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Não ocorrendo nada de forma acidental, haverá alguma forma de controlo? Ou seja, coloca-se a interrogação sobre a existência de alguma entidade que presida a um eventual controlo.

A questão tem diversos níveis, começando pelo mais simples, à escala humana - ou seja, se existe ou existiu uma elite que foi controlando a deriva humana, de forma mais ou menos acidental ou propositada - até chegar ao ponto da escala sobre-humana, que ora coloca a evolução animal como planeamento extraterrestre conspirativo, ora leva a conceitos teológicos de criação divina.

Em reflexão relativa à imagem do postal anterior, deixo aqui o Homem no outro lado do espelho.
Porquê? Porque, seja sobre impotência ou máxima potência, toda a discussão é feita entre homens, ou ainda, no seu aspecto mais profundo, por cada homem na reflexão em si mesmo.

Limitações ilimitadas
Um argumento típico é o de que não podemos reflectir em aspectos sobre-humanos, porque está para além das nossas capacidades. Parecendo fazer todo o sentido, cai numa contradição prática, pois podemos, por exemplo, trabalhar com números que excedem largamente os átomos, ou partículas, do universo físico. Ou seja, trabalhamos facilmente com noções estão muito acima da escala material admitida pela Física.
Segundo contas recentes, o número de átomos no universo físico observável andará pelos 1082 átomos, estimativa por alto, sendo um número de 82 dígitos, o que não é nada...
Basta notar que o número de dígitos de Pi está com o recorde de cálculo em 31 biliões de dígitos, e há mais de trezentos anos, em 1706, Machin calculou à mão 100 dígitos de Pi. Convém notar que para calcular o perímetro do universo com um erro inferior ao tamanho de um electrão, bastaria usar Pi com "apenas" 40 dígitos (isto indo pelo dogma da velocidade máxima da luz e da suposta idade do universo em menos de 15 milhares de milhões de anos).
Isto apenas para exemplificar que podemos trabalhar com noções muito acima de qualquer correspondente material conhecido. Podemos manipulá-las com certeza matemática.

Por isso, é incorrecto argumentar sobre a incapacidade de reflectir sobre coisas que nos transcendem.
Não é por não tocarmos no Sol que não existe toda uma teoria astrofísica que assume compreender os seus processos físicos. Não podendo entrar na cabeça de outro, não deixamos de procurar antever o pensamento alheio. Qualquer pensamento humano é uma especulação baseada nos sucessos e insucessos da nossa experiência de vida. Se há coisa que o caracteriza é não lhe conhecermos limitações, podendo insistir na falsidade, como se tratasse de uma indiscutível verdade.

Portanto, antes de reflectir sobre a divindade, esclarece-se que nada o impede, excepto parar de ler.

Aspecto teológico.
Qualquer entidade, incluindo a divindade, está confinada ao seu próprio universo.
Claro que se assume que o universo divino transcenderá o universo material, mas não pode deixar de ser uma qualquer estrutura.
Pode uma entidade divina controlar tudo o que se passou ou vai passar no seu universo?
Sim, mas nesse caso terá que se identificar ao seu próprio universo.
Até aqui parece estar tudo na paz eclesiástica, dizendo que Deus se identifica ao universo.
Porém, estando tudo contido em Si, do princípio ao fim, não poderia exercer qualquer acção, porque nada há para ser alterado, impedido, ou efectuado.

Romantizando o assunto, a suprema concretização divina seria definir o que iria acontecer, de entre tudo o que poderia acontecer. Alcançado esse objectivo supremo, não restaria qualquer espaço de acção, e sem possibilidade de acção a divindade morreria. O legado deixado, seria este universo, o único viável, para habitarmos. Seria esse o fim divino? Não, se reencarnasse sem memória, em cada ser inteligente... e daí o legado habitual, em que todos os humanos se vêem como pequenos deuses.
Esta versão romantizada é história, mas corresponderia a um sacrifício muito diferente de perecer humanamente, mantendo a vida divina. Neste caso, corresponderia a perecer propositadamente com a finalidade única de tornar possível a existência universal.
É história, porque é dispensável, e o legado, o universo, formar-se com ou sem protagonista criador é folclore facultativo. Não teria outra viabilidade, porque nem a inexistência era viável.

