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Surge este texto a propósito do comentário de MBP a um outro comentário de Maria da Fonte, que coloquei nesse postal, e que de certa forma falava de uma possível "conspiração" financeira veneziana, que poderia estar ainda na origem da maçonaria internacional.

Em particular, MBP destacou um vídeo:
«Gostaria também de partilhar as fontes que recentemente tenho usado para analisar o enquadramento deste período (mas não só) que se resumem ao trabalho realizado pela fundação La Rouche. Deste enorme trabalho destaco para já este vídeo do historiador Webster Tarpley, e que teve ressonância na minha pessoa pelo facto de colocar a Epistemologia como alvo prioritário do "ataque" à verdade, coisa que o Jung também defendia mas de outra forma.» 
"The Venetian Conspiracy" by Webster Tarpley

Como não é muito habitual ver um trabalho de fundo sobre os bastidores, do que é publicitado e divulgado como verdades inquestionáveis, questionando o trabalho científico de dois "monstros consagrados da ciência", como foram Galileu e Newton, é especialmente interessante ver Webster Tarpley reduzir estas duas figuras a papéis menores, de simples agentes a soldo dos conspiradores venezianos. Mais notável, dá nomes, segue os registos, e aponta culpados para essa conspiração veneziana que transferir o poder para o Império Britânico, então em processo de formação, com a rainha Isabel I. 
Desses vários nomes apontados, destacam-se especialmente dois - Paolo Sarpi (1552-1623), e depois Antonio Conti (1677-1749). 
Quanto a Sarpi está documentado que foi patrono de Galileu, e quanto a Conti terá defendido Newton na disputa que houve com Leibniz, mais tarde, sobre a invenção do cálculo diferencial e integral.
Mas Tarpley não fica por aqui, diz algumas coisas que eu já sabia e outras que foram novidade. Vou enumerar alguns casos, que são suficientemente elucidativos, como se não soubéssemos já de tantos outros (... que vão das máquinas a vapor, às baterias eléctricas, presentes desde a Antiguidade). 

Galileu e o Telescópio
Por exemplo, começando com Galileu, Tarpley questiona a "sua" invenção do telescópio, algo que já é aceite, pois sabe-se da existência de telescópios na Holanda em 1608, em pelo menos três casos (um Hans Lippershey, outro Zacharias Janssen, fabricantes de óculos em Middelburg, e ainda de Jacob Metius of Alkmaar). No entanto, para preservar o mito diz-se que Galileu melhorou os aparelhos holandeses, com o propósito original de observar os planetas.
No entanto, Tarpley aponta Leonardo da Vinci como já tendo usado um telescópio para estudar planetas, como aliás podemos ler aqui:
Isaac Newton developed the design for his reflecting telescope in 1668. Newton's idea of building telescopes using mirrors instead of lenses was not new. The magnifying effect of concave mirrors had been put to practical use as reading aids by medieval monks centuries before (c. 1300). Leonardo da Vinci had used concave mirrors to study the planets more than a century earlier (1513). 
A referência é a Newton e não a Galileu, porque se fala do telescópio reflector, que é normalmente creditado a Newton, 60 anos mais tarde, mas que é aqui atribuído a Leonardo da Vinci, um século antes de Galileu, e 155 anos antes de Newton.
Acreditar que Leonardo da Vinci era um génio, é uma simplificação do problema... tal como Leonardo se "inspirou" em tantas coisas de Vitrúvio, é bem natural que estivesse apenas a transcrever outros tantos trabalhos "perdidos" no incêndio da Biblioteca de Alexandria. 

Não é fácil entender como foi possível a humanidade ter ficado presa durante mais de mil anos, com conhecimento encerrado em "livros proibidos", mas esta particularidade foi ilustrada por Umberto Eco no romance/filme denominado "Nome da Rosa".
Com efeito, como diz MBP, não é difícil concluir que o problema é essencialmente filosófico (ou epistemológico), como tinha dado conta o Padre Agostinho de Macedo, ao criticar a maçonaria (ver os textos "de natura deorum", que escrevi no Odemaia).
Tendo esse antecedente, depois as "descobertas", ou melhor "redescobertas", foram convenientemente creditadas a alguns "génios", que pouco mais foram do que serviçais úteis, para tentar libertar o conhecimento guardado pelo Vaticano, durante milénios.

Não haverá muitas dúvidas que, dada a qualidade da produção vidreira romana, seria muito estranho que os Romanos não tivessem telescópios de grande qualidade. Ou, como diria Lewis Carroll, de forma enigmática, na sua Alice no País das Maravilhas: 
«I must be shutting up like a telescope.»
(Devo-me estar a calar/fechar como um telescópio.)
... e foi isso que se terá feito, toda a gente se calou, como se calaram os telescópios durante milénios.

