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aqui falei sobre a Gazeta de Lisboa, a propósito do Terramoto, e também sobre a sua interrupção na altura da Guerra Fantástica, porque qualquer notícia nessa altura, por muito manipulada que fosse, dificilmente conseguiria ser positiva para o Marquês. 
Assim, durante o período pombalino, "fazer a Gazeta", seria o equivalente a não fazer nada, dada a sua completa supressão.

O que trago aqui são as notícias do chamado "Processo dos Távoras", mas que como poderemos perceber pela leitura da Gazeta, foi no máximo um "processamento" julgado em uma ou duas semanas, mais correspondendo mais ao significado de "Assassinato".

Coloco as transcrições exactamente como estão na Gazeta, e deixo só os títulos como meu comentário de desabafo histórico, ao que ali é dito.

Setembro 1758: O Rei D. José deu uma queda, mas tomou um remédio e está melhor 
Gazeta de Lisboa N.º 37, 14 Set. 1758 (pág. 296): «El Rey nosso Senhor por cauza de huma queda que deu dentro do seu Palacio, se sangrou no dia quatro deste mez e por beneficio do dito remedio, que logo lhe foy applicado, tem S. Magestade conseguido todas aquellas milhoras, que todos os seus fieis vassallos lhe dezejamos, e havemos mister.»
Outubro/Novembro 1758: O Marquês de Távora é primoroso nas celebrações militares
Gazeta de Lisboa N.º 45, 9 Nov. 1758 (pág. 359): (Chaves, 8 de Outubro) «Por ordem do Excelentissimo e Illustrissimo Marquez de Tavora Director general da Cavalaria do Reyno se benzerão a 4 do corrente os Estandartes do Regimento de Dragões desta Praça, de que he Coronel João de Távora Comendador na Ordem de Maltha, e irmão do Excelentissimo Marquez; e como as festas solemnes tem vesperas, se começaram estas por uma cavalgada à Mourisca na qual se convidaram todos os Officiaes mutuamente, e com galantaria para a celebração desta festa, o que se determinou com huma escaramuça de dous fios, primorosamente executada. (...)»
7 de Dezembro 1758: É melhor ter um General mação a comandar as tropas
Gazeta de Lisboa N.º 1, 4 Jan. 1759 (pág. 7): (Almeida, 7 de Dezembro) «Chegou a esta Praça hum Correyo da Corte no dia 29 de Novembro com a faustissima noticia de haver sua Majestade Fidelissima promovido ao Posto de Mestre de Campo General dos seus Exercito, a Manuel Freire de Andrade, Governador das Armas desta Provincia da Beira, e desta Praça. (...)»
24 de Dezembro 1758: O Rei está bem, (h)ouve missa e há beija-mão institucional
Gazeta de Lisboa N.º 1, 4 Jan. 1759 (pág. 7): (Lisboa, 4 de Janeiro) «Certificada a mesa de Santo Antonio desta Cidade da melhoria de Sua Magestade Fidelissima por expressam do seu Cordial contentamento, fez cantar na Real Caza do mesmo Santo no dia 24 de Dezembro huma acçam de graças a Deos nosso Senhor, por haver conservado ao nosso muy Piedozo Monarca (...)
Na primeira Oytava do Natal recebeu o Rey nosso Senhor o cumprimento de boas festas de todos os Embayxadores, e Ministros das Potencias Extrangeiras (...) e todas as pessoas Reaes beijarão a mão com o mesmo motivo, todos os grandes, e senhores da Corte, e toda a Nobreza de destinção Eclesiastica, e Secular; e foi muito extraordinario o concurso.»
31 de Dezembro 1758: A Nobreza de Aveiro soube do bárbaro insulto ao Rei e dá-lhe graças. Portanto, presume-se que o Duque de Aveiro a duas semanas de ser executado, estivesse a celebrar.
