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A memória nacional tem sido tão delapidada, que quando for toda perdida será considerado um mistério falar-se português no Brasil, em Angola, Moçambique, ou noutras partes, sendo claro que em Portugal é um incómodo leccionar em português, e em muitas universidades os mestrados têm já o inglês como língua oficial.

Vem isto a propósito de um tema religioso clássico "Adeste Fideles", que apesar de ser cantado em latim e não em português, terá sido escrito por D. João IV, na sua vertente menos conhecida, a vertente de compositor musical. Apareceu na Inglaterra muito depois, onde ficou conhecido como "Hino Português", embora não haja hoje praticamente nenhum português que disso saiba, e vá passando por um dos vários temas natalícios, interpretado por uma panóplia de cantores.

Escolho aqui a versão de Andrea Bocelli, não tanto por ilustrar a cegueira a que nos condenaram, mas porque a música é sublime e este tenor italiano tem aqui uma interpretação capaz de provocar arrepios na espinha, e transmutar qualquer corpo frágil em espírito forte, contra as legiões de esbirros traidores que nos desgovernaram.


Adeste, fideles, læti triumphantes.
Venite, venite in Bethlehem.
Natum videte Regem angelorum.
Venite, adoremus, Venite, adoremus, Venite, adoremus Dominum.
En grege relicto humiles ad cunas,
Vocati pastores approperant,
Et nos ovanti gradu festinemus.
Venite, adoremus, Venite, adoremus, Venite, adoremus Dominum.
Æterni Parentis splendorem æternum,
Velatum sub carne videbimus,
Deum infantem pannis involutum.
Venite, adoremus, Venite, adoremus, Venite, adoremus Dominum.
Pro nobis egenum et fœno cubantem
Piis foveamus amplexibus ;
Sic nos amantem quis non redamaret ?
Venite, adoremus, Venite, adoremus, Venite, adoremus Dominum.

Que se traduz mais ou menos assim:
Acorram fiéis, alegres e triunfantes. Venham, venham, a Belém. Nascido, vejam o Rei dos Anjos. Venham, adoremos. Venham, adoremos. Venham, adoremos o Senhor. Doceis à voz celeste os camponeses deixam o seu terço, e apressam-se a visitar o seu humilde berço. E nós também, havemos de lhe levar nossos passos. Venham, adoremos. Venham, adoremos. Venham, adoremos o Senhor. Aquele que é o esplendor eterno do Pai, por trás do véu da carne mortal, veremos um Deus menino embrulhado em linho. Venham, adoremos. Venham, adoremos. Venham, adoremos o Senhor. Abracemos piamente esse Deus, por nós na pobreza gerado e no feno deitado. Quando ele assim nos ama, como não o amaremos nós? Venham, adoremos. Venham, adoremos. Venham, adoremos o Senhor.

Já há bastante tempo tinha aqui referido o compositor Filipe da Madre Deus:
mas desconhecia a faceta de rei músico associada a D. João IV, que ao que consta seria também intérprete versátil em todos os instrumentos.
He [D. João VI] had inherited the predilection of the Portuguese royal family of Bragança for sacred music: his ancestor, João IV was credited with playing all musical instruments and with composing the Christmas carol "Adestes fideles". Nourished by generations of royal patronage, the church music in Portugal at the time of Dom João VI regency was "the best in Europe". 
in Neil Macaulay (1986) Dom Pedro: The struggle for liberty in Brazil and Portugal
E se a música sacra era considerada a melhor na Europa, mesmo no tempo de D. João VI, vemos como muito se foi acumulando na perda.

Neste caso, sobre o tema "Adeste Fideles", a autoria só foi remetida a D. João IV porque, por manifesto inconveniente, a mesma partitura foi encontrada no palácio de Vila Viçosa, entre velharias desse período, o que veio colocar em causa a versão da história que dava John Francis Wade como compositor do "Hino Português" em 1743, ou ainda outra que apontava Gluck como candidato.
No entanto, estes inconvenientes de se encontrarem originais anteriores à cópia, são apenas um detalhe na atribuição da autoria, já que a omissão da descoberta se encarrega habitualmente de destruir por completo a memória de uns em benefício do património dos outros.
Aqui, também não é difícil de ligar todo o espólio musical perdido ao incêndio do Sismo de 1755, chama tal que consumiu os registos, neste caso mesmo o de Vila Viçosa, onde não ardeu no papel, mas ardeu na memória.

