Há sempre coisas engraçadas que podemos apreciar. Uma delas é o enrolar do bicho de contas:
O número de pessoas que não consegue lidar com a realidade, e está disposto a embarcar noutro conto, o chamado conto do vigário, é esmagador. Não é difícil entender isso, porque ter ideias próprias estruturadas dá muito trabalho, é mais fácil apostar numa narrativa alheia, e depois é só segui-la até ao fim. Pode implicar dizer que contas certas são erradas, que o preto não é preto, mas o que é que isso interessa? Interessa é que não se está sozinho no frio, e está-se aconchegado por um grupo de malta que padece da mesma doença.
Acontece assim no futebol, na política, na religião, e até na ciência. Há uma enorme dificuldade em dar o braço a torcer, em reconhecer mérito alheio, enfim, todos conhecemos múltiplas histórias disso, mas também não é por sabermos disso, que isso é minimamente corrigido.
Há um mês atrás era decretado o "estado de emergência" em Portugal, e em muitos países da Europa, o que foi uma notícia algo surpreendente, já que até então só a Itália tinha colocado sérias restrições à circulação. De um momento para o outro, o mundo decidiu parar, isolar-se, e basicamente foram suspensas todas as viagens aéreas entre os diversos países.
O engraçado é que a ideia de restringir vôos, e proceder ao isolamento das comunidades, nada teve a ver com a Europa, que então tratava a Itália como um "apêndice infectado".
A ideia de proceder ao isolamento partiu de Donald Trump, que já tinha bloqueado os voos vindos da China, e alargou a medida à Europa, no mesmo dia em que a OMS finalmente declarou a epidemia como "pandemia". Isso provocou fortes reacções negativas:
Apesar da massiva campanha publicitária contra Trump, que não poupa adjectivos a quaisquer acções suas, convém que nós não tenhamos uma memória tão má, que não nos lembremos disto.
Nenhum estado europeu estaria propriamente à vontade para impedir voos dos EUA, foi a reacção isolada e unilateral de Trump que despoletou o fecho de todas as fronteiras, nas semanas seguintes.
Por isso, quando há críticas à actuação de Trump, são no mínimo enviesadas. É claro que depois Trump não deu nenhuma indicação de isolamento estadual - isso era competência dos estados, e o vírus espalhou-se como fogo em palha seca, perante a ausência de reacção musculada, que tardou no caso dos EUA e do Reino Unido.
Entre a perspectiva de ver a economia bloqueada e a disseminação do vírus, Donald Trump e Boris Johnson foram mal aconselhados inicialmente, na ideia de que poderiam conviver com o caos de casos nos sistemas de saúde. Essa ideia era a ideia dominante na OMS, que sempre desvalorizou o impacto da propagação do vírus e a sua perigosidade.
Crime contra a humanidade
Anteontem Trump, não cortou apenas o financiamento à OMS, foi mais longe, e insinuou que a OMS poderia ter sido intencional ao dar recomendações erradas a todos os países. Não foi explícito, porque arriscaria a ser apoiante de uma teoria da conspiração, mas abriu a ferida, de que a OMS terá sido agente activo num crime contra a humanidade.
É claro que logo de seguida, foi acusado do mesmo, por secar o financiamento à OMS numa altura em que seria mais necessário... mas basta ligar a Fox News para ver que uma boa parte dos americanos vê a OMS como uma agência parasitária, até como agência de turismo, para imensas viagens - excepto para enviar a tempo uma delegação à China para estudar o novo corona-vírus.
O uso dos
pandemic-bonds e o atraso na declaração da pandemia, em nada veio beneficiar uma imagem da OMS, que era antes razoavelmente positiva.
A crise do álcool-gel, das máscaras, e ventiladores, espalhada por quase todos os países (exceptuando talvez a Alemanha), veio ainda tornar mais claro, excepto para cegos, que o processo de contágio só pode ter sido propositado, por ter contado com muitas ajudas inesperadas. A OMS não impôs qualquer controlo nos aeroportos, e perante a passividade da UE, o vírus teve oportunidade de seguir calmamente o seu caminho a partir de Itália, e espalhar-se durante um mês em toda a Europa.