Gazeta de Lisboa N.º 2, 11 Jan. 1759 (pág. 16): (Aveiro, 31 de Dezembro) «Fazendo-se publica nesta Villa noticia, q nella se recebeu com universal alvoroço, e se festejou tres dias com os repiques dos sinos de todas as Parroquias, e Conventos, de se achar nosso Augusto, e fidelissimo Monarca livre da queixa, que lhe rezultou do barbaro insulto, que se lhe fez. Determinou o  M.R.P. Prior do Convento de S. Domingos fazer huma acção de graças na sua Igreja (...) Discorreu sobre elas, e sobre o assunto da festividade com a sua notória eloquência, e notável engenho deyxando admirado todo o grande concurso de gente, que o ouviu, e constava o Clero, Magistrado, e Nobreza de toda esta grande Villa, e de huma innumeravel quantidade de seu Povo.»
11 de Janeiro 1759: A Família Real está fina e pensa ir a Salvaterra divertir-se a caçar. Sim, daqui a dois dias dará um espectáculo em Belém, mas é surpresa! O Senado de Lisboa pode saber, pelo regozijo com que tomavam a notícia... de não estarem no palco.
Gazeta de Lisboa N.º 2, 11 Jan. 1759 (pág. 16): (Lisboa, 11 de Janeiro) «SS.MM. Fidelissimas, a toda a Familia real logrão actualmente saude perfeita no sitio do Alto da Ajuda, e se diz que passarão brevemente a Salvaterra para ali se divertirem no exercicio da cassa. O Senado da Camara desta Cidade, querendo fazer huma demonstração do gosto, com que todos os moradores della receberam a certeza da milhoria do muito Augusto Rey nosso Senhor, fez cantar na sesta feira 5 do corrente na Igreja dos RR. PP. Capuchos de Santo Antonio, de que he Padroeiro o Te Deum Laudamus muy solemnemente, precedido de hum erudito e elegante sermão, recitado pelo R.P. Manuel de Jesus, Mestre actual de moral, cuja eloquencia na Arte oratoria igualam poucos. Assistiu a este obsequio, e devido acto o mesmo Senado, com o seu Presidente interino o Desembargador Gaspar Ferreira Aranha, e todos os Cidadões, e foi muito notavel o cõcurso.»
18 de Janeiro 1759: Caros leitores da Gazeta, sois uns asnos! Desde Setembro que todos presumíamos que os Marqueses de Távora e o Duque de Aveiro eram culpados, ainda nem vocês, nem eles, na semana passada sabiam de quê. Na realidade eram uns saltimbancos que se faziam passar por nobres. A queda que o Rei deu no palácio? Tudo treta, não perceberam? Foi preciso fazer uma mudança na cabeça da tropa, meter manos nossos a mandar, e também acabar com a cambada de Jesuítas... mas disso não daremos notícia, que o povo é gentinha religiosa, profana e burra. Vá, agora leiam o que lhes aconteceu, e não são só estes - há mais malta da alta nobreza que também eram saltimbancos. E não é só nobres e padres - para os seus serviçais ainda é castigo pior. Habituem-se. 
Gazeta de Lisboa N.º 3, 19 Jan. 1759 (pág. 23): (Lisboa, 18 de Janeiro) «Do fatal da noite de 3 para 4 de Setembro, q a todos os seculos serà memoravel, com a duração da infamia de seus autores; se teve logo a prozumpção dos q o forão; como o fazi, duvidosa a consideração, de haverem elles recebido, e estarem recebendo actualmente, muitas mercês do nosso Amado Monarca; não se fazia Crivel, q cobrindo com a sua soberba a ingratidão, se cegassem de maneira, q não vissem o despenhadeiro, e cahisse no precipicio; e assim não quis a recta justiça do Ministerio, proceder ao castigo, sem huma exacta a veriguação da verdade, porem feita esta com a mais admiravel prudencia, e sagacidade, forão reconhecidos incontestavelmente por agressores daquelle execrando crime, o Duque de Aveiro, o Marques de Tavora, sua mulher, dous filhos seus, e seu genro, o Cõde de Atouguia, e assim forão sentenciados pela Junta da Inconfidencia, cõposta de Ministros incorruptos, a ser degradados da immunidade das ordens, de que erão Cõmendadores, exautorados dos lugares, e titulos q tinhão, desnaturalizados do Reyno, e tidos por peregrinos, e vagamudos; ordenandose