Ver também:




Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 07:42

A memória nacional tem sido tão delapidada, que quando for toda perdida será considerado um mistério falar-se português no Brasil, em Angola, Moçambique, ou noutras partes, sendo claro que em Portugal é um incómodo leccionar em português, e em muitas universidades os mestrados têm já o inglês como língua oficial.

Vem isto a propósito de um tema religioso clássico "Adeste Fideles", que apesar de ser cantado em latim e não em português, terá sido escrito por D. João IV, na sua vertente menos conhecida, a vertente de compositor musical. Apareceu na Inglaterra muito depois, onde ficou conhecido como "Hino Português", embora não haja hoje praticamente nenhum português que disso saiba, e vá passando por um dos vários temas natalícios, interpretado por uma panóplia de cantores.

Escolho aqui a versão de Andrea Bocelli, não tanto por ilustrar a cegueira a que nos condenaram, mas porque a música é sublime e este tenor italiano tem aqui uma interpretação capaz de provocar arrepios na espinha, e transmutar qualquer corpo frágil em espírito forte, contra as legiões de esbirros traidores que nos desgovernaram.


Adeste, fideles, læti triumphantes.
Venite, venite in Bethlehem.
Natum videte Regem angelorum.
Venite, adoremus, Venite, adoremus, Venite, adoremus Dominum.
En grege relicto humiles ad cunas,
Vocati pastores approperant,
Et nos ovanti gradu festinemus.
Venite, adoremus, Venite, adoremus, Venite, adoremus Dominum.
Æterni Parentis splendorem æternum,
Velatum sub carne videbimus,
Deum infantem pannis involutum.
Venite, adoremus, Venite, adoremus, Venite, adoremus Dominum.
Pro nobis egenum et fœno cubantem
Piis foveamus amplexibus ;
Sic nos amantem quis non redamaret ?
Venite, adoremus, Venite, adoremus, Venite, adoremus Dominum.

Que se traduz mais ou menos assim:
Acorram fiéis, alegres e triunfantes. Venham, venham, a Belém. Nascido, vejam o Rei dos Anjos. Venham, adoremos. Venham, adoremos. Venham, adoremos o Senhor. Doceis à voz celeste os camponeses deixam o seu terço, e apressam-se a visitar o seu humilde berço. E nós também, havemos de lhe levar nossos passos. Venham, adoremos. Venham, adoremos. Venham, adoremos o Senhor. Aquele que é o esplendor eterno do Pai, por trás do véu da carne mortal, veremos um Deus menino embrulhado em linho. Venham, adoremos. Venham, adoremos. Venham, adoremos o Senhor. Abracemos piamente esse Deus, por nós na pobreza gerado e no feno deitado. Quando ele assim nos ama, como não o amaremos nós? Venham, adoremos. Venham, adoremos. Venham, adoremos o Senhor.

Já há bastante tempo tinha aqui referido o compositor Filipe da Madre Deus:
mas desconhecia a faceta de rei músico associada a D. João IV, que ao que consta seria também intérprete versátil em todos os instrumentos.
He [D. João VI] had inherited the predilection of the Portuguese royal family of Bragança for sacred music: his ancestor, João IV was credited with playing all musical instruments and with composing the Christmas carol "Adestes fideles". Nourished by generations of royal patronage, the church music in Portugal at the time of Dom João VI regency was "the best in Europe". 
in Neil Macaulay (1986) Dom Pedro: The struggle for liberty in Brazil and Portugal
E se a música sacra era considerada a melhor na Europa, mesmo no tempo de D. João VI, vemos como muito se foi acumulando na perda.

Neste caso, sobre o tema "Adeste Fideles", a autoria só foi remetida a D. João IV porque, por manifesto inconveniente, a mesma partitura foi encontrada no palácio de Vila Viçosa, entre velharias desse período, o que veio colocar em causa a versão da história que dava John Francis Wade como compositor do "Hino Português" em 1743, ou ainda outra que apontava Gluck como candidato.
No entanto, estes inconvenientes de se encontrarem originais anteriores à cópia, são apenas um detalhe na atribuição da autoria, já que a omissão da descoberta se encarrega habitualmente de destruir por completo a memória de uns em benefício do património dos outros.
Aqui, também não é difícil de ligar todo o espólio musical perdido ao incêndio do Sismo de 1755, chama tal que consumiu os registos, neste caso mesmo o de Vila Viçosa, onde não ardeu no papel, mas ardeu na memória.

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