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Na sequência de um comentário sobre Zheng He, navegador chinês popularizado por Gavin Menzies no livro 1421 - ou seja, o ano em que a China tinha percorrido os mares até ao Atlântico, falei numa hipótese de "ameaça chinesa" à Europa, por essa altura.
O José Manuel fez o favor de indicar um bom documentário da televisão ARTE sobre Zheng He:

O documentário estabelece uma ligação entre Zheng He e o conhecimento árabe de navegação, o que teria permitido aos chineses uma aventura, registada pelo menos certamente até às costas africanas, em particular a Madagáscar (chamada Ilha de São Lourenço, pelos portugueses).
Depois, subitamente, tal como rapidamente havia surgido, o interesse chinês pelas navegações parece desaparecer.
Os tempos são demasiado coincidentes para não se estabelecer alguma relação. Se a China avançava no início do Séc. XV em direcção à Europa, e o ano 1421 é marcante... também é marcante no mesmo período para as navegações portuguesas, que em 1418 e 1419 registam o Porto Santo e a Madeira.
Portanto, se uns avançavam numa direcção, outros avançavam na outra - terá havido recontros?
É difícil saber porque à época seria possível registar como "mouro" tudo o que fosse inimigo.
No entanto, não é de excluir que a ameaça asiática estivesse na ordem de partida papal em direcção ao Sul.
O tempo que demora a passagem do "Cabo Bojador" é tão fictício que pode corresponder a várias interpretações, enquanto alegoria de outro facto. Se já estabeleci um paralelismo entre as navegações africanas e americanas, podendo isso corresponder a uma tentativa de descoberta de passagem ocidental para as Índias (ao jeito de Colombo), talvez seja mais verosímil pensar numa autorização de passagem, libertada a ameaça chinesa nas costas africanas.

Numa recensão crítica à obra de Menzies (feita por J. M. Azevedo e Silva), podemos ler:
Em boa verdade, os portugueses começaram a descobrir «mares nunca dantes navegados» em 1434, quando Gil Eanes dobrou o Cabo Bojador, precisamente (pura coincidência?) no ano seguinte ao fim das navegações chinesas do almirante Zeng He (1405-1433).
Portanto, aquelas duas palavras com interrogação "(pura coincidência?)" são uma forma abreviada de sugerir algo semelhante... O Bojador teria sido um "cabo de trabalhos" com vista a libertar a parte ocidental de África da presença chinesa.
Segue-se outro problema, que seria libertar mesmo a parte oriental, e assim permitir o avanço para a Índia, esse cabo de trabalhos seria o da Boa Esperança.
Se esses "cabos de trabalhos" foram apenas diplomáticos ou representaram violentas acções de guerra naval... é algo difícil de estabelecer.
Porquê?
Porque nada justifica os mais de 50 anos entre a passagem do Bojador e a chegada ao Cabo da Boa Esperança... conforme já se disse, era mais rápido ir a pé, pela praia... bastariam 1 ou 2 anos, a caminhar sem grandes pressas - é só fazer contas.
Ao contrário, quando Vasco da Gama entra no Índico, deveria deparar-se com uma poderosa ameaça naval, e essa viagem é feita sem problemas demasiado dramáticos.
Portanto, poderia bem ter ocorrido que a ameaça naval tivesse sido debelada ao tempo de D. João II, deixando o Oceano Índico pacificado para a entrada de Vasco da Gama.

Por outro lado, devemos reparar na história dos descobrimentos que é divulgada, começando na figura de Marco Polo, que visita Kublai Khan, numa viagem de 1271 a 1295.

Tal como Marco Polo se consegue entender com Kublai Khan, também o mestre dos Templários, Jacques de Molay, vai solicitar uma ajuda do Império Mongol na Terra Santa, levando uma ofensiva conjunta contra os mamelucos árabes em 1300.
Em 1305 começam os problemas do rei Filipe, o Belo, com os templários, que por ordem papal são extintos e Jacques de Molay será executado em 1314.

