um momento em 1753 onde se revela no Rio de Janeiro a existência de uma cidade perdida com ouro... cuja descrição em muito se parece com a que vemos em S. Ignacio, até pela circundante com os caudalosos rios e a estrondosa cascata.  
Chegada essa notícia, tornava-se inevitável resolver o problema destes vestígios... como?
Já sabemos que o terramoto de 1755 serviu para esconder documentação, mas em 1759, surge a ordem pombalina de abandonar as missões jesuítas. A mesma ordem é dada depois pelo lado espanhol e os exércitos ibéricos, rivais naquele território, ficam juntos contra os Guaranis que estranhamente lutavam pelos estabelecimentos jesuítas. 
Onde havia outros estabelecimentos de construção semelhante no Brasil, ou na Argentina? 
Não se conhece. 
Aparentemente só houve interesse jesuíta em fazer grandiosas construções de pedra, anacrónicas, ali, junto aos Guaranis, entre Brasil, Argentina e Bolívia.

Já falámos aqui dos relatos de Candido Costa sobre achados greco-macedónios na zona vizinha de Montevideu, em Dores. 
Não é difícil pensar noutra história... podia haver missões jesuítas na zona, sem dúvida, mas também podemos pensar em que o abandono reportado fosse outro... muito mais antigo, onde as árvores arranjaram maneira de crescer por entre os muros desaparecidos. Aquelas construções têm poucas ou nenhumas referências católicas, tão características da época barroca. Afinal, as que existem podem bem ter sido colocadas posteriormente. O que os guaranis quiseram preservar pode ter sido a memória antiga do lugar, que iria ser lapidada com mais um cinzel do Marquês.

As referências à Bahia apontaram sempre para a zona da Chapada Diamantina, e terá sido aí que se perderia o Coronel Fawcett. Porém, como bem se sabe, não há melhor maneira de esconder um registo do que deixá-lo bem visível e chamar-lhe outra coisa. Poderá ter sido esse o caso de cidades perdidas, atestando presenças greco-romanas, e que passaram depois por ser ruínas de missões recentes.

Fica apenas a hipótese, e também um trabalho de Diomário de Paula Filho
Manuscrito 512 (Dossiê do manuscrito encontrado na Biblioteca Nacional-RJ)

que segue na linha da hipótese de Schwennhagen sobre o domínio atlântico (dos atlantes), e vai depois estabelecer nexos interessantes. Saliento que encontra um nexo entre a escultura descrita e uma escultura romana:

Diz a este propósito:
Com respeito a esta estátua há pouco tempo tive a oportunidade de visitar o Museu de Belas-Artes no Rio de Janeiro e vi uma escultura praticamente idêntica a esta. Representava uma pessoa de pouca idade sem barba coroada de louro e atravessada por uma banda. Escultura feita por sinal em mármore. Dizia a plaqueta abaixo: "desenterrada nos arredores de Roma em escavação realizada a custeio da princesa Isabel".
Portanto, já se sabe como foram para esculturas romanas ao Brasil... outro caso conhecido é o da coluna romana em Natal, oferecida por Mussolini...


Deixo de seguida o texto transcrito do Manuscrito 512.


MANUSCRITO 512

Relação histórica de uma oculta, e grande povoação antiquíssima sem moradores, que se descobriu no ano de 1753. 
Em a America ................. 
nos interiores .................. 
contiguo aos .................... 
Mestre de cam ................. 
e sua comitiva, havendo dez anos de que viajava pelos sertões, a ver se descobria as decantadas minas de Prata do grande descobridor Moribeca, que por culpa de um Governador se não fizeram patentes, pois queria usurpar-lhe esta glória e o teve preso na Bahia até morrer, e ficaram por descobrir: 
Veio esta noticia ao Rio de Janeiro em principio do anno de 1754. 

Depois de uma longa, e inoportuna peregrinação, incitados da insaciável cobiça de ouro, e quase perdidos em muitos anos por este vastíssimo sertão, descobrimos uma cordilheira de montes tão elevados, que parecia chegavam à região etérea, e que serviram de trono ao vento às mesmas estrelas; o luzimento que de longe se admirava, principalmente quando o sol fazia impressão ao cristal de que era composta e formando uma vista tão grande e agradável, que ninguém daqueles reflexos podia afastar os olhos: entrou a chover antes de entrarmos a registar esta cristalina maravilha e víamos sobre a pedra escalvada correr as águas precipitando-se dos altos rochedos, parecendo-nos como a neve, ferida dos raios do sol, pelas admiráveis vistas daquele ............. uina se reluziria 
............. 
das aguas e tranquilidade do tempo nos resolvemos a investigar aquele admirável prodígio da natureza, chegando-nos no pé dos Montes, sem embaraço algum de matos ou rios, que nos dificultasse o trânsito, porém, circulando as montanhas, não achamos passo franco para executarmos a resolução de acometermos estes Alpes e Pyrineos Brasílicos, resultando-nos deste desengano uma inexplicável tristeza.

Abarracados nós, e com o desígnio de retrocedermos no dia seguinte, sucedeu correr um negro, andando à lenha, a um veado branco, que viu, e descobrir por este acaso o caminho entre duas serras, que pareciam cortadas por artificio, e não pela Natureza: com o alvoroço desta novidade principiamos a subir, achando muita pedra solta, e amontoada por onde julgamos ser calçada desfeita com a continuação do tempo. Gastámos boas três horas na subida, porém suave pelos cristais que admirávamos, e no cume do monte, fizemos alto, do qual estendendo a vista, vimos em um campo raso maiores demonstrações para a nossa admiração.

Divisamos cousa de légua e meia uma Povoação grande, persuadindo-nos pelo dilatado da figura ser alguma cidade da Corte do Brazil: descemos logo ao valle com a cautela
................ seria em semelhante caso, mandando explorar
................ gar a qualidade, e ...........
............... se bem que repararam ................. fuminés, sendo este um dos signais evidentes das povoações.

Estivemos dois dias esperando aos exploradores para o fim que muito desejávamos, e só ouvíamos cantar galos para ajuizar que havia ali povoadores, até que chegaram os nossos desenganados de que não havia moradores, ficando todos confusos: Resolveu-se depois um índio da nossa comitiva a entrar a todo risco, e com precaução; mas tornando assombrado, afirmou não achar, nem descobrir rasto de pessoa alguma : este caso nos fez confundir de sorte, que não o acreditamos pelo que víamos de domicílios, e assim se arranjaram todos os exploradores a ir seguindo os passos do índio.

Vieram, confirmando o referido depoimento de não haver povo, e assim nos determinámos todos a entrar com armas por esta povoação, em uma madrugada, sem haver quem nos saísse ao encontro a impedir os passos, e não achamos outro caminho senão o único que tem a grande povoação, cuja entrada é por três arcos de grande altura, o do meio é maior, e os dois dos lados são mais pequenos: sobre o grande, e principal devisámos letras, que se não poderão copiar pela grande altura. 
Faz uma rua da largura dos três arcos, com casas de sobrados de uma, e outra parte, com as fronteiras de pedra lavrada, e já denegrida; so-......... inscrições, abertas todas ............. ortas são baixas de fei- .................. nas, notando que pela regularidade, e simetria em que estão feitas, parece uma só propriedade de casas, sendo em realidade muitas, e algumas com seus terrados descobertos e sem telha, porque os tectos são de ladrilho requeimado uns, e de lajes outros.