A gravidade do problema
Tarpley é especialmente incisivo na crítica a Newton, sendo sabido e reconhecido que o seu interesse especial era pela Alquimia - o que leva Tarpley a classifícá-lo como herdeiro da Magia Negra dos antigos magos da Caldeia ou Babilónia. 
Tal como Copérnico e Galileu, ao defender o heliocentrismo, não estavam a dizer nada que não tivesse sido dito por Aristarco de Samos, quase dois milénios antes, e que Pedro Nunes terá classificado de "irrelevante" para a Geografia (conforme é); também a Newton a única maçã que lhe terá caído na cabeça terá sido uma maçã dada por maçãos. Que Kepler tinha enunciado as leis do movimento planetário, e a diferença é pequena, não há grande dúvida... mas se Kepler se socorreu das observações cuidadas de Tycho Brahe, essas observações seriam disponíveis desde a Antiguidade, pelo mesmo desde o tempo dos Caldeus.
As considerações sobre a queda dos graves, começadas por Galileu, eram especialmente graves porque a gravidade era ter o assunto arrumado e esquecido, ainda que muito antes Duarte Pacheco Pereira faça considerações similares a Galileu.

Integrar e diferenciar
Outra polémica a que Tarpley dá destaque é a da disputa de Newton com Leibniz, que terá sido Antonio Conti a resolver favoravelmente a Newton.
Convém lembrar a este propósito que o cálculo matemático ficou durante dois milénios preso a construções com régua e compasso... ainda que outras abordagens tivessem sido propostas, nomeadamente por Arquimedes, ou pelo seu antecessor Eudoxo. Se essa linha tivesse sido seguida então pelos gregos, todo o cálculo redescoberto por Descartes, Leibniz e Newton, pertenceria à Antiguidade. 
No entanto, para diferenciar a malta, foram colocados problemas "milenares", como a famosa "quadratura do círculo", cujo interesse era muito mais causar uma dificuldade excessiva, com interesse limitado. Esse problema só foi resolvido no Séc. XIX, e estou convencido que demorou mesmo muito tempo a ser resolvido... Não sei se foram problemas resolvidos pelos próprios a que são creditados, ou foram resolvidos algum tempo antes por outros anónimos, caídos convenientemente no esquecimento.  
A resolução desses problemas milenares corresponde ainda a um desenvolvimento ímpar da tecnologia a nível mundial. Subitamente, o que estava escondido apareceu, umas coisas atrás das outras, sendo particularmente notável as décadas de transição antes e após 1900. A paragem desse desenvolvimento terá ocorrido com a 1ª Guerra Mundial, e especialmente com a 2ª Guerra Mundial, dado que a Alemanha não respeitou a paragem, e continuou a libertar o "génio" da garrafa, contrariando outras ordens... integrando não apenas o génio, mas também se diferenciando pelo mau génio!
Portanto, também me parece que, no máximo, Leibniz estaria a repisar descobertas antigas, mesmo que não o soubesse. Ou seja, se Tarpley salienta a fraude de Newton, não me parece que Leibniz esteja isento de suspeição similar. Convém ainda notar que há conclusões que Pedro Nunes apresenta, e que muito dificilmente seriam deduzíveis sem conhecimento do tal cálculo, que só seria descoberto no século seguinte.

A conexão Veneziana
A relação deste assunto com uma conexão veneziana, que eu saiba, é mérito de Tarpley, dado que estabeleceu até quais os personagens venezianos que serviram de promotores, nomeadamente de promotores da ascendência do Império britânico. Por outro lado, também pelo lado de Veneza temos todo um historial da banca, ligado a acontecimentos chave, que a Maria da Fonte relatou. Portanto, essa conexão poderá estabelecer-se.

Mas podemos ir um pouco mais longe, notando que a região do Veneto, era anteriormente conhecida como Gália Cisalpina, onde Celtas se impuseram a Etruscos. E esta ligação aos Venetos, é tanto mais particular, já que os Venetos habitavam ainda a região da Normandia, e segundo Júlio César, eram hábeis navegadores (ver Conan-o-bretão). Não é ainda de excluir que estes mesmos Venetos não fossem mais que uma remniscência fenícia, resultado de navegações ao longo da costa atlântica e mediterrânica.
Essa é a parte mais antiga, de conexão mais dúbia, mas já é mais claro que no decurso das invasões bárbaras, e a pretensa queda de Roma, uma variante do poder cortesão romano tivesse feito de Veneza um ponto estratégico para combater uma Roma que seria o centro de um obscurantismo cristão. As frequentes disputas internas em Itália pelo controlo papal, entre Génova e Veneza, foram outro desses aspectos.