No entanto, os templários têm uma passagem melhor conhecida pelo lado português, e menos bem conhecida pelo lado inglês-escocês, mistificada pela Rosslyn Chapel.
No lado português estabelece-se a Ordem de Cristo, e inicia-se o projecto de D. Dinis.
Pelo outro lado, digamos que o rito escocês é menos explícito com o nome "Soberano Grande Inspector Geral", mas quando o rito de York estabelece como máximo grau "Ordem dos Cavaleiros Templários", não há dúvidas que a herança da Maçonaria remete a essa origem.
É claro que houve duas rosas no confronto Lancaster-York, mas depois Tudor ficou bem juntando as duas com Tosão de Ouro.

Este é o panorama pelo lado europeu. Porém, desde a entrada dos Hunos, a ideia de ameaça mongol deveria permanecer, e os impérios de Tamerlão e Gengis Khan seriam ameaça renovada.
O filho Kublai Khan tenta invadir o Japão, mas a armada é desbaratada pelos ventos Kamikaze (que darão depois origem ao nome dos pilotos). Porém, a frota naval terá sido implementada em grande escala, e é natural que menos de 100 anos depois, ainda não se tivesse perdido a ideia de uma China potência naval.
Esse seria o projecto que levaria Zheng He até África, e muito provavelmente até às Américas, já que parecem existir vestígios, e não só na zona do Pacífico, em Fusang.

Cito aqui o blog Portugalliae do José Manuel (2009):
(...) Gunnar Thompson questiona porque atribuem a descoberta da América a Colombo se romanos e os portugueses já conheciam a Florida? Actualmente ele defende que os chineses também lá iam, eu digo TODA a gente lá ia e voltava, a peste e guerras reduziu substancialmente a população na Europa, portanto não havia interesse de se dar a conhecer territórios vastíssimos no Continente Americano, os mapas que se conheciam eram segredos de comércios, malagueta milho peru drogas metais etc. eram trazidas para as cortes europeias, e egípcias, isto está documentado, só não vê quem não quer.
Ora, este propósito de evitar perda de população - ou pior, perda do controlo da população, era algo que sempre pareceu preocupar os poderes, desde o velho Senado de Cartago (conforme refere Aristóteles), até mesmo os chineses, conforme refere João de Barros.
João de Barros, falando da Batachina - que queria dizer terra da China - mas que era normalmente usada para as Celebes (Batachina do Moro, havendo também a Batachia do Muar), diz explicitamente (Década Terceira da Ásia, Livro V, cap. 5):
Depois que estes Chijs começaram continuar a navegação destas ilhas, e gostaram deste seu cravo, da noz, e massa de Banda, à fama deste comércio acudiram também os Jáos e cessaram os Chijs. E segundo parece foi por razão de lei que os Reis de China puseram em todo seu Reino que nenhum natural seu navegasse fora dele: por importar mais a perda da gente e cousas que saíam dele, que quanto lhe vinha de fora: como já atrás escrevemos, falando das cousas da China e conquista que tiveram na Índia por razão das especiarias.
É especialmente notável o papel que as pequenas 5 ilhas Molucas, juntamente com as minúsculas ilhas de Banda, tiveram no desenvolvimento comercial mundial. Não sei se é coisa maluca ou de ficar de cara à banda, mas o cravo e a noz-moscada ganharam estatuto de preciosidades superior a ouro... algo só com paralelo na Tulipomania!
Havia um mecanismo de produção, que fazia os saquinhos em Gilolo, e as panelas de barro em Pulo Cabale (Pulo seria nome para ilha, e Cabale para panela)... portanto temos um mecanismo de exportação que usava os indonésios (Jáos) para distribuir depois, ou pela China, ou pela Europa, pela rota da Seda até Veneza, antes do aparecimento português.

Bom, e onde estavam situadas estas ilhas especializadas em comércio global?
Exactamente na zona da Oceania ao lado de uma Papua - Nova Guiné ou de uma Austrália, em que ao contrário, os seus habitantes viviam praticamente como no Neolítico. Algo que só ali teria mudado, de acordo com João de Barros, devido à presença chinesa nas Molucas, e provavelmente em toda a zona marítima oriental ao tempo de Zheng He.