Noutra tendência, é argumentado que cada homem tem livre-arbítrio para escolher o seu percurso. A divindade sabe o que acontece se a escolha for uma, ou outra, mas não sabe o que o homem escolhe.
Estando viva, não se distinguiria de nós - há coisas que sabemos e outras que não sabemos.
Além disso, sabendo que nós iremos escolher o que escolhemos, qual a necessidade de sequer considerar as outras hipóteses? Não ocorrendo, são apenas ficção ou arte.
Aliás, falar do livre arbítrio humano seria pensar que algo poderia ser acidental... ora, sobre isso já falámos (no postal anterior). 
A hipótese reconfortante é que, estando definido o desenvolvimento do princípio ao fim, ficaremos sempre sob os auspícios da herança de um universo eternamente viável.

Aspecto humano.
É indiferente saber se temos competidores humanóides na inteligência, já que na prática é admitido que essa inteligência seria semelhante, e manifesta-se também entre nós, entre aqueles que são mais capazes que outros.
É ainda indiferente saber se existiu uma civilização alienígena que nos criou em tubo de ensaio, porque as nossas dúvidas de criação passariam a ser as dúvidas sobre a criação dos criadores.

Interessa saber se no meio da noite pré-histórica emergiu alguma tribo capaz de exercer um controlo superior sobre os restantes.
Quando? - Para esse efeito ser notado, o controlo de que estou a falar deixou de ser o controlo das tribos vizinhas, ou melhor, alargou-se, com a sucessiva conquista das tribos vizinhas.
Por isso, estamos a falar de um tempo de escassez, em que a sobrevivência passava por uma luta de territórios. Os territórios mais populosos, mais sujeitos a variações de alimento, e de certa forma confinados por razões geográficas - ou seja, ilhas razoavelmente grandes - teriam sido palco do desenvolvimento hostil de humanos extremamente competitivos.

Nesse aspecto convém notar que a estrutura tribal sempre contou com um chefe, mas fez ainda aparecer sacerdotes ou xamãs, algo que não seria a priori natural de ocorrer em diferentes paragens remotas, e com pouco contacto entre si. Uma hipótese é que estes xamãs seriam um ponto de contacto que formaria uma primitiva sociedade secreta, reguladora da civilização humana.
Sem esse controlo superior, o que aconteceria por medo do exterior, seria uma radicalização das disputas, até ao ponto de apenas sobreviver um povo. Como isso não ocorreu, e foram-se mantendo diversos povos, em estados civilizacionais bastantes diferentes, isso é indicador que pode ter existido desde cedo uma estrutura reguladora do poder. Essencial é que teria que ser secreta, sob pena de se tornar visível para a população, e assim passar a ser um alvo a dizimar, nas lutas de poder, para além dos alvos visíveis, que seriam os chefes tribais.

Uma parte fulcral da sociedade medieval europeia era exercida não apenas pelo poder secular dos reis, mas também por um outro poder centralizador, colocado no papa, detentor do poder temporal. Este terá sido um dos aspectos mais visíveis da presença de uma fonte diferente de poder, que era exercido não pelas armas de ferro, mas sim pelos jogos políticos realizados através da Igreja.
Parece-me bastante crível que sempre tenha estado presente esse poder, sempre de forma algo submersa e secreta, e que mesmo na Idade Média tenha sido suficientemente secreto para poder estar acima do alvo visível que era a Igreja, ocultando-se nos seus meandros... tal como provavelmente hoje se ocultará no meio de meandros financeiros.




(English translation 21.01.2020)

A quest for questions (2)

Nothing happening accidentally, will there be some form of control? That is, there is the question of the existence of an entity that presides over a possible control.

The question has several levels, starting with the most simple, the human scale - that is, whether there existed an elite who was controlling the human development from accidental to deliberate action - or in a superhuman scale, such as being animal evolution a conspiratorial extraterrestrial planning, leading to the theological concepts of divine creation.

As a reflection of the image from the previous post, here I picture Man on the other side of the mirror.
Why? Because, talking about impotence or maximum power, the whole discussion is made between men, or, at its deepest point, for every man in his self reflection.

Unlimited limitations
A typical argument is that we can not think about superhuman aspects, because it is beyond our capabilities. Seeming to make perfect sense, it falls in a practical contradiction. In fact, for example, we can work with numbers that far exceed the atoms or particles of the physical universe. We easily work with notions that are far above the range permitted by material Physics.

According to recent accounts , the number of atoms in the observable universe is around 10 82 atoms, a rough estimate, a number of 82 digits, which is nothing ...
Just note that the number of digits of Pi has a record calculation of 31 trillion digits, and there are over three hundred years, in 1706, Machin calculated by hand 100 digits of Pi. It should be noted that to calculate the perimeter of the universe with an error of less than the size of an electron, it would suffice to use Pi with "only" 40 digits (believing the dogma of the maximum speed of light and the supposed age of the universe in less than 15 thousand millions of years).
This is just to illustrate that we can work with notions that are far above any known material parallel. We can manipulate them with mathematical certainty.

