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Para além das considerações históricas, os agentes da História são homens, não apenas enquanto personagens, mas enquanto actores, ainda que a sua acção esteja algo limitada pelo enredo.
É nesse sentido que importa perceber o que moveu os homens para empreenderem as suas acções, muito vezes parecendo arriscar muito empenho por pouco retorno. A sua relação com o desconhecido, através da religião, filosofia ou ciência, foi uma das facetas políticas.

Para não entrar em considerações que podem ser vistas como lunáticas, vou-me socorrendo de outros que foram desbastando preconceitos, e não deixam sozinho este caminho comum.
Encontrei uma entrevista da BBC a Carl Jung:
Estes 10 minutos da parte final da entrevista merecem ser vistos. Para o que se segue escolho as seguintes passagens:
- Lembro que disse que a morte é psicologicamente tão importante quanto o nascimento e que ela é parte integrante da vida. Mas não pode ser assim, se é um fim; ou pode?
- Certo, se ela for um fim, mas... não estamos muito certos sobre esse fim porque existem as faculdades especiais da psique, ela não é inteiramente limitada pelo espaço e pelo tempo. Pode ter sonhos ou visões do futuro, pode ver mais longe do que as esquinas. Apenas a ignorância recusa tais factos. É evidente que eles existem... e sempre existiram. Mostram que a psique, ao menos parte dela, não depende desses limites.
- E daí?
- Se a psique não é obrigada a viver no espaço e no tempo apenas, e obviamente não vive, então até tal ponto a psique não está sujeita àquelas leis, o que indica uma continuação prática, uma espécie de existência psíquica além do tempo e do espaço.

Começamos pelo trivial.
O homem tem conhecimento de realidades alternativas, normalmente designadas por sonhos.
Ao dormir, o sonho inconsciente confronta-nos perante realidades que não têm lugar no espaço da realidade comum, que partilhamos com outros. Esses cenários alternativos não foram criados por nós, no sentido em que não fazemos a mais pálida ideia de como construímos o cenário do sonho, ou porquê. Também aí tomamos o lugar de personagens intervenientes numa realidade de que desconhecemos as regras, e que é suficientemente imprevisível e credível.

O sonho pode ser visto como um teste ao nosso pensamento em resposta a mundos diferentes do que conhecemos. Quem produz esses mundos? Não é o nosso consciente, e quanto ao inconsciente dificilmente podemos chamar-lhe "nosso"! É tão externo quanto a realidade que nos é oferecida, e é por isso que no sonho acreditamos estar a viver uma experiência real.
Como não é uma experiência partilhada, quando regressamos à realidade comum, há uma tendência clara de ser socialmente negligenciada... não o seria se um grupo de pessoas tivesse partilhado o mesmo sonho.

Em contrapartida, como ao individuo é atribuída a criação do sonho, através do seu inconsciente, também o indivíduo pode pensar que a realidade "comum" é produto do seu inconsciente.
Essa convicção solipsista foi especialmente notória na filosofia hindú, ou na concepção de Parménides, e nos resultantes idealismos, de Platão à escola idealista alemã.
No entanto, é indiferente... o que importa é que o indivíduo é sempre colocado perante uma realidade que não controla completamente. Pode acreditar que é o "seu" inconsciente, ou que é "outro" que origina essa realidade que percepciona. Esse "outro" tanto assumir a forma de crença numa divindade consciente, como a forma de crença numa ordem inconsciente (na perspectiva materialista).

Convirá aqui notar que a justificação para certas entidades, ou acontecimentos, não explicáveis pelo conhecimento comum, tem várias formas quase equivalentes. Consoante a época, podemos falar de deuses, magos, vampiros, alienígenas, etc... pouco importa. Não importa a forma, importa a sua essência. Há entidades que surgiram como metáforas literárias a um poder humano submerso, e que ganharam espaço no imaginário, propagando-se de forma errada por interpretação diversa dos leitores, e há outras que têm um conceito diferente.
Podemos chamar "vampiro" a um ser que suga o sangue, no mesmo sentido em que criticamos uma elite ociosa que subsiste do trabalho dos restantes. E neste caso o seu poder forma-se nas trevas, no secretismo, no desconhecimento da população, e tal como o vampiro, não suportará que caia luz sobre si.
Esta figura metafórica de Bram Stoker tanto fez a delícia dos que a compreendiam, como a dos que não compreendiam (apenas se assombravam com tal ideia) e por isso acabou por ser inócua, e fazer parte da cultura popular como um medo, o que até agradou às mesmas elites.
No sentido oposto, creio que se pretendeu depois substituir esses medos por uma ciência primária que ostracizou qualquer ideia de espiritualidade, varrendo todas as ocorrências mais estranhas para debaixo da ocultação. Fica assim confuso perceber o que são apenas manifestações literárias alegóricas, mitológicas, de outras que podem corresponder a verdadeira observação (por exemplo, uma questão serão os eventuais registos arqueológicos de gigantes).