Quando os portugueses ali chegam começa novo período de restrições nas descobertas.
Esta difícil conquista das Molucas é levada por António Galvão, de que já aqui falámos... e que depois cairá em desgraça, quando regressado à corte lisboeta, sempre pronta a cortes.
De novo coloca-se a questão de Tordesilhas pelo anti-meridiano, e se algo poderia justificar inicialmente um encobrimento, a presença espanhola naquelas ilhas da Melanésia também irá acontecer após a viagem de Magalhães, numa partilha entre o imperador Carlos V e D. João III.

Dado o interesse nas Molucas, que a sul do Mar de Timor têm a Austrália, na zona da cidade de Darwin, parece algo incompreensível o desinteresse. Já sabemos das proibições, nomeadamente da Companhia da Índias Holandesa, dos mapas alterados, de que se queixou Dampier e tantos outros...

Achámos curioso o relato de Manoel Pimentel (Arte de navegar, 1752, pg.440), que diz, acerca da restrição de estar na parte sul de Timor apenas nos três meses de Verão (Fevereiro a Abril):
Este vento Sul é tão impetuoso que colhendo algum navio daquela parte do Sul [de Timor], o faz soçobrar ou dar à costa, mas a natureza acudiu a este perigo com tal providência, que oito, ou nove dias antes da mudança do tempo começam a soar debaixo do mar, da parte donde há de ventar, uns roncos, que os naturais da terra e navegantes têm por certo aviso
Acresce ainda que no seu livro (pág. 439) Pimentel diz que o melhor caminho para Timor seria, é claro, navegando directamente de África após o Cabo da Boa Esperança... indo encontrar rapidamente a Nova Holanda (Austrália), e até mais rapidamente do que indicavam as cartas ("por força das correntes").
Especificamente, indica a latitude de 21 a 22 graus, e que se evitasse o baixio "Trial", indo encontrar a "Terra Nova" a 1350 léguas portuguesas...

Vemos aqui que "Terra Nova" foi designação que se aplicou também à Austrália... como tantas outras já especuladas desde Java-a-Grande, Terra Magalanica, ou mesmo Nova Guiné.
Aconselhamos um livro de G. Collingridge (1895)
Being The Narrative of Portuguese and Spanish Discoveries in the Australasian Regions, between the
Years 1492-1606, with Descriptions of their Old Charts.

que tenta mostrar a presença portuguesa na Austrália. É claro que tentativas destas parecem sofrer o escárnio e maldizer da academia portuguesa, que se preocupa mais em abafar e perder registos históricos.
Assim no final usamos a citação dos Lusíadas de Camões, que refere Sunda (Java, que deu nome ao estreito) e Banda (a sul está a Austrália):

Olha a Sunda tão larga que uma banda
Esconde para o Sul dificultoso

... e foi assim que Collingridge abriu o seu livro - com Camões!


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publicado às 07:59


1 comentário

De José Manuel de Oliveira a 24.01.2014 às 00:38

Boa noite,

Goste de ler a sua Batochina, gosto muito de geopolítica, e antropologia,
Ainda há muitas cavernas na Austrália com petróglifos para “descobrir”...
Uma discrição do site da Marinha de Guerra Portuguesa sobre uma batalha no Mediterrâneo em que um único navio português da armada cristã destrói a totalidade duma numerosa esquadra turca dá para perceber o que eram os canhões de carregar pela culatra das caravelas do tempo de D. João II, até aqui neste ponto houve ordem de retrocesso, pois abandonaram o sistema durante séculos... bom isto dá para entender o que aconteceria ao eunuco turco dos navios tesouro chinês se se cruzassem com uma armada portuguesa, é fácil de imaginar, pois os ingleses esmagaram e puseram de rastos o Império do Meio com artilharia naval de longo alcançasse, guerras dos ópios.

Mas aparentemente isto de batolamdias já vem de longe e Portugal é herdeiro

Boas leituras, cumprimentos, José Manuel CH-GE

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