So it is incorrect to argue about the inability to reflect on things that transcend us.
We do not need to touch the sun to accept that there exists a whole astrophysics theory that assumes understanding its physical processes. We are not able to get into the head of other, but we seek to anticipate other people's thinking. Any human thought is a speculation based on the successes and failures from our life experience. If there is anything that characterizes thought is not knowing its limitations, being able to insist on falsehood as if it an indisputable truth was stated.
So before thinking about the deity, we clarify that nothing prevents it, except stop reading.

Theological aspect.
Any person, including the deity, is confined to his own universe.
Of course it is assumed that the divine universe transcend the material universe, but nevertheless some structure must be present.
Can a divine entity control everything that happened or will occur in his universe?
Yes, but then he must be identified with his own universe.
So far everything seems to be in ecclesiastical peace, saying that God identifies with the universe.
However, all being contained in himself, from the beginning until the end, he could not take any action, because there is nothing to be changed, stopped or carried out.

Romanticizing it, the supreme divine achievement would be to define what would happen, from everything that could happen. Reached this ultimate goal, there would be no room for action, and with no possibility of action, the divinity dies. The legacy, it would be this universe, the only feasible to live in. This would be the divine ending? No, if he would become reincarnated, with no memory, in each intelligent creature... and hence the legacy in which all humans see themselves as little gods.
This romanticized version is a story, but it would correspond to a very different sacrifice, and not just humanly perish keeping the divine life. In this case, it would correspond to perish purposely for the sole purpose of making possible a universal existence.
It is a story, because it is unnecessary, since the legacy, the universe, to be formed with or without the need of a creator being is an optional folklore. The universe would have no other viability, because not even the option of inexistence was feasible.

In another trend, it is argued that every man has free will to choose his own path. Divinity knows what happens if the choice is one or the other, but it does not know what man chooses.
Being alive, he would do not be different from us - there are things we know and others we do not know.
Also, knowing that we will choose what we choose, what is the need to even consider the other assumptions? Events that do not take place, are just fiction or art.
Also, speaking about human free will would be to think that something could be accidental ... well, we just talked about that (in the previous post ). 
The comforting hypothesis is that, being set the development from beginning to end, we will always be under the auspices of the inheritance of eternal and reliable universe.

Human aspect.
It is irrelevant to know whether we have humanoid competitors in intelligence, since in practice it is admitted that this intelligence would look like ours, and among us there are also those who are more capable than others.
It is also irrelevant whether there was an alien civilization that created us in a tube, because our creation doubts would become doubts about the creation of the creators.

We are interested to know if in the prehistoric night some tribe become able to exert superior control over the others.
When? - To notice such effect, the control I am talking about is no longer the control of neighboring tribes, it was widened, with the successive conquest of neighboring tribes.
So we are talking about a period of difficulties, shortage, in which survival was a struggle over territories. The most populated areas, more subject to variations of food, and somewhat confined by geographical reasons - that is, to fairly large islands - had been the scene of hostile development of highly competitive human beings.

With respect to this, it should be noted that the tribal structure always had a chief, together with priests or shamans, something that would not be the natural thing to occur in different remote places, with little or no contact among each other. 
One hypothesis is that these shamans would be a contact point that would form a primitive secret society, a regulator of human civilization.
Without this greater control, what would happen for fear of the outside, it would be a radicalization of disputes, to the point of remaining a single people. As this did not occur, and many people in different stages of civilization were kept, this is an indicator that may have existed early a regulatory structure of power. Essential is that it would have to be secret, under penalty of becoming visible to the population, and thus become a target to destroy, in power struggles, beside the visible targets, which were the tribal chiefs.

A key part of the European medieval society was not only the secular power of kings, there was another centralized power, held by the Pope, holder of temporal power. This was one of the most visible aspects of the presence of a source of power that was not held by iron weapons, but by the political games held by the Church.
It seems believable enough that this power has always been present, somewhat submerged and secret, and that even in the Middle Ages it was sufficiently secret to be above a visible target such as the Church, hiding in its intricacies. .. as likely today it hides in the middle of the financial intricacies.

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publicado às 06:10


13 comentários

De Anónimo a 21.01.2020 às 19:54

O seu antropocentrismo é uma falácia.
O Homem é um quase nada.
O Homem não é sequer capaz de "pensar".
Todo o pensamento do Homem deriva de uma emanência divina.