Corremos com bastante pavor algumas casas, e em nenhuma achamos vestígios de alfaias, nem móveis, que pudéssemos pelo uso, e trato, conhecer a qualidade dos naturais: as casas são todas escuras no interior, e apenas tem uma escassa luz, e como são abóbadas, ressoavam os ecos dos que falavam, e as mesmas vozes atemorizavam.
Passada, e vista a rua de bom comprimento, demos em uma praça regular, e no meio dela uma coluna de pedra preta de grandeza extraordinária, e sobre ela uma estátua de homem ordinário, com uma mão na ilharga esquerda, e o braço direito estendido, mostrando com o dedo index ao Polo do Norte: em cada canto da dita praça está uma agulha a imitação das que usavam os Romanos, e mais algumas já maltratadas, e partidas, como feridas de alguns raios.

Pelo lado direito desta praça está um soberbo edifício, como casa principal de algum senhor da terra, faz um grande salão na entrada e ainda com medo não corremos todas as ca..... , sendo tantas, e o retr......... zeram formar algum........... mara achamos um ............... massa de extraordinária .............. pessoas lhe custavam a levantá-la.
Os morcegos eram tantos, que investiam as caras das gentes, e faziam uma tal bulha, que admirava: sobre o pórtico principal da rua está uma figura de meio relevo talhada da mesma pedra e despida da cintura para cima, coroada de louro: representa pessoa de pouca idade, sem barba, com uma banda atravessada, e um fraldelim pela cintura: debaixo do escudo da tal figura tem alguns caracteres já gastos com o tempo, divisam-se porém os seguintes:

[Imagem 1]

Da parte esquerda da dita praça está outro edifício totalmente arruinado, e pelos vestígios bem mostra que foi Templo, porque ainda conserva parte de seu magnífico frontespício, e algumas naves de pedra inteira: ocupa grande território, e nas suas arruinadas paredes, se vêem obras de primor com algumas figuras e retratos embutidos na pedra com cruzes de vários feitios, corvos, e outras miudezas que carecem de largo tempo para descrevê-las.

Segue-se a este edifício uma grande parte de povoação toda arruinada e sepultada em grandes, e medonhas aberturas da terra, sem que em toda esta circunferência se veja erva, árvore, ou planta produzida pela natureza, mas sim montões de pedra, umas toscas outras lavradas, pelo que entendemos ..........verção, porque ainda entre .............da de cadáveres, que 
.............e parte desta infeliz ............da, e desamparada, ...........talvez por algum terremoto.

Defronte da dita praça corre arrebatadamente um caudaloso rio largo, e espaçoso com algumas margens, que o fazem muito agradável à vista: terá de largura onze, até doze braças, sem voltas consideráveis, limpas as margens de arvoredo, e troncos, que as inundações costumam trazer: sondamos a sua altura, e achamos nas partes mais profundas quinze, até dezasseis braças. Da parte d'além tudo são campos muito viçosos, e com tanta variedade de flores, que parece entoar a Natureza, mais cuidadosa por estas partes, fazendo produzir os mais mimosos campos de Flora: admiramos também algumas lagoas todas cheias de arroz: do qual nos aproveitamos e também dos inumeráveis bandos de patos que se criam na fertilidade destes campos, sem nos ser difícil caçá-los sem chumbo mas sim às mãos.

Três dias caminhamos rio abaixo, e topamos uma catadupa de tanto estrondo pela força das águas, e resistência no lugar, que julgámos não faria maior as bocas do decantado Nilo: depois deste salto espraia de sorte o rio, que parece o grande Oceano: É todo cheio de penínsulas, cobertas de verde relva: com algumas árvores dispersas, que fazem 
............. 
davel. Aqui achamos.............. 
a falta delle de noss............... ta variedade de caça..................... 
tros muitos animais criados sem caçadores que os corram, e os persigam.

Da parte do oriente desta catadupa achamos vários sub-cavões, e medonhas covas, fazendo-se experiência de sua profundidade com muitas cordas; as quais por mais compridas que fossem, nunca podemos topar com o seu centro. Achamos também algumas pedras soltas, e na superfície da terra, cravadas de prata, como tiradas das minas, deixadas no tempo.
Entre estas furnas vimos uma coberta com uma grande laje, e com as seguintes figuras lavradas na mesma pedra, que insinuam grande mistério ao que parece
[Imagem 2]

Sobre o pórtico do templo vimos outras da forma seguinte designadas
[Imagem 3]

Afastado da povoação, tiro de canhão, está um edificio, como casa de campo, de duzentos e cinquenta passos de frente; pelo qual se entra por um grande pórtico, e se sobe, por uma escada de pedra de varias cores, dando-se logo em uma grande sala, e depois desta em quinze casas pequenas todas com portas para a dita sala, e cada uma sobre si, e com sua bica de água
................. a qual água se ajunta 
................mão no pateo exter 
................ columnatas em cir- 
...............ra quadrados por artifício, suspensa com os seguintes caracteres:
[Imagem 4]

Depois destas admirações entrámos pelas margens do Rio a fazer experiência de descobrir ouro e sem trabalho achámos boa pinta na superfície da terra, prometendo-nos muita grandeza, assim de ouro, como de prata: admirámos o ser deixada esta povoação dos que a habitavam, não tendo achado a nossa exacta diligência por estes sertões pessoa alguma, que nos conte desta deplorável maravilha de quem fosse esta povoação, mostrando bem nas suas ruínas a figura, de grandeza que teria, e como seria populosa, e opulenta nos séculos em que floresceu povoada; estando hoje habitada de andorinhas, morcegos, ratos e raposas que cebadas na muita criação de galinhas, e patos, se fazem maiores que um cão perdigueiro. Os ratos têm as pernas tão curtas que saltam como pulgas e não andam nem correm como os de povoado.

Daqui deste lugar se apartou um companheiro, o qual com outros mais, depois de nove dias de boa marcha avistaram a beira de uma grande enseada que faz um rio a uma canoa com duas pessoas brancas, e de cabelos pretos, e soltos, vestidos à Europeia, ....... um tiro como sinal para se ver.............. para fugirem. Ter
.............. felpudos e bravos, ................ ga a eles se encrespam todos e investem.

Um nosso companheiro chamado João António achou em as ruínas de um casa um dinheiro de ouro, figura esférica, maior que as nossas moedas de seis mil e quatrocentos: de uma parte com a imagem, ou figura de um moço posto de joelhos, e da outra parte um arco, uma coroa e uma seta, de cujo género não duvidamos se ache muito na dita povoação, ou cidade desolada, por que se foi subversão por algum terremoto, não daria tempo o repente a por em recato o precioso, mas é necessário um braço muito forte, e poderoso para revolver aquele entulho calçado de tantos anos como mostra.

Estas noticias mando a Vm., deste sertão da Bahia, e dos rios Pará-oaçú, Uná, assentando não darmos parte a pessoa alguma, porque julgamos se despovoarão vilas, e arraiais; mas eu a Vm. a dou das minas que temos descoberto, lembrando do muito que lhe devo.
Suposto que da nossa companhia saiu já um companheiro com pretexto diferente, contudo peço a Vm. largue essas penúrias e venha utilizar-se destas grandezas, usando da industria de peitar esse Indio, para se fazer perdido, e conduzir a Vm. para estes tesouros, etc.
..............
..............charão nas entradas 
.............. sobre lajes
..............
[Imagem 5]



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publicado às 21:23

Num comentário recente, a Maria da Fonte mencionou o Manuscrito 512, da Biblioteca Nacional brasileira, onde se descreve a descoberta de "uma oculta e grande povoação antiquíssima" no interior brasileiro.
... última página do Manuscrito 512, que se transcreve na íntegra (em baixo).