Não se pode experimentar a ideia de morte na realidade "comum", no entanto há sonhos em que o próprio se vê confrontado com uma realidade cujo o único desfecho lógico, mesmo no mundo do sonho, seria a morte. Assim, o próprio pode aceitar nesse sonho a ideia de que morreu, mas dá consigo a pensar sobre isso, e percebe que não pode estar morto. Tem que acordar para outra realidade... e acorda!
Conforme diz Carl Jung, há uma distinção entre a morte individual e a morte dos outros. No espaço da realidade "comum" observa-se a morte dos outros, que se desligam do nosso convívio, e é uma consequência lógica da realidade partilhada por todos. No entanto, o simples materialismo não reconhece as suas contradições, e acaba por inventar umas partículas chamadas "pensões", que não justificam o pensamento, servem antes para financiar a sua ocultação.

Há uma realidade partilhada e uma realidade individual. Só o indivíduo que abdique por completo da vivência dos sonhos, atribuindo a si o que não é seu, chamando-lhe "inconsciente", pode negar essoutra realidade. A realidade partilhada, essa tem um fim previsto, quanto à outra, conforme diz Jung, há fortes razões para pensar que não se esgota nesta realidade. Tem nascimento neste útero da realidade terrestre, onde adquire consciência e ideias primevas, mas nada lógico impede que  prossiga para além desta realidade física.

Acreditar num acaso que formou este universo e mais nenhum outro, acaba por nos remeter e prender a uma visão funesta, redutora para além do necessário, em que é cultivado o excessivo medo da morte. E, como sabemos, os medos são excelentes recrutadores de vontades...
Nem sempre terá sido assim, já que as circunstâncias de guerra implicavam até uma visão voluntarista, em que o modelo de vida, a ideia da morte honrada, seria até usada no sentido oposto - recrutamento de guerreiros que não temiam a morte. Na maioria das vezes esses combatentes desconheceriam pouco mais do que um código de valores eficaz para a fidelidade ao líder, ou à tribo... podendo ser tribo de preservação genética, ou de preservação religiosa. Na prática foram progressivamente usados contabilisticamente por uma inteligência secreta, como autómatos em confrontação.

O que aprendemos em conjunto, e que vai para além desta realidade material, é que há noções abstractas que não são apenas ilusões individuais... e na pior das hipóteses serão ilusão da espécie humana. Essas noções abstractas estão na nossa linguagem, ajudaram a descrever e compreender a realidade comum, mas vão muito para além dela.
Nem calhaus, nem vegetais, pensam abstractamente (pode duvidar-se de alguns animais com comportamento social...), por isso essas noções abstractas só emergem da realidade através do nosso pensamento, e no entanto, pela abstracção matemática, acabamos por constatar que essas ilusões mentais têm afinal algum correspondente na nossa realidade, e servem para modelá-la.
Portanto pretende-se fazer crer que apenas esta realidade é possível, quando é esta própria realidade que nos induz ideias que mostram que ela é apenas um caso particular sujeita a leis de modelação, que até podemos grosseiramente simular em computador.

Poderemos até no futuro ser capazes de simular realidades virtuais, onde os pequenos entes computacionais ganhem cognição capaz de iludir uma auto-consciência, mas isso não faria de nós seus deuses, seríamos apenas criadores, já que as dúvidas sobre criação que levou à nossa própria existência não ficariam resolvidas por esse meio.

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publicado às 21:43


4 comentários

De José Manuel de Oliveira a 12.05.2012 às 23:24

Gostei de ler, aqui vai uma resposta sobre "realidades":

Tardigrade ursinho de água é um invertebrado de 0,1 a 0,3 mm descoberto no século XVII. Recentemente numa calote glacial encontraram Tardigrades com 2.000 anos de idade, estavam em “hibernação criptobiotica" e “ressuscitaram ”(Cryptobiose / Anhydrobiose)

Tardigrades resistem ao frio sideral e a vários tóxicos químicos, à pressão hidrostática e a várias radiações:

Tardigrade resiste a temperaturas de -272,9° C (graus centígrados negativos).
Tardigrade resiste a temperaturas de +150° C (graus centígrados positivos).
Tardigrade resiste durante 20 horas dentro de ar liquefeito, à temperatura de -190° C (graus centígrados negativos).
Tardigrade resiste de 5 dias a vários meses sem oxigénio em água salgada e mais de 3 dias em água doce sem oxigénio.
Tardigrade sobrevive à pressão hidrostática de 600 megapascales, equivalente a 6 vezes a pressão oceânica de 10'000 metros de profundidade, onde qualquer ADN é "destruído".
Tardigrade sobrevive aos raios ultra violetas, 7000 Sv.
Tardigrade sobrevive a vários tóxicos e químicos.
Tardigrades auto repara o seu próprio ADN.

Tardigrade pode viajar pelo Universo Galáctico em cometas, esta espécie de Tardigrade Adorybiotus coronifer na Terra vive na água doce e no gelo. A metade das 600 espécies de Tardigrades até hoje reportoriadas vivem no Árctico (Pólo Norte) e na Antárctida (Pólo Sul); 115 espécies são conhecidas na Gronelândia e somente 33 na Dinamarca.

Ver mais aqui: http://portugalliae.blogspot.com/2010/03/tardigrade-ursinho-de-agua-e-o-gelo-no.html
Está muito longe de nos ter livrado todos os seus segredos, este maravilhoso animal. A vida veio do espaço sideral.

A vanidade do homem é igual à sua ignorância, desmedida!
Boas leituras, cumprimentos, José Manuel CH-GE

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