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Ulyssippo

08.06.10
Um poema notável, esquecido, que reporta a origem de Lisboa a Ulisses, foi o composto por António de Sousa Macedo (1606-1682)... talvez mais conhecido pelo seu "Flores de Espanha, Excelências de Portugal". Mais uma vez fomos encontrar Ulyssippo por digitalização da Biblioteca do Michigan... numa reedição de 1848.
Poema Ulyssippo

A edição original será contemporânea da Restauração da Independência, notando-se que a chancela dos últimos inquisidores, para autorização de publicação, é já de 31 Outubro de 1640.
António de Sousa Macedo 
[imagem]

António de Sousa Macedo, seria nomeado Barão de Mullingar (Irlanda), por Carlos II de Inglaterra, tendo integrado a comitiva que acompanhou D. Catarina de Bragança. Foi ainda embaixador na Holanda. É justamente nesta altura que a Inglaterra, dá novo ímpeto à iniciativa Mayflower (... Flor de Maio), peregrinação que motivou os Estados Unidos da América. A influência da corte portuguesa de D. Catarina ficou homenageada no bairro Queens de Nova Iorque.

Curioso ainda, é o título dado a seu filho (Luís de Sousa Macedo): Barão da Ilha Grande de Joanes (identificada à Ilha de Marajó, na foz do Amazonas). A que Joanes se referiria essa Ilha Grande, na linha de demarcação do meridiano de Tordesilhas, se não a D. João II?

Colocamos aqui a primeira estrofe que é denominada Argumento, e nove outras primeiras estrofes, onde se torna claro que o mito da fundação de Lisboa por Ulisses, e toda a mitologia subjacente, estaria bem presente desde o fim do Séc. XV ao Séc. XIX. Não parece sério fazer qualquer História de Portugal, sem mencionar estes mitos que influenciavam o pensamento português. É até secundário saber da veracidade do mito, o que interessa é que esse mito influenciou, e muito, o pensamento português.

Não se trata de um estilo camoniano, mas permite entender completamente o verso dos Lusíadas 
"Cessem do Sábio Grego e do Troiano" ficando claro que o Sábio Grego era indiscutivelmente Ulisses...

Argumento
  O Rei Tartareo destruir procura  Do sábio Ulysses a famosa armada;   E defendendo-a o Céu nela assegura   A cidade ab eterno decretada:   Infausta sombra ao Grego em noite escura   Dissuade da empresa começada   Mas animado com celeste auspicio   Porto lhe dá no Tejo o mar propício. 
(ver outras primeiras estrofes no comentário anexo)

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publicado às 06:05


1 comentário

De Alvor-Silves a 08.06.2010 às 15:48

I
Canto o varão, que por fatal governo
De Grecia a Lusitânia peregrino
Fundou ilustre muro, & nome eterno
Onde ao mar torna o Tejo cristalino.
Muito obrou, e sofreu ; & em vão o inferno
Se quis opor contra o poder divino,
Que o guardou para autor naquela idade
De muitos Reinos uma só cidade.

II
Suprema inteligência , em quem librado
O movimento está das luzes belas
Vós, que regeis das cousas o alto fado
Na luzente republica de estrelas;
Pois conduzistes pelo mar irado
Ao Lusitano porto as Gregas velas,
Dai-me canora voz, metro elegante
Que dignamente vossa empresa cante.

III.
Vós de Lisboa luz, de Itália gloria
Vivo exemplar do Céu, do mundo espanto
Arquivo à santidade mais notória,
Por sombras Deus, por excelência santo;
Dai atenção à numerosa história
( Ó grande António) se merece tanto
Vereis eterna, dos balcões celestes ,
Nascer a pátria, de que vós nascestes.

IV.
Vereis, que se por pátria ilustre vossa
Tem o maior brasão, mais alta empresa
É pátria tal, que justamente possa
Dignar-se de tal mãe vossa grandeza.
Ouvi, porque se ouvis da gente nossa
(Insigne Português) a alta nobreza,
Entre a harmonia dos etéreos coros
Os patrios versos vos serão sonoros.

V.
Depois que ao Reino antigo do Troiano
Deu com morte vital gloriosa pena
Vingando a Grega injúria por engano
O poderoso Rei da gran Micena;
Depois que de seu fogo o voraz dano
Viu extinguido em sangue a bella Helena,
E horrivelmente d'uma, & d'outra parte
O teatro de Amor campo de Marte :


VI.
Em muitas dividida a esquadra Grega
Do sábio Ulysses a famosa armada
Ítaca busca, que lhe o fado nega
Por diferentes climas derrotada
Em braços da fortuna enfim se entrega
Ao dominio do vento violentada,
Que antes a governava, que impelia,
Par'onde o mar começa, & acaba o dia;

VII.
Lançava a noite ao mundo o escuro manto,
E o mar Iberio Ulysses já cortava,
Quando no reino do temor , & espanto
Novo temor, espanto novo entrava:
Plutão em tristes sombras entretanto
A Grega gente viu que navegava
Só para ser de seu poder injusto
Destruição fatal, castigo justo.
VIII.
Parece que em valor antecipada
A Católica Fé da Lysia terra
Em séculos futuros esperada
Lhe ameaçava nos presságios guerra:
Em temores somente figurada
Luz eficaz da que Lisboa encerra
Divina Lei, antecipando ensaios
Propunba em sombras da vitória os raios.

IX.
Mas como dos futuros contingentes
A certeza infalível se lhe oculta,
Em proféticos astros concorrentes
Figuras matemáticas consulta:
Alcança em conjecturas evidentes
Que irreparável dano lhe resulta
Das, que navegam, naus, irado geme,
Porém não determina o mal que teme.

(...)

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