A persistência em não recomendar o uso de máscaras, sendo de uma incompetência tão grosseira, só pode ser considerada como um crime público, promovido pela OMS, e acatado pelas diferentes organizações satélites, como a DGS em Portugal. Por vontade dessa entidade, nem sequer as escolas teriam sido encerradas, quando já eram os próprios pais a reter os filhos em casa.
Números enrolados
Em Portugal, os números foram sendo arrolados a partir dos 2 primeiros casos a 2 de Março.
Por mero exercício especulativo,
coloquei aqui uma previsão simples do que seria uma possível evolução da curva, com base nos dados até 22 de Março (pontos a vermelho, na figura até dia 22, quando havia 1600 casos). É altura de confrontar os dados ocorridos depois (pontos a azul, a partir do dia 23) com a previsão que então assumi (curva mais alta, a preto).
Comparação da previsão (curva a preto) com a evolução dos números a partir de 22 de Março.
Os valores que se verificaram e aqueles que foram previstos coincidiram razoavelmente bem.
Convém notar que as previsões por "especialistas" eram bem diferentes:
Ninguém, nessa altura aceitaria uma previsão tão baixa, e mesmo uma semana depois, tive dificuldade em que acreditassem que na Páscoa iríamos a chegar a uma situação "estável".
Isso parece agora um dado adquirido agora, mas não era, e esteve longe de o ser.
Na altura valeu a pena fazer esta previsão e partilhá-la, arriscando a que estivesse completamente errada. O facto de ir acertando não me atrasou nem adiantou coisa nenhuma, mas foi interessante ver como as pessoas se recusavam a ver os números, e continuavam em cenários próprios ou alheios, de estimativas baseadas em coisíssima nenhuma... ou baseadas em cenários completamente distintos.
De um modo geral, as pessoas detestam aceitar a razão alheia contra a sua, e preferem fechar os olhos para não aceitar. Pior, como no caso de Trump, procuram depois centrar o foco na destruição do alvo, por outros erros menores, que possa ter cometido.
Relativamente aos EUA,
o mesmo tipo de previsão dava um valor inferior a 500 mil infectados agora, quando se verificam 700 mil, e mostrava que a Espanha iria ultrapassar a Itália em número de casos, como de facto veio a ocorrer.
Porém, a partir do pico dos novos casos não vale a pena fazer grandes previsões, porque os valores não representam nada de especial.
Até ao momento em que a doença se está a espalhar, os casos vêm ter com o sistema de saúde, e a tendência é medida nessa proporção. Depois, é o sistema de saúde que vai à procura dos casos restantes, e dependendo dessa efectiva capacidade, pode encontrar mais ou menos casos. Já não tem a ver com a efectiva incidência da doença, mas sim com a capacidade de testar.
Por exemplo, em Portugal deve existir um número reduzido de "recuperados", porque os testes foram aplicados em quem não tinha sido ainda testado, e não tanto para "libertar" quem tinha sido diagnosticado, que convinha manter em quarentena.
Os números podem ser enrolados de múltiplas formas, e aquilo que vemos será sempre apenas o que o sistema nos dá a ver. No entanto, mesmo que esses números sofram de múltiplos vícios, não deixam de dar razão a quem os previu.
Confinamento
Com um período de incubação não superior a 14 dias, um confinamento superior a 1 mês é um tempo mais do que suficiente para se detectarem os possíveis focos de infecção. Não é especificado o tempo que demora a doença a desaparecer nos casos que tiveram poucos sintomas, e por isso podemos dar o benefício da dúvida para alargar o período por mais 14 dias. Porém, creio que a situação em Portugal parece razoavelmente controlada, e em Maio não há razões para não recomeçar a actividade de forma faseada... e é claro, com a protecção de máscaras - um cuidado que se deveria ter exigido desde a primeira hora. Deveria ter sido exigido a todos os que tivessem vindo de regiões infectadas, ainda antes de ter aparecido o primeiro caso em Portugal.
Mas a essas incompetências, o regime maçónico costuma dar medalhas, para esconder a nódoa, de grandes dimensões, que está por detrás.