Há uma questão relativa aos Neandertais que é razoavelmente estranha - não se encontrarem ossadas suas em paragens africanas. A questão é tanto mais estranha, porque como o nível da água estaria uns 200 metros mais baixo, permitiria uma passagem facilitada do Estreito de Gibraltar, podendo mesmo supor-se que a passagem pode ter chegado a estar fechada.
No entanto, apesar de Gibraltar ter sido um dos primeiros locais onde se encontraram Neandertais, falando-se mesmo em "Neandertais de Gibraltar", é curioso que não tivessem dado um pequeno salto que os levaria ao Norte de África.
Convém recordar que nessa altura da Idade do Gelo, é considerado que a região do Saara seria bastante fértil, e com comida abundante, ou seja, muito diferente do deserto que se tornaria depois.
Uma hipótese possível é que os Neandertais não fossem adeptos de aventuras aquáticas... algo que acontece com todos os grandes primatas, excepto os humanos, ou melhor, os Sapiens.
Como o Estreito de Gibraltar tem uma profundidade que varia entre 200 e 400 metros, poderia estar no limite de passagem, e bastaria sofrer algumas oscilações para permitir ou vedar a ligação. Se os Neandertais não se aventurassem em expedições aquáticas, isso seria justificação suficiente, mesmo que a margem oposta fosse bem visível.
Mas queria juntar aqui algumas pinturas rupestres que se encontram em Portugal, e que fazem parte de outra particularidade, que já referimos - a abundância de cavernas com pinturas em Espanha, parece que termina misteriosamente, ao passar-se a fronteira para Portugal.
Os exemplos são muito escassos, e agradeço que quem souber de mais, os indique.
Lapa dos Gaviões Sobre a Lapa dos Gaviões já falámos, e juntamos aqui apenas para não a esquecer no conjunto.
São as três seguintes, que não conhecia, que foram alvo de uma publicação "recente", associada à tese de mestrado da arqueóloga Luísa Teixeira, natural de Alijó.
Já sabemos que o passado não tem vida fácil em Portugal, mas algumas destas pinturas rupestres foram identificadas há muito tempo... e para o mal e para o bem, foram deixadas como estavam, com a degradação natural de estarem expostas ao tempo.
Uma grande laje de pedra está no Cachão da Rapa, junto ao rio Douro, bastante próximo da linha de caminho de ferro. Os seus desenhos foram transcritos em 1735 pelo padre D. Jerónimo Contador de Argote, ou seja, há quase 300 anos... mas apesar desse interesse, depois da lavagem cerebral imposta pelo Marquês de Pombal, praticamente passam por desenhos desconhecidos da população, ainda hoje.
Estas pinturas chegaram a ser dadas como desaparecidas, vindo depois a ser reencontradas c. 1930,
Também assim podemos ver que o caso das figuras de Foz Côa foi um caso singular na preservação e divulgação do passado histórico em Portugal.
Ainda assim, em 1943 foram classificadas como Monumento Nacional, caso diferente do que veremos de seguida.
Quanto às inscrições, estão agora muito esbatidas, mas ainda se nota uma invulgar composição de cores em padrões geométricos, que não sendo escrita, é muito provável que se trate de uma planta de antiga aldeia pré-histórica (com datação atribuída ao 2º ou 3º milénio a.C.).
No entanto, esta hipótese de ser uma planta é mera suposição minha, já que como é óbvio, oficialmente não é dada qualquer interpretação às figuras desenhadas.
Cachão da Rapa pelo Contador de Argote e reencontro das inscrições nos anos 30.
Neste outro caso houve também uma proposta recente de classificar o Abrigo rupestre de Pala Pinta como Monumento Nacional. Porém, conforme se lê na página da Direcção Geral do Património Cultural (a que remete o primeiro link):
"Despacho de 20-02-2012 da subdiretora do IGESPAR, I.P. a determinar a reanálise da categoria de classificação pelo órgão consultivo, por considerar a classificação como MN desadequada "
Portanto, em vez de Monumento Nacional, Pala Pinta foi classificada apenas como "Sítio de Interesse Público".
