Ao contrário do que se poderá pensar, a História não deve ter como primeiro intuito saber a verdade do passado, deve sim recusar a mentira que seja plasmada em qualquer contradição ou absurdo.
Pode parecer a mesma coisa, mas não é.
O exemplo mais gritante é a versão oficial da descoberta da Austrália, onde nem é preciso falar dos portugueses... Simplesmente é escrito que os holandeses declararam a descoberta da metade ocidental da ilha, levando então o nome de Nova Holanda, e esteve assim, em banho-maria, durante mais de 100 anos, até Cook ter cozinhado a descoberta da metade restante.
Se houvesse uma justificação minimamente credível para esse desinteresse, por exemplo, uma proibição de navegações, etc... poderia fazer algum sentido. Mas não, somos simplesmente levados a aceitar que os Holandeses nunca se interessaram pela parte australiana oriental... porque sim!
Importa para isso a falta de documentação, de provas, de achados, etc... e mostra como esse processo histórico, é um processo exclusivamente burocrático. Ora, foi isso que a Academia instituiu - uma história feita pela burocracia, que obviamente nada tem a ver com o que entendemos como História.
Esta História que é ensinada aos petizes está assim cheia de contradições, absurdos, inconsistências, mas passa por reflectir uma realidade passada, que é apenas uma ficção burocrática conveniente, porque é essa a documentação disponibilizada.
Desde o início que pensámos em explicações alternativas, tendo em atenção o reequilíbrio de poderes na Europa Ocidental, com a derrota ibérica na Guerra dos Trinta Anos, o que levou a um reescrever da história. O mais natural é que os territórios por declarar estivessem por definir entre os novos competidores "autorizados" - especialmente França e Inglaterra. Com a futura prevalência inglesa, pela vitória na Guerra dos Sete Anos, e a derrota final de Napoleão, no Séc. XIX foi instituída essa versão oficial, que dava aos ingleses o mérito oficial de descobrirem o que faltava declarar no Oceano Pacífico - não só a Austrália e Nova Zelândia, mas também toda a Costa Ocidental Americana, acima da Califórnia.
Sim, o ridículo e absurdo foi tão grande, que ao contrário dos mapas do Séc. XVI, os mapas dos dois séculos seguintes chegaram a apresentar a Califórnia como ilha. Mesmo sendo oficialmente desconhecida, a California manteve os nomes hispânicos, de Los Angeles a San Francisco.
Repare-se que não estamos a falar de navegações complicadas - essas eram feitas inúmeras vezes todos anos, das Filipinas ao México, cruzando o enorme Pacífico, em carreiras regulares, pelo menos desde 1550... e isso está bem documentado.
Estamos a falar do simples reconhecimento costeiro, acima da Califórnia (inclusive), que impediu um desenho fidedigno da América, durante os 200 anos seguintes. Não precisaria de barcos... poderia fazer-se caminhando a pé, pela costa, num percurso que demoraria menos de um ano. Certamente que foi feito, mas sobre isso não existe qualquer documentação...
A ausência de documentação não é um problema do passado, é ainda um problema do presente, porque só a teimosia imbecil de não querer reconhecer o óbvio, insiste em inventar histórias para ocultar uma História verosímil.
E o que é uma História verosímil?
Ora, o único caminho para a verdade é a recusa da mentira, porque ao recusar todas as contradições, todas as mentiras, o que resta é inevitavelmente aquilo que poderemos dar como verdadeiro, até melhor hipótese. Certamente que o caminho não é dar como fidedignas documentações parciais, que fazem uma história da carochinha conveniente aos poderes instalados.
Não haveria nenhum problema com isso... se não fossem inconsistentes entre si, ou absurdas para o bom senso. Não o são tanto, quando os historiadores se centram em pequenos aspectos históricos, e normalmente ignoram, ou fazem por ignorar o contexto global.
Talvez porque os nossos antepassados tenham visto tantas vezes a História ser trucidada pelas historietas convenientes aos "vencedores", prefiram usar a Mitologia, onde a história é assumida como parcialmente ou totalmente inventada. É melhor isso do que a Mintologia, em que a mentira impera no registo histórico, fazendo-se passar por verdade.
Aliás, a diferença entre "História" e "história", é apenas ilusão académica de que ao escrever História com "H" maiúsculo, ganha maior dignidade... mesmo sendo ausente de uma credibilidade, que perdeu.
- História tornou-se num simples "Isto, ria"!
Porém, não há distinção na língua portuguesa entre histórias.
Verdadeiras, ou inventadas, todas são "histórias", e essa é uma opção correcta.
É opção correcta, e a credibilidade da história mede-se sempre pela sua consistência.
Numa mera novela, um personagem órfão pode aparecer nos últimos episódios acompanhado dos pais... sem necessidade de justificação.
Tudo depende do critério do espectador, se é exigente ou não!
Só que a História tem um propósito auxiliar, que é servir de orientação para o futuro.