A história envolvente é suficientemente fascinante, porque está longe de começar ou terminar com este manuscrito. O manuscrito começa por referenciar "o grande descobridor Moribeca", e ao que consta este Moribeca do Mato Grosso, meio-português, meio-índio, tornou-se uma lenda da segunda metade do Séc. XVI, pois ostentaria grande riqueza de ouro e prata, tendo levado "a expedições portuguesas com 1400 homens que desapareceram na selva"...
Esta é a parte anterior ao manuscrito, que faz referência a Moribeca, e a parte posterior continua especialmente com as expedições amazónicas do Coronel Percy Fawcett, que se vai basear no Manuscrito 512. Em 1925, na sua 9ª exploração, perde-se definitivamente na selva amazónica.
A cidade perdida, a que Fawcett chamou "Lost City of Z", foi nome de um livro de 2009, e de um filme por estrear (previsto para 2015), .

Desconhecia o assunto, mas lendo o relato notei seguinte a passagem:
  • "Três dias caminhamos rio abaixo, e topamos uma catadupa de tanto estrondo pela força das águas, e resistência no lugar, que julgámos não faria maior as bocas do decantado Nilo: depois deste salto espraia de sorte o rio, que parece o grande Oceano"...

Os rios em questão são denominados Pará-oaçú e Uná, e não fora a referência ao sertão da Bahia (quantos baías e "lagoas de patos" há no Brasil?), e esta descrição assentaria melhor noutros rios: 
- Paraná-Igoaçú. e nas famosas Quedas do Iguaçu,

Acontece que a região sul do Brasil ficou conhecida pelas missões jesuítas abandonadas:
Quedas do Iguaçu (azul), e as missões jesuítas: S. Miguel Arcanjo e S. Ignacio Mini

São bem conhecidas algumas imagens destas duas missões jesuítas (que fazem parte de um conjunto UNESCO das missões jesuítas em território Guarani).
 Ruínas da Missão de S. Ignacio Mini - Argentina (wikipedia)
Ruínas da Missão de S. Miguel Arcanjo - Brasil (panoramio)

Qual a relação entre estas missões jesuítas abandonadas e as cidades perdidas?
Aparentemente, nenhuma.
Se as ruínas da Missão de S. Miguel Arcanjo dão de facto ideia de uma igreja (mas dir-se-ia mais de uma igreja ou edifício romano, nos tempos finais da Roma Imperial...), onde estão os traços tão identificadores de que era uma igreja ao tempo do barroco?

O que dizer então das ruínas da missão de S. Ignacio Menor? 
Há algum vestígio de sinal cristão, sem ser uma placa que aparece distintamente (e dir-se-à talvez recentemente...) esculpida na parede. Quem são os dois personagens que ladeiam a entrada?
Pois, não encontramos resposta a esta questão.

Portanto, aquilo que nos pode parecer é que há um momento em 1753 onde se revela no Rio de Janeiro a existência de uma cidade perdida com ouro... cuja descrição em muito se parece com a que vemos em S. Ignacio, até pela circundante com os caudalosos rios e a estrondosa cascata.  
Chegada essa notícia, tornava-se inevitável resolver o problema destes vestígios... como?
Já sabemos que o terramoto de 1755 serviu para esconder documentação, mas em 1759, surge a ordem pombalina de abandonar as missões jesuítas. A mesma ordem é dada depois pelo lado espanhol e os exércitos ibéricos, rivais naquele território, ficam juntos contra os Guaranis que estranhamente lutavam pelos estabelecimentos jesuítas. 
Onde havia outros estabelecimentos de construção semelhante no Brasil, ou na Argentina? 
Não se conhece. 
Aparentemente só houve interesse jesuíta em fazer grandiosas construções de pedra, anacrónicas, ali, junto aos Guaranis, entre Brasil, Argentina e Bolívia.

Já falámos aqui dos relatos de Candido Costa sobre achados greco-macedónios na zona vizinha de Montevideu, em Dores. 
Não é difícil pensar noutra história... podia haver missões jesuítas na zona, sem dúvida, mas também podemos pensar em que o abandono reportado fosse outro... muito mais antigo, onde as árvores arranjaram maneira de crescer por entre os muros desaparecidos. Aquelas construções têm poucas ou nenhumas referências católicas, tão características da época barroca. Afinal, as que existem podem bem ter sido colocadas posteriormente. O que os guaranis quiseram preservar pode ter sido a memória antiga do lugar, que iria ser lapidada com mais um cinzel do Marquês.

As referências à Bahia apontaram sempre para a zona da Chapada Diamantina, e terá sido aí que se perderia o Coronel Fawcett. Porém, como bem se sabe, não há melhor maneira de esconder um registo do que deixá-lo bem visível e chamar-lhe outra coisa. Poderá ter sido esse o caso de cidades perdidas, atestando presenças greco-romanas, e que passaram depois por ser ruínas de missões recentes.

Fica apenas a hipótese, e também um trabalho de Diomário de Paula Filho
Manuscrito 512 (Dossiê do manuscrito encontrado na Biblioteca Nacional-RJ)

que segue na linha da hipótese de Schwennhagen sobre o domínio atlântico (dos atlantes), e vai depois estabelecer nexos interessantes. Saliento que encontra um nexo entre a escultura descrita e uma escultura romana:

Diz a este propósito:
Com respeito a esta estátua há pouco tempo tive a oportunidade de visitar o Museu de Belas-Artes no Rio de Janeiro e vi uma escultura praticamente idêntica a esta. Representava uma pessoa de pouca idade sem barba coroada de louro e atravessada por uma banda. Escultura feita por sinal em mármore. Dizia a plaqueta abaixo: "desenterrada nos arredores de Roma em escavação realizada a custeio da princesa Isabel".
Portanto, já se sabe como foram para esculturas romanas ao Brasil... outro caso conhecido é o da coluna romana em Natal, oferecida por Mussolini...


Deixo de seguida o texto transcrito do Manuscrito 512.


MANUSCRITO 512

Relação histórica de uma oculta, e grande povoação antiquíssima sem moradores, que se descobriu no ano de 1753. 
Em a America ................. 
nos interiores .................. 
contiguo aos .................... 
Mestre de cam ................. 
e sua comitiva, havendo dez anos de que viajava pelos sertões, a ver se descobria as decantadas minas de Prata do grande descobridor Moribeca, que por culpa de um Governador se não fizeram patentes, pois queria usurpar-lhe esta glória e o teve preso na Bahia até morrer, e ficaram por descobrir: 
Veio esta noticia ao Rio de Janeiro em principio do anno de 1754. 

Depois de uma longa, e inoportuna peregrinação, incitados da insaciável cobiça de ouro, e quase perdidos em muitos anos por este vastíssimo sertão, descobrimos uma cordilheira de montes tão elevados, que parecia chegavam à região etérea, e que serviram de trono ao vento às mesmas estrelas; o luzimento que de longe se admirava, principalmente quando o sol fazia impressão ao cristal de que era composta e formando uma vista tão grande e agradável, que ninguém daqueles reflexos podia afastar os olhos: entrou a chover antes de entrarmos a registar esta cristalina maravilha e víamos sobre a pedra escalvada correr as águas precipitando-se dos altos rochedos, parecendo-nos como a neve, ferida dos raios do sol, pelas admiráveis vistas daquele ............. uina se reluziria 
............. 
das aguas e tranquilidade do tempo nos resolvemos a investigar aquele admirável prodígio da natureza, chegando-nos no pé dos Montes, sem embaraço algum de matos ou rios, que nos dificultasse o trânsito, porém, circulando as montanhas, não achamos passo franco para executarmos a resolução de acometermos estes Alpes e Pyrineos Brasílicos, resultando-nos deste desengano uma inexplicável tristeza.