q Leonor Tomazia, q se intitulou Marqueza de Tavora fosse degolada, e q Joze Mascaranhas e se chamou Duque de Aveiro, Francisco de Assis, q se dizia Marquez de Tavora, Luiz Bernardo, que tinha o mesmo titulo, Jose Maria q foi Ajudante da Sala de seu Pae, quando era General, e Jeronimo de Ataide, nomeado Conde de Atouguia, depois de lhes quebrarem as canas dos braços, e pernas, e os peitos com huma grossa massa de ferro fossem todos agarrotados, queimados os seus corpos, juntamente com o da dita Leonor Tomazia, e lançadas no Mar as suas cinzas. As cazas em q viviam demolidas, e salgadas. Todas as suas Terras, Senhorios, Alcaydarias mores, Comendas, Prazos, e Morgados, sem clausula confiscados para a Camara Real.
Executou-se com effeito esta sentença no dia 13 do corrente, no largo, que ha entre o Cays de Belem, e o Palacio que foi do Conde de Aveyras. No mesmo dia, e no mesmo lugar padeceram no garrote Manuel Alvares Ferreira guarda roupa de Joze Mascarenhas, e Braz Joze Romeiro guarda roupa de Francisco de Assis, e João Miguel homem de acompanhar, cujos corpos foram depois queimados com a estatua de Joze Policarpo de Azevedo (que escapou de o prenderem, e se prometem 10 U cruzados de premio aquem o entregar à justiça) e lançadas as suas cinzas no Mar, com as de Antonio Alvares Ferreira guarda roupa de Jozè Mascarenhas, que no mesmo dia e lugar foy queimado vivo.
A 15 sahiu S. Mag. com toda a familia real render graças a Deus na Igreja de N. S. das Necessidades, na do Livramento, e na do Bom Sucesso, e vezitou a Hermida de Santo Alvaro, cuja festa se celebrava, aclamado por todo o caminho com innumeraveis vivas; por ter infinito o Povo que concorreu para ver restituido à saude o nosso muito amado Soberano, e Augusto Rey.»
1 de Fevereiro 1759: Julgavam que a notícia da ida para Salvaterra divertirem-se na caça era uma metáfora? Aprendam. Foram mesmo divertir-se, que isto a vida são dois dias e os julgamentos fazemos em três. Acham pouco? Os historiadores vão-lhe chamar "Processo", talvez em analogia com o processamento de carne num matadouro.
Gazeta de Lisboa N.º 5, 1 Fev. 1759 (pág. 39): (Lisboa, 1 de Fevereiro) «Todas as noticias que chegão de Salvaterra concordão em que Suas Magestades Fidelissimas, e Suas Serenissimas Altezas, logrão saude perfeita, e se divertem com a cassa de dia, e de noyte com serenata, e outras diversoens; que o Augusto Rey nosso Soberano, que Deus Guarde, reconhece em si melhor disposição, e mais robustez; para o que tem contribuido muyto a mudança de ar. Não diz ainda quando a Corte se restituira ao sitio de Nossa Senhora da Ajuda.» 
28 de Fevereiro 1759: Acham que a nobreza que não foi morta, nem presa, está contra a malta? Desenganem-se, vejam só como é lindo o bajular dos Mellos, e não se esqueçam disso, ensinem à vossa prole, que o divertimento em Salvaterra vai continuar com muita tourada, durante muitos séculos.
Gazeta de Lisboa N.º 9, 1 Mar. 1759 (pág. 71): (Muja, 28 de Fevereiro) «Como a Corte passou a Salvaterra para se divertir com o Exercicio da cassa, veyo habitar ao Palacio, que tem nesta Villa o Ilustrissimo, e Excelentissimo Senhor D. Nuno Alvares Pereira de Mello, Conde de Tentugal, Marques de Ferreira, e Duque de Cadaval, com a Illustrissima e Excellentissima Senhora Duqueza viuva sua Mãe, e com suas irmãs, para ficarem mais vezinhos da Corte; e sabendo que na nossa Igreja Prioral se não havia ainda feito alguma acção de graças a Deus pela mercê q fez a este Reino em livrar o nosso Augustissimo Rey do grande perigo em que esteve a sua tam estimavel vida, ordenou que se fizese esta divida demõnstração de contentamento; o q efectivamente se executou no dia 24 do corrente; (...)