Se aceitarmos contradições e arbitrariedades na descrição do passado, mais facilmente seremos confrontado com as mesmas contradições e arbitrariedades no futuro.
Conforme vimos, as revoluções usaram apoio popular, mas não tiveram génese popular... foram na maior partes das vezes "
uma encenação de mudança para manter tudo na mesma". Além disso, devido à falta de conhecimento histórico consistente, os mesmos erros são repetidos, vezes sem conta. E não será "
primeiro como tragédia e depois como farsa", como terá dito Marx, quase sempre é como tragédia, ainda que nos bastidores se encene a enorme farsa.
É a falta de conhecimento e compreensão do processo histórico que permite alimentar revoltas, vinganças, e todo o tipo de animosidades, que vão mantendo a população entretida, entre ficção e realidade.
Cada indivíduo preocupa-se mais com o número de chicotadas que leva, relativamente aos vizinhos, e assim estão longe de questionar tão pouco a escravatura a que todos estão sujeitos.
Por exemplo, em 1930, no meio de uma recessão enorme, em que a economia parecia definhar, Keynes, que fez bastantes previsões correctas, fez uma previsão completamente incorrecta:
|
Keynes, em 1930 previu 15 horas como semana laboral do final do Séc. XX |
No entanto, quando até o MRPP, esse partido de perigosos revolucionários, pede em
outdoors a passagem da semana de 40 horas para a semana de 35 horas (e muitos acham isso irresponsável), vemos como os escravos se habituaram às chicotadas e sentem falta dessa dedicação que os capatazes colocam nas suas costas.
A previsão de Keynes estava absolutamente correcta, tendo em atenção a conquista das 40 horas semanais, ainda no Séc. XIX, nos EUA.
Depois tudo foi regressão... ou talvez como veio a dizer:
-
Capitalism is the astounding belief that the most wickedest of men will do the most wickedest of things for the greatest good of everyoneDe facto, num desregrado sistema capitalista, é natural que vençam os mais perversos, fazendo as coisas mais perversas, e não será certamente para benefício da humanidade, mas exclusivamente para benefício local, próprio. Mas não é só isso...
O
artigo do The Guardian culpa os
workhaolics... ou seja, as pessoas preferem receber mais, trabalhando mais, do que usufruir do descanso. Esse é um lado da questão, mas a principal razão parece-me ser outra - o problema principal é que os capatazes não controlariam tão bem os escravos, dando-lhes descanso.
Porque o objectivo do escravo não é partir pedra, é estar ocupado a partir pedra... para nem sequer ter tempo para pensar em revoltar-se da sua condição. E como os capatazes não querem que a pedreira seja uma colónia de férias, de trabalho leve, nem saberiam como controlar tanto escravo, sem os pôr a trabalhar, reduzem-se à sua ignorância, e insistem na única receita que conhecem... a do chicote, que funciona, e onde são bons. Basta eleger o melhor escravo pedreiro, colocar o seu nome em parangonas na pedreira, todos os outros vão invejar aquele modelo de escravo, que poderá até ser um dia capataz.
Tudo o que há a fazer é culpar os escravos preguiçosos, da falta de produção, mesmo que num terreno em anexo, longe dos olhares, a produção de pedra acumule em pirâmide... porque a produção é simplesmente dez ou vinte vezes maior que as necessidades.
E não interessa aqui saber se na pedreira, os capatazes são pedreiros livres, e os outros são escravos, porque todos acabam por ser escravos do sistema tradicional que conhecem. O que interessa mesmo aos senhores são as gemas preciosas, e por ignorância, nem capatazes, nem escravos, percebem quais elas são. Todos estão entretidos demasiadamente entre si. Os escravos não concebem um mundo sem a pedreira e as chicotadas, e o máximo que ambicionam é ter umas costas menos carregadas que os outros. Outros querem ser capatazes, e é o mais longe que conseguem ver, porque nem tão pouco puseram os olhos nos senhores, que mantêm todo o sistema. Para esses desconhecidos, é indiferente se os escravos se revoltarem e depuserem os capatazes... a única coisa que interessa é manterem-se na sombra, para não serem alvo de represálias, mesmo que sejam forçados a mudar os capatazes.
Só que todo este sistema, que agrada ao escravo feliz, ao perverso capataz, e aos instalados senhores, baseia-se numa ilusão de realidade, reduzida à pedreira... e o mundo é muito mais que uma simples pedreira, na posse de uma meia dúzia de senhores, cheia de escravos dominados por uns tantos capatazes.
E o problema das ilusões é que são muito engraçadas, até que um dia a realidade bate à porta... e se nada aparenta prever que nada vá mudar, há umas pequenas coisas que indiciam que não será bem assim. Porque... o universo é como é, e para ser como é, precisa de ser consistente, e isso não se compadece com ilusões perenes. A pequena grande diferença é que há agora quem saiba disto... e por consequência, o universo sabe disto.