Abarracados nós, e com o desígnio de retrocedermos no dia seguinte, sucedeu correr um negro, andando à lenha, a um veado branco, que viu, e descobrir por este acaso o caminho entre duas serras, que pareciam cortadas por artificio, e não pela Natureza: com o alvoroço desta novidade principiamos a subir, achando muita pedra solta, e amontoada por onde julgamos ser calçada desfeita com a continuação do tempo. Gastámos boas três horas na subida, porém suave pelos cristais que admirávamos, e no cume do monte, fizemos alto, do qual estendendo a vista, vimos em um campo raso maiores demonstrações para a nossa admiração.

Divisamos cousa de légua e meia uma Povoação grande, persuadindo-nos pelo dilatado da figura ser alguma cidade da Corte do Brazil: descemos logo ao valle com a cautela
................ seria em semelhante caso, mandando explorar
................ gar a qualidade, e ...........
............... se bem que repararam ................. fuminés, sendo este um dos signais evidentes das povoações.

Estivemos dois dias esperando aos exploradores para o fim que muito desejávamos, e só ouvíamos cantar galos para ajuizar que havia ali povoadores, até que chegaram os nossos desenganados de que não havia moradores, ficando todos confusos: Resolveu-se depois um índio da nossa comitiva a entrar a todo risco, e com precaução; mas tornando assombrado, afirmou não achar, nem descobrir rasto de pessoa alguma : este caso nos fez confundir de sorte, que não o acreditamos pelo que víamos de domicílios, e assim se arranjaram todos os exploradores a ir seguindo os passos do índio.

Vieram, confirmando o referido depoimento de não haver povo, e assim nos determinámos todos a entrar com armas por esta povoação, em uma madrugada, sem haver quem nos saísse ao encontro a impedir os passos, e não achamos outro caminho senão o único que tem a grande povoação, cuja entrada é por três arcos de grande altura, o do meio é maior, e os dois dos lados são mais pequenos: sobre o grande, e principal devisámos letras, que se não poderão copiar pela grande altura. 
Faz uma rua da largura dos três arcos, com casas de sobrados de uma, e outra parte, com as fronteiras de pedra lavrada, e já denegrida; so-......... inscrições, abertas todas ............. ortas são baixas de fei- .................. nas, notando que pela regularidade, e simetria em que estão feitas, parece uma só propriedade de casas, sendo em realidade muitas, e algumas com seus terrados descobertos e sem telha, porque os tectos são de ladrilho requeimado uns, e de lajes outros.

Corremos com bastante pavor algumas casas, e em nenhuma achamos vestígios de alfaias, nem móveis, que pudéssemos pelo uso, e trato, conhecer a qualidade dos naturais: as casas são todas escuras no interior, e apenas tem uma escassa luz, e como são abóbadas, ressoavam os ecos dos que falavam, e as mesmas vozes atemorizavam.
Passada, e vista a rua de bom comprimento, demos em uma praça regular, e no meio dela uma coluna de pedra preta de grandeza extraordinária, e sobre ela uma estátua de homem ordinário, com uma mão na ilharga esquerda, e o braço direito estendido, mostrando com o dedo index ao Polo do Norte: em cada canto da dita praça está uma agulha a imitação das que usavam os Romanos, e mais algumas já maltratadas, e partidas, como feridas de alguns raios.

Pelo lado direito desta praça está um soberbo edifício, como casa principal de algum senhor da terra, faz um grande salão na entrada e ainda com medo não corremos todas as ca..... , sendo tantas, e o retr......... zeram formar algum........... mara achamos um ............... massa de extraordinária .............. pessoas lhe custavam a levantá-la.
Os morcegos eram tantos, que investiam as caras das gentes, e faziam uma tal bulha, que admirava: sobre o pórtico principal da rua está uma figura de meio relevo talhada da mesma pedra e despida da cintura para cima, coroada de louro: representa pessoa de pouca idade, sem barba, com uma banda atravessada, e um fraldelim pela cintura: debaixo do escudo da tal figura tem alguns caracteres já gastos com o tempo, divisam-se porém os seguintes:

[Imagem 1]

Da parte esquerda da dita praça está outro edifício totalmente arruinado, e pelos vestígios bem mostra que foi Templo, porque ainda conserva parte de seu magnífico frontespício, e algumas naves de pedra inteira: ocupa grande território, e nas suas arruinadas paredes, se vêem obras de primor com algumas figuras e retratos embutidos na pedra com cruzes de vários feitios, corvos, e outras miudezas que carecem de largo tempo para descrevê-las.

Segue-se a este edifício uma grande parte de povoação toda arruinada e sepultada em grandes, e medonhas aberturas da terra, sem que em toda esta circunferência se veja erva, árvore, ou planta produzida pela natureza, mas sim montões de pedra, umas toscas outras lavradas, pelo que entendemos ..........verção, porque ainda entre .............da de cadáveres, que 
.............e parte desta infeliz ............da, e desamparada, ...........talvez por algum terremoto.

Defronte da dita praça corre arrebatadamente um caudaloso rio largo, e espaçoso com algumas margens, que o fazem muito agradável à vista: terá de largura onze, até doze braças, sem voltas consideráveis, limpas as margens de arvoredo, e troncos, que as inundações costumam trazer: sondamos a sua altura, e achamos nas partes mais profundas quinze, até dezasseis braças. Da parte d'além tudo são campos muito viçosos, e com tanta variedade de flores, que parece entoar a Natureza, mais cuidadosa por estas partes, fazendo produzir os mais mimosos campos de Flora: admiramos também algumas lagoas todas cheias de arroz: do qual nos aproveitamos e também dos inumeráveis bandos de patos que se criam na fertilidade destes campos, sem nos ser difícil caçá-los sem chumbo mas sim às mãos.

Três dias caminhamos rio abaixo, e topamos uma catadupa de tanto estrondo pela força das águas, e resistência no lugar, que julgámos não faria maior as bocas do decantado Nilo: depois deste salto espraia de sorte o rio, que parece o grande Oceano: É todo cheio de penínsulas, cobertas de verde relva: com algumas árvores dispersas, que fazem 
............. 
davel. Aqui achamos.............. 
a falta delle de noss............... ta variedade de caça..................... 
tros muitos animais criados sem caçadores que os corram, e os persigam.

Da parte do oriente desta catadupa achamos vários sub-cavões, e medonhas covas, fazendo-se experiência de sua profundidade com muitas cordas; as quais por mais compridas que fossem, nunca podemos topar com o seu centro. Achamos também algumas pedras soltas, e na superfície da terra, cravadas de prata, como tiradas das minas, deixadas no tempo.
Entre estas furnas vimos uma coberta com uma grande laje, e com as seguintes figuras lavradas na mesma pedra, que insinuam grande mistério ao que parece
[Imagem 2]

Sobre o pórtico do templo vimos outras da forma seguinte designadas
[Imagem 3]

Afastado da povoação, tiro de canhão, está um edificio, como casa de campo, de duzentos e cinquenta passos de frente; pelo qual se entra por um grande pórtico, e se sobe, por uma escada de pedra de varias cores, dando-se logo em uma grande sala, e depois desta em quinze casas pequenas todas com portas para a dita sala, e cada uma sobre si, e com sua bica de água
................. a qual água se ajunta 
................mão no pateo exter 
................ columnatas em cir- 
...............ra quadrados por artifício, suspensa com os seguintes caracteres:
[Imagem 4]

Depois destas admirações entrámos pelas margens do Rio a fazer experiência de descobrir ouro e sem trabalho achámos boa pinta na superfície da terra, prometendo-nos muita grandeza, assim de ouro, como de prata: admirámos o ser deixada esta povoação dos que a habitavam, não tendo achado a nossa exacta diligência por estes sertões pessoa alguma, que nos conte desta deplorável maravilha de quem fosse esta povoação, mostrando bem nas suas ruínas a figura, de grandeza que teria, e como seria populosa, e opulenta nos séculos em que floresceu povoada; estando hoje habitada de andorinhas, morcegos, ratos e raposas que cebadas na muita criação de galinhas, e patos, se fazem maiores que um cão perdigueiro. Os ratos têm as pernas tão curtas que saltam como pulgas e não andam nem correm como os de povoado.