O senhor controla os seus pensamentos?
Tem poder sobre as conclusões a que chega?
É você que controla os limites do seu conhecimento / pensamento / imaginação?
Já viu algum pensamento? Já o teve nas mãos?
Conhece-se a "física" dos pensamentos para além de umas descargas elétricas ridículas e uma eventual sopinha de proteínas?

De certo que muito mais se vai aprender sobre o conhecimento humano e sobre os pensamentos.
Mas, na realidade, nunca se saberá satisfatóriamente sobre estas coisas.
Porque são uma mera emanência.
São o reflexo do Senhor, de Deus, que nos faz funcionar à base daquilo que é verdadeiramente para lá da nossa capacidade de compreender.

Podemos explorar.
Nunca deixaremos de ter perguntas.
O que quer dizer que nunca responderemos a todas as respostas.

Irrita-me, sinceramente, que o Alvor Silves toque na Verdade mas que a despreze por causa do seu "Antropocentrismo Ideológico".

Se calhar não devia deixar este comentário aqui.
Mas deixo-o.

"Qualquer entidade, incluindo a divindade, está confinada ao seu próprio universo."

Como?
Outra falácia.
O criador é sempre maior que a criação.
Na mais exagerada das hipóteses o criador *é* toda a sua criação e nem um bocado mais.

Creio que seria muito mais interessante e objectivo (e falsificável, dando origem a uma maior facilidade de apurar a verdade) que o Alvor Silves passasse estas reflexões para um estilo mais "Witgensteiniano".
De um tipo simplificadíssimo:

a mais b igual a c.

O Alvor Silves escreve bem. A questão é que este tipo de raciocínios "ultra complexos" exigem a priori a maior simplificação possível... uma espécie de neo-escolástica...

Não ss zangue comigo, homem!
Os melhores cumprimentos,
IRF

De Anónimo a 21.01.2020 às 20:34

"Interessa saber se no meio da noite pré-histórica emergiu alguma tribo capaz de exercer um controlo superior sobre os restantes."

Sim, muitas tribos. Muitas vezes.

"o controlo de que estou a falar deixou de ser o controlo das tribos vizinhas, ou melhor, alargou-se, com a sucessiva conquista das tribos vizinhas."

Tipo Roma e o Alexandre Magno antes dela. A e a expansão Indo-Europeia antes deste.
Nada de subrenatural, conspiratório ou extraordinário.

"Os territórios mais populosos, mais sujeitos a variações de alimento, e de certa forma confinados por razões geográficas - ou seja, ilhas razoavelmente grandes - teriam sido palco do desenvolvimento hostil de humanos extremamente competitivos."

https://en.wikipedia.org/wiki/Tropics#/media/File:World_map_indicating_tropics_and_subtropics.png

Curioso como os povos da zona sombreada estiveram históricamente sempre sujeitos aos outros, especialmente os mais a Norte; e como estes povos da zona sombreada nunca foram competitivos relativamente aos mais a Norte.
Curioso como os povos a Sul da zona sombreada - pelo seu diminuto território espalhado por três continentes quando comparado com a imensidão dos territórios da zona sombreada - não tiveram qualquer hipótese e foram completamente substituídos pelos povos a Norte da zona sombreada.
Ou quase, por motivos estritamente políticos.

E se acha que os povos a sul da zona sombreada não era particularmente ou notavelmente mais capazes que os povos da zona sombreada... em parte está certo porque não raramente descendiam dos povos da zona sombreada há relativamente pouco tempo.

Consideremos as maiores civilizações e a sua origem a Norte da zona sombreada:
Europeia - Evidentemente a Norte;
Asiática / Sínica / Oriental - Evidentemente a Norte;
Islâmica - Esta começou perto da linha de sombra mas isso foi um tarado com mania de grandeza. Esta civilização só se tornou realmente uma civilização quando se assentou entre os povos do Norte (Damasco, Bagdade, Cairo, Istambul, já para não falar do Irão, na sua vertente xiita).
Hindu - Com tanta Índia a Sul da linha, teve de emergir a Norte da linha...
Até os budistas do Sudeste Asiático emergiram enquanto Civilização no Norte da Índia - a norte da linha!

IRF (I)

De Anónimo a 21.01.2020 às 20:35

"convém notar que a estrutura tribal sempre contou com um chefe, mas fez ainda aparecer sacerdotes ou xamãs, algo que não seria a priori natural de ocorrer em diferentes paragens remotas, e com pouco contacto entre si."