No entanto, podemos ver que as inscrições são notáveis, únicas em Portugal (que eu saiba), revelando aquilo que pode ser considerado representações solares, ou a isso se assemelhando.
Abrigo rupestre de Pala Pinta - inscrições que se assemelham a "sóis".
Terminamos com inscrições rupestres que estão num abrigo próximo do antigo Castelo Templário de Penas Róias, um dos castelos que se encontra desenhado no Livro de Fortalezas de Duarte d'Armas.
Será especulativo fazer a associação que a presença de um Castelo Templário naquelas paragens, fora de perigo de incursões árabes, estivesse ligada à presença dos vestígios rupestres. No entanto, convém não esquecer que os principais locais templários, antes da sua extinção, estavam localizados no sul de França, zona especialmente rica em vestígios rupestres.
Sobre este local não encontrei nenhuma tentativa de classificação - nem como monumento, nem como sítio de interesse público... aparentemente o que parece haver notoriamente é uma total falta de interesse dos responsáveis. A única coisa que fazem para proteger os locais, parece ser mantê-los fora de qualquer divulgação ao público.
As formas desenhadas, em vermelho ocre, podem ter alguma interpretação como figuras antropomórficas, mas também podem tratar-se de símbolos complexos.
Ruínas do Castelo Templário de Penas Róias
Pinturas rupestres num abrigo de Penas Róias. (imagens)
Haveria ainda que fazer pelo menos referência à Gruta do Escoural que se mantém como o único caso de vestígio de pinturas rupestres dentro de uma gruta, e não apenas como inscrições em abrigos, ao ar livre, havendo ainda notáveis inscrições nos menires e nalgumas pedras de antas.
Se foram encontrados outros vestígios em grutas, parece que ao contrário de Espanha, deste lado da fronteira não se encontra sinal de vida.
Finalmente deixo um vídeo feito por Luísa Teixeira, relativo a estes:
Sim, João Ribeiro, boa observação! Esqueci-me de referir essa hipótese, que nesse caso é até muito mais pertinente. Tudo depende da datação feita, conforme li na tese (p. 77):
"Apresentando semelhanças com representações datadas do III e II milénio a.C. e havendo cerâmica idêntica em vários locais de Trás-os-Montes datada do III milénio a.C., podemos concluir que as pinturas do abrigo do Cachão da Rapa poderão remontar ao III milénio a.C."
... os romanos estavam um bocado excluídos da situação. Mas é um facto que a típica disposição militar em quadrado, das legiões romanas, poderia ser representada daquela forma. Por outro lado, a datação parece baseada num "achar que"... e não é propriamente confiável.
Há diversas teorias, umas mais plausíveis que outras. Uma que refere tratar-se de uma invocação a um santuário (p. 81):
"Segundo M. de Jesus Sanches (1997), o Cachão da Rapa, pode ter tido um importante significado a nível regional, associado a um santuário rupestre, inserindo-se na mesma rede do povoamento do Castelo de Ansiães, ou na de outros povoados similares."
Depois há até considerações sobre o padrão do traje dos arlequins (em xadrez)... enfim é um fartote de imaginação, o que não quer dizer que estejam certas ou erradas!
Já agora, conforme é notado no site: https://www.geocaching.com/geocache/GC1B2AD_fraga-pintada-do-cachao-da-rapa
... o achado é muito anterior ao de Altamira, tendo sido descoberto em 1706, e trata-se provavelmente de uma das primeiras sinalizações de pinturas pré-históricas. É claro que não tem o poder representativo de Altamira, porque se trata apenas de invocação simbólica, não realística. Talvez nesta fase já tivessem abandonado as pinturas literais, que vemos em Foz Côa, ou porque eram um povo diferente, ou porque evoluíram nesse sentido.