Daqui deste lugar se apartou um companheiro, o qual com outros mais, depois de nove dias de boa marcha avistaram a beira de uma grande enseada que faz um rio a uma canoa com duas pessoas brancas, e de cabelos pretos, e soltos, vestidos à Europeia, ....... um tiro como sinal para se ver.............. para fugirem. Ter
.............. felpudos e bravos, ................ ga a eles se encrespam todos e investem.

Um nosso companheiro chamado João António achou em as ruínas de um casa um dinheiro de ouro, figura esférica, maior que as nossas moedas de seis mil e quatrocentos: de uma parte com a imagem, ou figura de um moço posto de joelhos, e da outra parte um arco, uma coroa e uma seta, de cujo género não duvidamos se ache muito na dita povoação, ou cidade desolada, por que se foi subversão por algum terremoto, não daria tempo o repente a por em recato o precioso, mas é necessário um braço muito forte, e poderoso para revolver aquele entulho calçado de tantos anos como mostra.

Estas noticias mando a Vm., deste sertão da Bahia, e dos rios Pará-oaçú, Uná, assentando não darmos parte a pessoa alguma, porque julgamos se despovoarão vilas, e arraiais; mas eu a Vm. a dou das minas que temos descoberto, lembrando do muito que lhe devo.
Suposto que da nossa companhia saiu já um companheiro com pretexto diferente, contudo peço a Vm. largue essas penúrias e venha utilizar-se destas grandezas, usando da industria de peitar esse Indio, para se fazer perdido, e conduzir a Vm. para estes tesouros, etc.
..............
..............charão nas entradas 
.............. sobre lajes
..............
[Imagem 5]



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publicado às 21:23

Este texto é subsidiário dos Tonantes, tal como foram Galos, Temor, e Gaiola, textos que se seguiram.
Quando se pega por uma ponta do novelo, surgem muitas pontas soltas, e nem sempre é fácil ligá-las. O ponto de ligação que me parece existir neste caso é a da evidência de uma sociedade muito antiga, violenta nos costumes e modos, com uma forte componente marítima que se evidenciou na pesca do atum.

Almadraba é o nome de uma técnica de pesca de atum, ancestral, cujo "espectáculo" associado levou a outro nome apropriado - "Matanza". O termo hispânico é mais usado para porcos, mas aqui ganha um significado mais brutal, independentemente da ligação do atum a bácoro-do-mar, seja ou não pelo nome da espécie Albacora (conforme apontou o Bartolomeu).

Os atuns atlânticos têm uma rota de migração que os leva do Oceano Ártico até ao Golfo do México ou, em alternativa, ao Mar Mediterrâneo. O azar dos muitos atuns que decidiam entrar no Mediterrâneo estava traçado nas Colunas de Hércules. Um conjunto de redes antecipava a passagem, permitindo a captura de uma grande quantidade de atuns. Eram depois puxados à superfície, dando-se início à matanza...
Tradição da Almadraba, ainda hoje na Sicília, e na Sardenha (Nat Geog).

No final da matanza, o mar em redor bem se poderá chamar mar vermelho... afinal uma designação antiga, aplicada à saída das Colunas de Hércules, as águas e ilhas Eritreias que já foram aqui faladas.
É reportado que a riqueza dos Duques de Medina-Sidónia se deveria à concessão dessa captura de atum na entrada de Cadiz, desde o Séc. XII.
O atum foi ainda o peixe de referência para os pescadores algarvios.
Uma dessas comunidades piscatórias era a de Monte Gordo, cujas cabanas foram incendiadas pelo Marquês de Pombal, com o objectivo de se fixarem em Vila Real de Santo António. Como já referimos, o resultado foi uma ida para Ayamonte, para a Isla Cristina... mostrando como a emigração foi sempre uma consequência do absurdo de governação interna incompetente.

Matanza semelhante ocorre com os atuns do Pacífico, por tratamento não menos pacífico feito pelos pescadores japoneses. No Japão ocorre ainda hoje outra matança que causa maior indignação... a dos golfinhos - por exemplo, no caso da baía de Taiji.
Parece natural que este prurido relativo ao consumo de carne de golfinhos não terá ocorrido sempre, e tal como as baleias eram uma fonte de grande recompensa na sua caça, o consumo de golfinhos deverá ter ocorrido abundantemente na Europa (ainda é registado nas ilhas Faroé). No Peru os golfinhos são entendidos como porcos-do-mar (a designação porcina é assim mais geral), e há ainda uma tradição antiga nas ilhas polinésias - ilhas Kiribati e ilhas Salomão... pois!
Recordamos que já mencionámos a pesca pré-histórica do atum em Timor.

Portanto, restringir estas Almadrabas antigas aos atuns seria um aldrabar da muito provável tradição, que se alargaria aos simpáticos golfinhos.
Pôr golfinhos a golfar sangue numa baía, ou num golfo, não parece algo improvável, como indica o nome - talvez numa certa visão "do fim", ou "del fim"...

Moral e Mural
Convém notar que todo o processo de domesticação abriu uma brecha mural na nossa moral.
Os animais domésticos foram tornados quase inofensivos, pacatos, aceitando a confiança humana. Em troca foram, e vão, parar ao caldeirão.
Se estamos hoje mais escandalizados com a chacina de golfinhos é porque adquirimos essa ideia de animais inofensivos, inteligentes, e simpáticos para o homem. O mesmo tipo de sensibilidade não ocorre na matanza de atuns, porque a identificação é muito menor. Poucos peixes tiveram, ou têm, a sorte dos roazes sadinos de Tróia, mesmo sendo os golfinhos competidores no pescado.

Atributos dóceis colocaram os animais domésticos sob a mira de seres com intenções pouco pacíficas. A domesticação visou servir apenas o interesse humano.
O pastor usa o pasto para o repasto. A vítima é míope e impotente face à previsão do predador. O animal transforma o pasto verde em carne vermelha, que serve o repasto do pastor.  
De forma semelhante, um predador sem visão ecológica é vítima da sua acção irreflectida. Está preso à sobrevivência das presas, e só assim é forçado a conter a sua miopia na vocação destruidora.

No entanto, a ideia de papar os fracos, está sempre no menu da força primitiva e míope. A contenção ecológica não está adquirida, é imposta pela lógica circunstancial. Isto não ocorre apenas na ementa alimentar, onde um consumo excessivo pode levar à extinção da presa. Ocorre hoje, noutros aspectos.
Por exemplo, a redução de custos de produção, por despedimento da mão-de-obra, serve uma lógica míope localizada. Ao retirar poder de compra, a maior eficácia de produção carece depois de destinatários, pois os desempregados ficam desprovidos de capacidade financeira. A redução de custos leva a uma redução do dinheiro disponível para consumo. Seguem-se mais redução de custos e novas contracções... Localmente cada gestor é uma besta cega do contexto global, vendo apenas o contexto local. Actua exactamente como um predador que se optimizar a caça, esgota as suas presas, não se dando conta que isso o condena à extinção.