Enquanto as formiguinhas trabalhavam e se importavam com a sua vida e cuscovelhices e bebedeiras...
Enquanto a "classe dos líderes" mandava porque podia e lutava se fosse preciso.
A classe dos xamãs ficou reservada àqueles que procuravam o conhecimento.
O Alvor Silves tem de admitir e entender que a maior parte das pessoas não procura grande conhecimento. Procura como abrir a lata de cerveja e como ver a bola.
E se calhar é o que basta para uma boa vida.
Assim os xamãs foram aquela classe que se dedicava ao conhecimento e a ocultar esse conhecimento dos outros, criando até rituais religiosos para se legitimizar, etc.
Acho isto tudo natural e relativamente expectável.
Antropoligia 101.
Não me parece que haja aqui conspirações ou combinações do tipo xamãns do mundo, uni-vos!
Isto porque, embora grande parte dos xamãs de tribos diferentes procurasse aprender uns com os outros, por e simplesmente os xamãs ganhavam mais sendo os campeões das suas respectivas ligas minúsculas.
Porque no encontro entre duas classes de xamãs uma saíria como inferior, como deslegitimizada.
Já para não falar que estes assumiam um carácter à partida inviolável e secreto, não podendo partilhar o seu conhecimento a preço de nada e contando com "as forças armadas" para os proteger ou para os atacar.
Pelo que grande parte dos contactos entre xamãs derivava da conquista de uma sociedade por outra, segunte deslegitimização dos xamãns vencidos, e a aprendizagem (se desse para isso) dos xamãns vencedores daquilo que podiam aprender com os xamãns vencidos e desligitimizados.

Por isso sabemos pouco dos cultos dos Cartagineses;
Por isso não sobreviveu a classe dos "xamãns" de Merlin da Britânia Celto-Romana do Rei Artur.

"Uma hipótese é que estes xamãs seriam um ponto de contacto que formaria uma primitiva sociedade secreta, reguladora da civilização humana."

Não. A cultura A tinha os xamãns A.
A cultura A dominava e destruía os xamãns da cultura Z, durante a expansão da cultura A.
Eventuais localismos ligeiramente influenciados pelos xamãns da cultura Z mas largamente descendentes dos xamãns A originaria os localismos dos xamãns B, C e E, no âmbito da tradição dos xamãns A.
1000 anos volvidos, destruida ou degenerada a cultura dos xamãns A, emergeria no seu lugar as culturas dos xamãns B, C, e E.
Todas diferentes, todas autênticas, cada uma com os seus desenvolvimentos locais originais.
Mas todas parecem ter um grande tronco em comum, não só porque procuram responder aos problemas comuns a toda a Humanidade, como descendem do tronco dos xamãns A.

IRF (II)

De Anónimo a 21.01.2020 às 20:36

"Sem esse controlo superior, o que aconteceria por medo do exterior, seria uma radicalização das disputas, até ao ponto de apenas sobreviver um povo."

Isso não deriva da necessidade de controlo superior.
Um povo pode alcançar a hegemonia.
Passado um tempo os localismos emergem e tornam-se diferentes.
Vide os Estados Unidos que eram uma verdadeira nação nos anos 50 e agora cada vez têm menos em comum uns com os outros, mesmo se nos cingirmos apenas aos descendentes daqueles que lá estavam nos anos 50.
O mesmo poderiamos dizer da União Soviética.
Já na Alemanha e no Vietname creio que estão mais "iguais", mais unidos...

"pode ter existido desde cedo uma estrutura reguladora do poder."

Seria interessante que enumerasse mais indícios que o levam a formular essa opinião.
Não vejo como pode isso ter acontecido, mas gostava que me tentassem convencer...

"Parece-me bastante crível que sempre tenha estado presente esse poder, sempre de forma algo submersa e secreta, e que mesmo na Idade Média tenha sido suficientemente secreto para poder estar acima do alvo visível que era a Igreja, ocultando-se nos seus meandros..."

Como é isso crível?
Como pode admitir que a Igreja Católica seria controlada por uma outra "entidade"?

"tal como provavelmente hoje se ocultará no meio de meandros financeiros."
Cuidado.
Não seja nazi...
Isso é outra conversa...

Com os melhores cumprimentos,
IRF (III e Fim)

De Alvor-Silves a 22.01.2020 às 04:13

Caro IRF,
em muito agradeço os diversos comentários, mais ou menos ácidos, mas bem apresentados, expostos e pensados. Dão para uma boa discussão.

O meu "antropocentrismo" não é opcional, é resultado de ser incontornável outra abordagem, sem avançar com "a prioris", ou dogmas, no seu caso teológicos.
Voltamos à mesma discussão, onde não vamos sair da sua posição de fé.