Assistiram suas Excelencias a toda esta festividade, e ao jantar mandarão destribuir mantimentos pelo grande numero de pobres que ali concorreu. Tambem o Excellentissimo Duque fes com a mesma ocazião, que houvesse aqui um Cõbate de Touros de Cavalo, e de pe, e que se lançasse ao Ar fogo de arteficio para que subisse mais alto o seu obsequio.»
5 de Julho 1759: Achavam que os números da Gazeta cheios de "vivas" às melhoras do arranhão no braço do Rei não duravam 6 meses? A seguir vão ver os "vivas" à nomeação do Conde de Oeiras. Calma, só depois é que passará a Marquês de Pombal, até porque havia um lugar de marquês que tinha vagado, certo?
Gazeta de Lisboa N.º 27, 5 Jul. 1759 (pág. 122): (Lisboa, 5 de Julho) «De todas as Cidades, Villas, e Lugares do Reyno chegam notícias do grande gosto, com que os Povos em toda a parte aplaudirão a feliz noticia, de se achar S. Mag. Fidelissima livre da queixa q padeceu. Na Cidade de Elvas (...)»[notícia com a nomeação de Sebastião Jozé de Carvalho e Mello como Conde de Oeyras]
Agosto de 1759: Aprendam a saudar o mano Sebastião José, não como restaurador, que isso era para D. João IV, mas sim como fundador, ao nível de D. Afonso Henriques. Ele gosta. Ah, e não se esqueçam da sua alta inteligência... Manos, ponham-no depois num pedestal em Lisboa, que servirá o efeito ficar mais alta esta cabecinha, que tanto intelecto gastou para ver ossos a partir e gente a ser queimada viva. Por enquanto só damos estátua ao rei num cavalo. O mano quer um leão.
Gazeta de Lisboa N.º 32, 9 Ago. 1759 (pág. 163): (Porto, 9 de Julho) «Por hum Proprio chegado de Lisboa se recebeu nesta Cidade a noticia, de haver o Rey N.S. conferido o titulo de Conde de Oeyras de juro, e herdade com outras mercês ao Illustr., e Excel. Sebastião Jozé de Carvalho, e Mello, e foy tão geral o gosto, que este despacho influiu nestes habitantes, que a mayor parte o festejou tres noites com luminarias; julgando-o por todos por muy correspondente ao merecimento, e serviços de hum Ministro a que se deve dar o pitecto, não de restaurador, mas de novo fundador deste Reyno, pela reforma que nelle tem feito a sua alta inteligencia.»
----

A mãe do Duque de Aveiro morreu quatro dias antes da execução, quando soube que o filho era acusado do atentado contra a vida do Rei. Isto só para termos ideia de que quando falei aqui em julgamento de três dias, posso ter exagerado por excesso.

Gazeta de Londres. February 26, 1759 [p.66]
(Lisbon, Jan 16)  The Duke of Aveiro's Mother was living four days before his execution. She had happily taken the veil some years ago, and died on the 10th by the shock she received from her son's horrible attempt against the life of his Sovereign.
(Paris, Feb 4) The King [of France] asked Father Desmaretz, his Confessor, today: 'Have you no news from Lisbon?' "None, sire" replied the Jesuit. 'Then I tell you (said the King) three of your brethren are hanged there".

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1 comentário

De Alvor-Silves a 30.01.2016 às 20:33

É engraçado que o José Hermano Saraiva começa o vídeo com uma versão e termina com outra...
Eu li uma parte das declarações do Duque de Aveiro - antes de ser torturado, e nada falam do que ele diz, nem vejo que a filha dos Távora fizesse tais declarações, até porque os Aveiro eram também parcialmente da família Távora.
Mas falta ainda colocar aqui essa informação do processo, que é bastante interessante.

Abraços

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