A noção de "doméstico" não se resume a animais. Os trâmites de guerra condenaram gerações intermináveis ao estatuto humano de domesticação - a escravatura. Pelos escravos nasciam escravos, e praticou-se assim uma domesticação humana, muito semelhante à animal.
A escravatura era bem aceite no Antigo Testamento, e não a vemos censurada nos novos Evangelhos. Esquecemos frequentemente que a sociedade herda como natural a sua tradição, não questionando que com tradição traz em si uma contra dicção, cega à abstracção racional.
As revoltas de escravos do Império Romano ocorreram no seu crescimento, pelo elevado número de populações sujeitas a esse fado. Porém, os escravos nascidos e educados em contexto de escravatura, dificilmente teriam capacidade de questionar a sua condição natural. A situação pode ter sido bastante pior, e não será de excluir que o papel animalesco reservado aos escravos não se tenha reduzido a serem apenas bestas de carga e trabalhos indesejados. Ou seja, dito mais claramente, não é de excluir casos em que pudessem ter feito parte do menu, sendo documentado que fizeram pelo menos parte do menu leonino em circos romanos.

Filosoficamente, gregos e romanos mostraram-se pouco sensíveis à questão da escravatura, talvez exceptuando o caso dos estóicos, que não viam inferioridade na escravatura, mas um simples capricho do destino. Dificilmente encontraremos noutros, senão nos escravos, presos pela sua efectiva impotência circunstancial, o maior desejo de liberdade. Esse desejo individual, certamente que terá passado a desejo civilizacional, procurando tornar os senhores servos do seu poder... e já aqui falámos dos eunucos.

Ilhas Egadi
Bom, mas o contexto principal que aqui interessava apontar é o desse carácter inato, selvagem, capaz de chacinar centenas de atuns num mar de sangue, sem necessidade de qualquer questão moral. Esse muro não estando bem fechado na moral, permitirá sempre uma brecha imoral para actuar com a mesma crueldade e frieza no caso humano. Não há nenhuma moral num estômago vazio, a moral só é solidificada em estômagos cheios. Um estômago vazio pode ser levado a canibalismo, a violência descontrolada. Também não há nenhuma moral num cérebro vazio, e a moral só é solidificada quando o cérebro não está faminto. O mar de sangue dos atuns serve para acalmar o estômago, mas não acalma o espírito. É fácil não ser violento quando não há necessidade de violência, o que é mais difícil é estabelecer o muro moral que separa a actuação do carniceiro, capaz de retalhar animais, mas incapaz de retalhar humanos. Não há nenhuma moral pré-estabelecida, o contexto moral que herdámos resultou apenas de uma compreensão ecológica, global, que foi decorada com outros conceitos.

Nas ilhas Egadi, na extremidade ocidental da Sicília, vemos pinturas rupestres cuja datação está atribuída entre os 10 e 5 mil anos. Trata-se praticamente do mesmo local onde se pratica ainda hoje a Almadraba, a matança de atuns. Aí, na chamada Grotta del Genovese podemos ver a talvez representação mais antiga de um golfinho, entre outros animais.
Grotta del Genovese (Ilhas Egadi, Sicília)

Muito provavelmente, a técnica da almadraba é tão antiga quanto estas pinturas rupestres, sendo tradicional a fábrica de atum Tonnara de Favignaga, mas é difícil perceber qual a moral subjacente ao mural pintado.
Havia uma cultura de despojo local, ou uma cultura de entendimento global? O que é certo é que o despojo local, a falta de entendimento moral na ecologia global, sempre se sobrepôs durante os milénios seguintes. A mais pequena brecha moral sempre permitiu abrir uma violência e barbárie descontrolada na cultura mediterrânica e ocidental.


Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 07:54

Este texto é subsidiário dos Tonantes, tal como foram Galos, Temor, e Gaiola, textos que se seguiram.
Quando se pega por uma ponta do novelo, surgem muitas pontas soltas, e nem sempre é fácil ligá-las. O ponto de ligação que me parece existir neste caso é a da evidência de uma sociedade muito antiga, violenta nos costumes e modos, com uma forte componente marítima que se evidenciou na pesca do atum.

Almadraba é o nome de uma técnica de pesca de atum, ancestral, cujo "espectáculo" associado levou a outro nome apropriado - "Matanza". O termo hispânico é mais usado para porcos, mas aqui ganha um significado mais brutal, independentemente da ligação do atum a bácoro-do-mar, seja ou não pelo nome da espécie Albacora (conforme apontou o Bartolomeu).

Os atuns atlânticos têm uma rota de migração que os leva do Oceano Ártico até ao Golfo do México ou, em alternativa, ao Mar Mediterrâneo. O azar dos muitos atuns que decidiam entrar no Mediterrâneo estava traçado nas Colunas de Hércules. Um conjunto de redes antecipava a passagem, permitindo a captura de uma grande quantidade de atuns. Eram depois puxados à superfície, dando-se início à matanza...
Tradição da Almadraba, ainda hoje na Sicília, e na Sardenha (Nat Geog).

No final da matanza, o mar em redor bem se poderá chamar mar vermelho... afinal uma designação antiga, aplicada à saída das Colunas de Hércules, as águas e ilhas Eritreias que já foram aqui faladas.
É reportado que a riqueza dos Duques de Medina-Sidónia se deveria à concessão dessa captura de atum na entrada de Cadiz, desde o Séc. XII.
O atum foi ainda o peixe de referência para os pescadores algarvios.
Uma dessas comunidades piscatórias era a de Monte Gordo, cujas cabanas foram incendiadas pelo Marquês de Pombal, com o objectivo de se fixarem em Vila Real de Santo António. Como já referimos, o resultado foi uma ida para Ayamonte, para a Isla Cristina... mostrando como a emigração foi sempre uma consequência do absurdo de governação interna incompetente.

Matanza semelhante ocorre com os atuns do Pacífico, por tratamento não menos pacífico feito pelos pescadores japoneses. No Japão ocorre ainda hoje outra matança que causa maior indignação... a dos golfinhos - por exemplo, no caso da baía de Taiji.
Parece natural que este prurido relativo ao consumo de carne de golfinhos não terá ocorrido sempre, e tal como as baleias eram uma fonte de grande recompensa na sua caça, o consumo de golfinhos deverá ter ocorrido abundantemente na Europa (ainda é registado nas ilhas Faroé). No Peru os golfinhos são entendidos como porcos-do-mar (a designação porcina é assim mais geral), e há ainda uma tradição antiga nas ilhas polinésias - ilhas Kiribati e ilhas Salomão... pois!
Recordamos que já mencionámos a pesca pré-histórica do atum em Timor.

Portanto, restringir estas Almadrabas antigas aos atuns seria um aldrabar da muito provável tradição, que se alargaria aos simpáticos golfinhos.
Pôr golfinhos a golfar sangue numa baía, ou num golfo, não parece algo improvável, como indica o nome - talvez numa certa visão "do fim", ou "del fim"...

Moral e Mural
Convém notar que todo o processo de domesticação abriu uma brecha mural na nossa moral.
Os animais domésticos foram tornados quase inofensivos, pacatos, aceitando a confiança humana. Em troca foram, e vão, parar ao caldeirão.
Se estamos hoje mais escandalizados com a chacina de golfinhos é porque adquirimos essa ideia de animais inofensivos, inteligentes, e simpáticos para o homem. O mesmo tipo de sensibilidade não ocorre na matanza de atuns, porque a identificação é muito menor. Poucos peixes tiveram, ou têm, a sorte dos roazes sadinos de Tróia, mesmo sendo os golfinhos competidores no pescado.

Atributos dóceis colocaram os animais domésticos sob a mira de seres com intenções pouco pacíficas. A domesticação visou servir apenas o interesse humano.
O pastor usa o pasto para o repasto. A vítima é míope e impotente face à previsão do predador. O animal transforma o pasto verde em carne vermelha, que serve o repasto do pastor.  
De forma semelhante, um predador sem visão ecológica é vítima da sua acção irreflectida. Está preso à sobrevivência das presas, e só assim é forçado a conter a sua miopia na vocação destruidora.