Sem essa fé, não há outro pensamento que não seja humano.
Os pensamentos, as ideias, são sempre veiculados através de humanos, mesmo que estes clamem terem tido inspiração ou origem alheia. Ao que consta, e nisso sou ignorante, as drogas permitem entrar em estados de alucinação, não experimentados antes, e por isso pode traçar-se a uma planta de canabis a origem de um pensamento?

É claro que não controlamos os pensamentos, e creio que já lhe indiquei o link:
https://odemaia.blogspot.com/2011/08/paradoxo-do-pensador.html

O problema é que esse paradoxo é aplicável a qualquer ser pensante, humano ou sobre-humano. Não pode saber o que vai pensar no futuro, sob pena de todo o pensamento que tivesse naquele instante fosse o seu último pensamento.

Como é óbvio, não estou minimamente sintonizado para a deriva científica, que vê "inteligência artificial" em réplicas de descargas de neurónios, etc:
https://odemaia.blogspot.com/2013/05/de-natura-deorum-2.html

Não vejo que estejamos em desacordo, mas quando escreve:
"O Homem não é sequer capaz de pensar"
... é um manifesto pensamento contraditório em si mesmo, ao ser entendido.

Aquilo em que discordamos é na atribuição da origem externa das coisas.
Não me escandalizaria nada dizer que seria divina, mas não é essa a conclusão a que chego, excepto se identificar Deus ao Universo.
A diferença nesse aspecto é que eu dou o Universo como construído do princípio ao fim - não na actualidade, mas sim na potencialidade. Quando coloca um Deus, deixa um futuro em aberto, incerto perante as decisões divinas. Só que onde está o clique que faz uma decisão e não outra? Tem que estar no próprio Universo, porque nada há para além dele, por definição.

Não é preciso neo-escolástica para isto, tudo aparece mais ou menos como representável logicamente, mas com um formalismo pavoroso.

De qualquer forma é um bom desafio... e claro que não me zango!
Aliás, agradeço a réplica.

Cumprimentos.

De Anónimo a 22.01.2020 às 18:50

Tentado o tal estilo Witgensteiniano:

O Homem não é capaz de pensar na medida em que o faz involuntáriamente e limitadamente.
Tal como os bébés têm pensamentos mais ou menos previsível, inculcados em si pelos próprios genes, não por vontade própria.
O meu argumento era que o pensamento humano é-lhe exterior, uma emanência.
De Deus, do Universo, dos genes... é tudo indeferente... é tudo códigos semânticos para "O Criador do Homem (e de todas as coisas)".

É verdade que sem a fé não há outro pensamento que não seja Humano.
Mas eu não sei se Deus pensa, se quer.
Como o Alvor Silves não pode saber se o Universo pensa.
Mas como o Homem pensa e consegue perceber que a existência pode ser inteligentemente preceptível e compreensível...
O Homem compreende que a sua capacidade de pensar, reconhecer e produzir inteligência não se cinge apenas a si próprio.
De facto, dada a complexidade e inteligência que o Homem testemunha na natureza - e até mesmo que reconhece como necessária para a própria criação do Homem enquanto Homem, e o seu funcionamento natural, etc
Dado tudo isso o Homem não tem alternativa se não concluir que o seu pensamento é meramente uma emanência de uma entidade maior que lhe é exterior.
Emanência essa fonte de toda a natureza, de toda a existência - incluindo a criação do próprio homem.
Tudo isto me parece lógico e claro.
Tem a ver com razão, com inferência, não com fé.
A razão apenas justifica a fé.

http://www.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_14091998_fides-et-ratio.html

Força,
IRF

De Alvor-Silves a 23.01.2020 às 04:39

Caro IRF,
primeiro queria dizer que ainda não respondi aos outros textos, porque por lapso perdi o que tinha escrito, antes de enviar, e falta tempo, e o outro assunto do "controlo humano" ainda tinha só começado a abordá-lo.

Centrando neste tema. Na realidade não vejo discordância, excepto na fé.

Concordamos que a origem do pensamento humano é exterior ao Homem, e daí já os gregos falavam em Musas inspiradoras. Provavelmente até o termo inspiração nos sugere que, sufocados com afazares e tricas, nos falta respirar fundo.

Apesar da fonte ser exterior, não encontramos outra manifestação do pensamento que não seja humana. O que disse ser contraditório seria assumir que não pensávamos, estando a fazê-lo. Percebo que estivesse a falar sobre a origem, mas eu não estava.
Há que distinguir entre pensar, e saber a origem desse pensamento.
É claro que somos afectados por múltiplos detalhes exteriores que podemos associar a mudanças de atenção, e consequentes mudanças de pensamento. No entanto, identificamo-nos com uma certa sequência de pensamentos, e numa grande quantidade de situações até lhes identificamos uma origem.