No entanto, nesta conexão não há propriamente uma ligação que se prenda à região de Veneza. Ou seja, não se exporta facilmente um controlo com base numa cidade estrangeira. Por isso, se outros reinos acabaram por adoptar essa influência veneziana, não foi por comungarem de ideias para uma pátria em Veneza. O que se parece encontrar é um ponto comum de filosofia/região, que usou Veneza como posto de influência, mas terá origem noutro lugar.

Aditamento (18/11/2016):
Coloco nos comentários um texto integral de Webster Tarpley, que aborda os mesmos assuntos, e cujo PDF pode ser lido aqui: Schiller Institute (Archive, 1995).

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publicado às 05:13


21 comentários

De Alvor-Silves a 19.11.2016 às 11:23

The League of Cambrai soon included France, Spain, Germany, the Papacy, Milan, Florence, Savoy, Mantua, Ferrara, and others. At the battle of Agnadello in April 1509, the Venetian mercenaries were defeated by the French, and Venice temporarily lost eight hundred years of land conquests.
Venetian diplomacy played on the greed of the Genoese Pope Julius II Della Rovere, who was bribed to break up the League of Cambrai. By rapid diplomatic maneuvers, Venice managed to survive, although foreign armies threatened to overrun the lagoons on several occasions, and the city was nearly bankrupt. Venice’s longterm outlook was very grim, especially because the Portuguese had opened a route to Asia around the Cape of Good Hope. The Venetians considered building a Suez canal, but decided against it.
One result of the Cambrai crisis was the decision of Venetian intelligence to create the Protestant Reformation. The goal was to divide Europe for one to two centuries in religious wars that would prevent any combination like the League of Cambrai from ever again being assembled against Venice. Thus, the leading figure of the Protestant Reformation, the first Protestant in modern Europe, was Venice’s Cardinal Gasparo Contarini, who was also the leader of the Catholic Counter-Reformation.
Contarini was a pupil of the Padua Aristotelian Pietro Pomponazzi, who denied the immortality of the human soul. Contarini pioneered the Protestant doctrine of salvation by faith alone, with no regard for good works of charity. Contarini organized a group of Italian
Protestants called gli spirituali, including oligarchs like Vittoria Colonna and Giulia Gonzaga. Contarini’s networks encouraged and protected Martin Luther and later John Calvin of Geneva. Contarini sent his neighbor and relative Francesco Zorzi to England to support King Henry VIII’s plan to divorce Catherine of Aragon. Zorzi acted as Henry’s sex counselor. As a result, Henry created the Anglican Church on a Venetian-Byzantine model, and opened a phase of hostility to Spain. Henceforth, the Venetians would use England for attacks on Spain and France. Zorzi created a Rosicrucian-Freemasonic party at the English court that later produced writers like Edmund Spenser and Sir Philip Sidney.

Contarini was also the leader of the Catholic CounterReformation.
He sponsored St. Ignatius of Loyola and secured papal approval for the creation of the Society of Jesus as an official order of the Church. Contarini also began the process of organizing the Council of Trent with a letter on church reform that praised Aristotle while condemning Erasmus, the leading Platonist of the day. The Venetians dominated the college of cardinals and created the Index of Prohibited Books, which banned works by Dante and Aeneas Silvius Piccolomini (Pope Pius II).
As the Counter-Reformation advanced, the Contarini networks split into two wings. One was the pro-Protestant spirituali, who later evolved into the party of the Venetian oligarchy called the giovani, and who serviced growing networks in France, Holland, England, and Scotland. On the other wing were the zelanti, oriented toward repression and the Inquisition, and typified by Pope Paul IV Caraffa. The zelanti evolved into the oligarchical party called the vecchi, who serviced Venetian networks in the Vatican and the Catholic Hapsburg dominions. The apparent conflict of the two groups was orchestrated to serve Venetian projects.

A New Approach To Destroy Science
During the decades after 1570, the salon of the Ridotto Morosini family was the focus of heirs of the pro-Protestant wing of the Contarini spirituali networks. These were the giovani, whose networks were strongest in the Atlantic powers of France, England, Holland, and Scotland.
The central figure here was the Servite monk Paolo Sarpi, assisted by his deputy, Fulgenzio Micanzio. Sarpi was the main Venetian propagandist in the struggle against the Papacy during the time of the papal interdict against Venice in 1606.

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