No entanto, a ideia de papar os fracos, está sempre no menu da força primitiva e míope. A contenção ecológica não está adquirida, é imposta pela lógica circunstancial. Isto não ocorre apenas na ementa alimentar, onde um consumo excessivo pode levar à extinção da presa. Ocorre hoje, noutros aspectos.
Por exemplo, a redução de custos de produção, por despedimento da mão-de-obra, serve uma lógica míope localizada. Ao retirar poder de compra, a maior eficácia de produção carece depois de destinatários, pois os desempregados ficam desprovidos de capacidade financeira. A redução de custos leva a uma redução do dinheiro disponível para consumo. Seguem-se mais redução de custos e novas contracções... Localmente cada gestor é uma besta cega do contexto global, vendo apenas o contexto local. Actua exactamente como um predador que se optimizar a caça, esgota as suas presas, não se dando conta que isso o condena à extinção.

A noção de "doméstico" não se resume a animais. Os trâmites de guerra condenaram gerações intermináveis ao estatuto humano de domesticação - a escravatura. Pelos escravos nasciam escravos, e praticou-se assim uma domesticação humana, muito semelhante à animal.
A escravatura era bem aceite no Antigo Testamento, e não a vemos censurada nos novos Evangelhos. Esquecemos frequentemente que a sociedade herda como natural a sua tradição, não questionando que com tradição traz em si uma contra dicção, cega à abstracção racional.
As revoltas de escravos do Império Romano ocorreram no seu crescimento, pelo elevado número de populações sujeitas a esse fado. Porém, os escravos nascidos e educados em contexto de escravatura, dificilmente teriam capacidade de questionar a sua condição natural. A situação pode ter sido bastante pior, e não será de excluir que o papel animalesco reservado aos escravos não se tenha reduzido a serem apenas bestas de carga e trabalhos indesejados. Ou seja, dito mais claramente, não é de excluir casos em que pudessem ter feito parte do menu, sendo documentado que fizeram pelo menos parte do menu leonino em circos romanos.

Filosoficamente, gregos e romanos mostraram-se pouco sensíveis à questão da escravatura, talvez exceptuando o caso dos estóicos, que não viam inferioridade na escravatura, mas um simples capricho do destino. Dificilmente encontraremos noutros, senão nos escravos, presos pela sua efectiva impotência circunstancial, o maior desejo de liberdade. Esse desejo individual, certamente que terá passado a desejo civilizacional, procurando tornar os senhores servos do seu poder... e já aqui falámos dos eunucos.

Ilhas Egadi
Bom, mas o contexto principal que aqui interessava apontar é o desse carácter inato, selvagem, capaz de chacinar centenas de atuns num mar de sangue, sem necessidade de qualquer questão moral. Esse muro não estando bem fechado na moral, permitirá sempre uma brecha imoral para actuar com a mesma crueldade e frieza no caso humano. Não há nenhuma moral num estômago vazio, a moral só é solidificada em estômagos cheios. Um estômago vazio pode ser levado a canibalismo, a violência descontrolada. Também não há nenhuma moral num cérebro vazio, e a moral só é solidificada quando o cérebro não está faminto. O mar de sangue dos atuns serve para acalmar o estômago, mas não acalma o espírito. É fácil não ser violento quando não há necessidade de violência, o que é mais difícil é estabelecer o muro moral que separa a actuação do carniceiro, capaz de retalhar animais, mas incapaz de retalhar humanos. Não há nenhuma moral pré-estabelecida, o contexto moral que herdámos resultou apenas de uma compreensão ecológica, global, que foi decorada com outros conceitos.

Nas ilhas Egadi, na extremidade ocidental da Sicília, vemos pinturas rupestres cuja datação está atribuída entre os 10 e 5 mil anos. Trata-se praticamente do mesmo local onde se pratica ainda hoje a Almadraba, a matança de atuns. Aí, na chamada Grotta del Genovese podemos ver a talvez representação mais antiga de um golfinho, entre outros animais.
Grotta del Genovese (Ilhas Egadi, Sicília)

Muito provavelmente, a técnica da almadraba é tão antiga quanto estas pinturas rupestres, sendo tradicional a fábrica de atum Tonnara de Favignaga, mas é difícil perceber qual a moral subjacente ao mural pintado.
Havia uma cultura de despojo local, ou uma cultura de entendimento global? O que é certo é que o despojo local, a falta de entendimento moral na ecologia global, sempre se sobrepôs durante os milénios seguintes. A mais pequena brecha moral sempre permitiu abrir uma violência e barbárie descontrolada na cultura mediterrânica e ocidental.


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publicado às 07:54

Em comentário da Maria da Fonte, somos informados do desaparecimento de Joaquim Paulo Cruz.

Quem era Paulo Cruz? - O link com que nos visitava, constante do Google+ apresentava uma imagem diferente da que fomos agora encontrar no seu facebook.
Nunca conheci o Joaquim, conheci apenas o Paulo Cruz que assinava com o bonequinho azul. Como arriscamos a que as imagens desapareçam, com eventual fecho das contas, ficam aqui para memória.
Paulo Cruz fez parte da história deste blog, por exemplo esta série "dos comentários" começou com um comentário seu:
http://alvor-silves.blogspot.pt/2014/02/dos-comentarios-1-lua-recente.html

Há um ano atrás (19 de Outubro) o Paulo Cruz começou uma série de muitos comentários que aqui deixou. Repito aqui aquilo que deixei em comentário:
A participação de Paulo Cruz neste blog teve aspectos provocatórios, fortemente contraditórios, entre outros qualificativos que dispenso. Apesar disso, foi sempre recebido com tolerância e até com bastante amizade. Isso não impediu que tivesse recebido fortes críticas, e até tivéssemos duvidado se seria pessoa ou personagem inventado. A dúvida entre saber, se era um jovem perturbado, ou um perturbador jovem, era legítima, mas sempre foi tratado com o benefício da dúvida.
Porquê? Porque era mais importante salvaguardar a compreensão a um jovem perturbado do que a resposta devida a um perturbador jovial. Foi por isso mesmo que despendi algum tempo com ele, e tive paciência de santo para muitas das suas insistências, nomeadamente em inundar os comentários com inúmeros links de filmes de horas e horas, que queria que víssemos e comentássemos.
Por isso, ainda que tivesse fortes aspectos de brincadeira, preferi entender a figura de Paulo Cruz como adaptando-se a um jovem perturbado pelas múltiplas informações onde se perdia. Nesse sentido dei-lhe inúmeras coisas para ele ler que ele nunca leu ou fez menção disso. Interessava-lhe mais que o lêssemos, que lhe déssemos razão, do que procurar ler o que escrevíamos ou respondíamos. E é claro que, por uma simples questão de honestidade, creio ser claro que não dou razão a ninguém só para "fazer um jeito". Não vejo na desonestidade simpática solução para coisa alguma.
Se este era um lado do Paulo, outro era este:
Já alguns dias que não passo por cá. Já estou com saudades vossas, de si, do José Manuel e do Sid. Peço desculpa a todos de algo que possa ter dito... Eu não sou estúpido e tenho cabeça para pensar, ando farto de trafulhices e primo pela clareza. Ao longo da minha vida tenho procurado a verdade e já estive mais longe dela do que estou actualmente. (...)
A sociedade é ensinada e treinada a ignorar e desconfiar de pessoas como o Paulo. 
Numa sociedade farsante, tudo pode ser simples farsa, e não é fácil distinguir o genuíno da fraude, especialmente num espaço tão anónimo como a internet, onde cada um pode assumir várias identidades, fazendo-as aparecer ou desaparecer a seu belo prazer.
Por isso, era fácil tomar o Paulo apenas como aquilo que ele foi para nós - um conjunto de comentários, mais ou menos caóticos. Porém, mesmo em circunstâncias tão dúbias, temos uma capacidade de empatia, e é difícil deixar de considerar a hipótese de haver uma pessoa assim, capaz de tantas instabilidades e incoerências. Foi nesse sentido que, apesar das desconfianças naturais, nunca deixei de considerar a hipótese de haver um Joaquim atrás do Paulo Cruz... e era muito mais fácil proceder de outra forma, olhando apenas para o seu bonequinho azul.