Nesta perspectiva, o Universo é uma outra palavra para Deus, no sentido em que é perfeito. Mas, a diferença é que não acho que seja por qualquer "vontade própria".
É assim, porque não poderia ser doutra forma. A perfeição é uma inevitabilidade, de se auto-excluírem todos os universos que não o podiam ser.

Do ponto da vista da sua percepção, o IRF identifica-se aos seus pensamentos. Tudo o que lhe é exterior, digamos não-IRF, é o que está fora do seu pensamento.
Eu faço parte desse exterior, desse não-IRF, e você sabe que eu penso, porque o reconhece quando classifica como exterior o que está a ler. Nesse sentido, como faço parte do universo onde está, tem que concluir que este universo pensa, ou pelo menos tem seres pensantes independentes de si, e que o chateiam...

Mas, para além da manifestação de pensamento enviada pelos outros homens, mesmo os nossos próprios pensamentos podem nos fazer sentir desconfortáveis. Ou seja, quando umas coisas não batem certo com outras, ficamos sem perceber... e ou não ligamos, por não ser importante, ou se for mesmo importante, esse conflito de pensamentos vai deixar-nos desconfortáveis, até que o consigamos arrumar de forma sólida.

Esse tipo de pensamentos pode ser originado pela simples fome, medo, injustiça, etc, mas estando o próprio confortável nesses aspectos, mesmo assim, vêm outro tipo de pensamentos apoquentar a malta.
Esses são os pensamentos filosóficos que, quanto mais não seja, aparecem quando o sujeito se vê confrontado com doenças, morte, etc.
Ou seja, é esperado que o sujeito tenha chegado a alguma filosofia que responda a tudo, e não apenas a saber se tem mais uma cerveja no frigorífico.

Além disso, quer queiramos, quer não, chega a adolescência e passamos a ter pensamentos de cariz sexual. Não é por vontade própria que as crianças passam a olhar de forma diferente para os colegas, é porque estão biologicamente condicionadas a essa particularidade animal. Portanto a natureza tem botões evidentes que nos fazem parecer tontos, sendo activados neste caso por hormonas.
Isto para referir que há pensamentos que controlamos, dada a moral, ou enquadramento social. Se os conseguimos enquadrar bem, não há problema.

Há ainda situações em que verificamos quase impossibilidades práticas. Se alguém falar de coisas que não pode saber, como enquadra isso? Nesse particular, tem que aceitar a possibilidade de haver entidades que falam por intermédio de outrem, mas isso não faz delas deuses, santos ou diabos. São apenas desgraçados iguais aos outros.

Cumprimentos.

De Anónimo a 23.01.2020 às 18:10

Concordo consigo em elevado grau...
Mas apuremos:

"É assim, porque não poderia ser doutra forma. A perfeição é uma inevitabilidade, de se auto-excluírem todos os universos que não o podiam ser."

O Universo tende para o caos.
Um prato parte-se em mil bocados insignificantes e inúteis.
Uma explosão ou um terramoto arrasam tudo numa determinada área. Etecetra.
Excusando-me a discutir que a perfeição não existe - seria outra emanência - afirmo-lhe que a perfeição não é uma inevitabilidade.
Inevitabilidade é exactamente o afastamento progressivo e inexorável dessa perfeição. O caminho para o caos. Isso é o normal.

A meu ver, "a perfeição", ou a sua aproximação ou tendência, é prova exactamente que no meio do inevitável e inexorável caminho para o caos, uma "Capacidade Superior" existe e impõe-se, precisamente contra aquilo que é inevitável.

É um milagre diário.
E é aqui - e não na fé - que nós discordamos profundamente. Vemos mesmo as coisas em sentidos opostos.
E penso que é neste sentido que me custa tanto compreendê-lo.

Sim, o Universo tem seres pensantes independentes de mim.
O Alvor Silves é independente de mim.
Mas o Alvor Silves, eu e todos os seres pensantes serão dependentes do "Universo" ou do seu/nosso "Criador".

Cumprimentos, meu caro.
IRF

De Alvor-Silves a 24.01.2020 às 05:49

Sim, de acordo "no concordo, mas discordo".
E, sim, discordo na perspectiva de uma tendência geral para um caos.