Em ambas as páginas que consultei, o Paulo deixava uma ligação à sobrinha, que certamente muito estimava, e daí julgo ter percebido que estaria bastante doente já em Setembro. 
O "Crux" que coloquei está nessa ligação familiar, e não sei se o Paulo sabia ou não que "crux" é literariamente um termo de ambiguidade, difícil ou impossível de determinar. 

No texto Inevitabilidade (1) fui encontrar este comentário dele:
Caríssimo e amigo José, fico-lhe agradecido pelas diversas advertências. Vocês não me conhecem e, acreditem ou não, eu não tenho medo da morte. "A vida é um momento de férias que a morte nos concede"... todo o homem/mulher esta morto logo a nascença, cabe-nos procurar as coisas dos céus, o Cristo, e se ele tiver misericórdia concede-nos a vida eterna. Com isto termino, se vos aparecerem e ao mundo, não tenham medo deles, eles são os anjos que as pinturas, que para ai andam, mostram que tem asinhas...essa é a fraude, juntamente com a fraude milenar... Eu e vós, penso, somos os Atlantes!
... e como as coincidências são o que são, a Maria da Fonte colocou esta notícia no último texto, que era referente a um comentário do José sobre a Atlântida.

Como aqui não estamos no mundo do facebook, onde só existe o presente e os presentes, e como Paulo Cruz já não está connosco neste presente, estas palavras da Maria da Fonte surgem como as mais apropriadas:
Os miúdos como o Paulo, não deviam morrer assim, tão novos.
É demasiado injusto.
Tenho tanta pena... 
Até um dia destes, meu caro Paulo!

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publicado às 20:24

Em comentário da Maria da Fonte, somos informados do desaparecimento de Joaquim Paulo Cruz.

Quem era Paulo Cruz? - O link com que nos visitava, constante do Google+ apresentava uma imagem diferente da que fomos agora encontrar no seu facebook.
Nunca conheci o Joaquim, conheci apenas o Paulo Cruz que assinava com o bonequinho azul. Como arriscamos a que as imagens desapareçam, com eventual fecho das contas, ficam aqui para memória.
Paulo Cruz fez parte da história deste blog, por exemplo esta série "dos comentários" começou com um comentário seu:
http://alvor-silves.blogspot.pt/2014/02/dos-comentarios-1-lua-recente.html

Há um ano atrás (19 de Outubro) o Paulo Cruz começou uma série de muitos comentários que aqui deixou. Repito aqui aquilo que deixei em comentário:
A participação de Paulo Cruz neste blog teve aspectos provocatórios, fortemente contraditórios, entre outros qualificativos que dispenso. Apesar disso, foi sempre recebido com tolerância e até com bastante amizade. Isso não impediu que tivesse recebido fortes críticas, e até tivéssemos duvidado se seria pessoa ou personagem inventado. A dúvida entre saber, se era um jovem perturbado, ou um perturbador jovem, era legítima, mas sempre foi tratado com o benefício da dúvida.
Porquê? Porque era mais importante salvaguardar a compreensão a um jovem perturbado do que a resposta devida a um perturbador jovial. Foi por isso mesmo que despendi algum tempo com ele, e tive paciência de santo para muitas das suas insistências, nomeadamente em inundar os comentários com inúmeros links de filmes de horas e horas, que queria que víssemos e comentássemos.
Por isso, ainda que tivesse fortes aspectos de brincadeira, preferi entender a figura de Paulo Cruz como adaptando-se a um jovem perturbado pelas múltiplas informações onde se perdia. Nesse sentido dei-lhe inúmeras coisas para ele ler que ele nunca leu ou fez menção disso. Interessava-lhe mais que o lêssemos, que lhe déssemos razão, do que procurar ler o que escrevíamos ou respondíamos. E é claro que, por uma simples questão de honestidade, creio ser claro que não dou razão a ninguém só para "fazer um jeito". Não vejo na desonestidade simpática solução para coisa alguma.
Se este era um lado do Paulo, outro era este:
Já alguns dias que não passo por cá. Já estou com saudades vossas, de si, do José Manuel e do Sid. Peço desculpa a todos de algo que possa ter dito... Eu não sou estúpido e tenho cabeça para pensar, ando farto de trafulhices e primo pela clareza. Ao longo da minha vida tenho procurado a verdade e já estive mais longe dela do que estou actualmente. (...)
A sociedade é ensinada e treinada a ignorar e desconfiar de pessoas como o Paulo. 
Numa sociedade farsante, tudo pode ser simples farsa, e não é fácil distinguir o genuíno da fraude, especialmente num espaço tão anónimo como a internet, onde cada um pode assumir várias identidades, fazendo-as aparecer ou desaparecer a seu belo prazer.
Por isso, era fácil tomar o Paulo apenas como aquilo que ele foi para nós - um conjunto de comentários, mais ou menos caóticos. Porém, mesmo em circunstâncias tão dúbias, temos uma capacidade de empatia, e é difícil deixar de considerar a hipótese de haver uma pessoa assim, capaz de tantas instabilidades e incoerências. Foi nesse sentido que, apesar das desconfianças naturais, nunca deixei de considerar a hipótese de haver um Joaquim atrás do Paulo Cruz... e era muito mais fácil proceder de outra forma, olhando apenas para o seu bonequinho azul.

Em ambas as páginas que consultei, o Paulo deixava uma ligação à sobrinha, que certamente muito estimava, e daí julgo ter percebido que estaria bastante doente já em Setembro. 
O "Crux" que coloquei está nessa ligação familiar, e não sei se o Paulo sabia ou não que "crux" é literariamente um termo de ambiguidade, difícil ou impossível de determinar. 

No texto Inevitabilidade (1) fui encontrar este comentário dele:
Caríssimo e amigo José, fico-lhe agradecido pelas diversas advertências. Vocês não me conhecem e, acreditem ou não, eu não tenho medo da morte. "A vida é um momento de férias que a morte nos concede"... todo o homem/mulher esta morto logo a nascença, cabe-nos procurar as coisas dos céus, o Cristo, e se ele tiver misericórdia concede-nos a vida eterna. Com isto termino, se vos aparecerem e ao mundo, não tenham medo deles, eles são os anjos que as pinturas, que para ai andam, mostram que tem asinhas...essa é a fraude, juntamente com a fraude milenar... Eu e vós, penso, somos os Atlantes!
... e como as coincidências são o que são, a Maria da Fonte colocou esta notícia no último texto, que era referente a um comentário do José sobre a Atlântida.

Como aqui não estamos no mundo do facebook, onde só existe o presente e os presentes, e como Paulo Cruz já não está connosco neste presente, estas palavras da Maria da Fonte surgem como as mais apropriadas:
Os miúdos como o Paulo, não deviam morrer assim, tão novos.
É demasiado injusto.
Tenho tanta pena... 
Até um dia destes, meu caro Paulo!

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