Do ponto de vista material, os pedaços, constituintes antes ligados e depois partidos, fazem o que sempre fizeram, ligam e desligam.
Nesse aspecto material, basta enunciar a lei de conservação da massa, ou da energia, para reparar que não há propriamente uma tendência diferente. Foram enunciadas, por se constatar algum equilíbrio nos processos de mudança.

Fora o aspecto material, há uma constante criação de informação, que vai sendo processada pela inteligência. Esse é o aspecto caótico, mas só tem correspondente material macroscópico, no sentido em que os humanos moldam o mundo criando estruturas antes inexistentes. Mas, ao nível atómico, só mudaram alguma coisa quando provocaram reacções nucleares, ou experiências no CERN e similares.

A perfeição é inevitável consequência do universo se justificar a si mesmo.
Quem acredita no acaso, não acredita na perfeição, certamente.
Aqui parecemos inverter papéis...
O acaso é uma sobranceria humana, de quem julga saber tudo, sabendo pouco.
O acaso ocorre porque o modelo que fazemos do mundo é imperfeito, e dá duas ou mais respostas para o futuro. Dá 6 respostas para o dado que rola na mesa, mas como também sabe que só uma vai calhar, diz que é sorte calhar um ou outro. Sem essa antevisão, do que poderia ser - mas não é - não se falaria em sorte.
Toda a física moderna está cheia dessa sobranceria, muita pretensão por coisa nenhuma, ou pouco mais que isso. Têm tudo explicado, não explicando nada.

Eu também fiquei surpreendido quando tive que concluir desta maneira.
Se antes alguém me dissesse que este mundo era perfeito, só poderia pensar que estava a gozar comigo. Mas obviamente estava a ver as coisas numa limitação muito restrita, em que o passado condicionava o futuro e nunca o contrário.
Por exemplo, como o blogue tem a vantagem de ser pouco frequentado, posso aqui dizer que a chacina faz parte da perfeição, mas para isso é preciso entender que se ela não ocorresse, os humanos teriam descontraído o suficiente para não a considerar. Tendo descontraído, não sentiriam necessidade urgente de reflectir sobre si mesmos.
Sem essa auto-reflexão não faziam parte da solução. Porque sem a auto-reflexão, nunca veriam o seu próprio universo. Essa solução é uma não solução, porque o universo tem que ter todas as respostas em si mesmo. Caso contrário, a razão para as coisas ocorrerem de uma forma e não de outra, não existiria. Mas não pode deixar de existir, porque ocorre.
Na prática este universo tem outra particularidade fenomenal... comeu todos os outros universos dentro de si. Porque não deixa de lhes dar espaço... onde? No nosso pensamento. Cada um de nós, com os seus sonhos, ambições, etc... é um embaixador de um universo desaparecido. E como os universos desaparecidos (ou não aparecidos) não têm que ter lógica, esse universo desaparecido, esse sonho potencial, tem a ambição de ser real.
Por isso, há esse lado romântico, de termos um universo vivo, que vive da luta entre universos mortos, pequenas ficções, metidas em múltiplas cabeças.
Têm muito uma particularidade... a megalomania, fruto de visão pequena.
Este universo foi o mais megalómano de todos... e qual foi a sua pena?
- A sua voz ser a voz de todos os finados.
É como ser o último sobrevivente da humanidade, depois de liquidar todos os outros. O que restaria depois de novidade, além de si, senão a memória dos que tinham perecido?

Mas eu não me vejo dependente de nenhuma "criação". Vejo-me como inevitável, como todos os factos que presenciamos. Isto nada tem de especial, está inserido numa ordem das coisas, cuja compreensão nos escapa agora por completo. Mas acho que será possível compreender cada vez melhor.

De Alvor-Silves a 24.01.2020 às 05:49


Agradeço a conversa, porque há múltiplos detalhes que vêm à baila, e que sem a discussão não sentiria necessidade de os referir.
Um ponto importante, é que estando as coisas definidas do princípio ao fim, como experienciamos o tempo, um tempo inacabado?
A única explicação que me satisfez foi a seguinte.
Tudo foi formado, em todas as possibilidades. No entanto, só uma contém explicação de si em si mesma. Foi essa que adquiriu "alma". A explicação das coisas está então neste universo único. O universo voltou a si mesmo, já não para o saber, mas para o compreender. Digamos que antes, na 1ª volta, não havia distinção entra a lágrima da dor e a lágrima do actor. Ambas foram sabidas, mas não entendidas.
Estamos numa 2ª volta, a perceber acima do que antes soubemos, sem alma.
Mas isto é um assunto mais delicado e não cabe num comentário.

Abraço.

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